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28. Estonteante, Montreal.


- Ainda não são nem dez horas, vamos fazer algo diferente! - Enzo falou, animado, enquanto entrávamos no carro

- Algo diferente? Essa viagem inteira já não é algo diferente?

- Não, algo emocionante, divertido. Que nem aquele dia que nós comemos comida japonesa e experimentamos roupas caras e saímos correndo.

- O dia em que fizemos tudo o que você nunca tinha feito?

- Sim! Exato! O que você nunca fez aqui em Little Rock?

- É mais fácil perguntar o que eu fiz.

- Ah, fala sério. Sua adolescência não deve ter sido tão monótona assim.

- Ou eu estava em casa estudando ou eu estava no laboratório revelando fotos de paisagem ou eu estava trabalhando na lanchonete. Essa foi minha adolescência.

Enzo virou os olhos enquanto dava partida no carro.

- É sério, vamos lá. Pensa em alguma coisa da sua adolescência que você queria ter feito, mas não fez.

Eu pensei e pensei muito por alguns segundos. Tais anos pareciam ser um borrão em minha mente, talvez eu os tenha bloqueado.

- Bom, tinha um parque de diversões e eu queria ter ido no elevador de trinta metros, mas ele não existe mais. Tinha também um festival de música que eu acabei não indo por falta de companhia...

- Ok, ok, vamos falar de coisas que ainda existem. O que as pessoas da sua idade faziam enquanto você estava trancada em casa?

- Tirando ficarem muito bêbados, gritarem pela cidade toda e vomitarem lá de cima da ponte?

- Sim, por favor, tirando isso.

- Ah! - eu disse, com o polegar pra cima, como se eu acabara de ter uma ideia genial - Eu sei um lugar! Dá meia volta, é pro outro lado.

- O que é? - Enzo falou enquanto ligava a seta e esperava o carro de trás passar

- Não sei se ainda existe, mas vamos descobrir.

- Tem certeza que é por aqui?

A rua estava escura, quase esburacada. Muita coisa havia mudado naquele bairro, eu só esperava que o que eu queria mostrar continuasse ali.

- Um pouco mais pra frente. Provavelmente vai estar à direita - eu disse, tentando enxergar algo - Ok, pode parar aqui.

Saí do carro, tentando identificar algo.

- Mas não tem nada aqui - Enzo falou, com a cabeça pra fora da janela

Andei mais um pouco, até que meus olhos enxergaram-na.

- É aqui mesmo! Encosta o carro assim de frente e não desliga os faróis! - exclamei

Enzo saiu do carro, me perguntando o que tinha ali. Eu cheguei mais perto da cerca baixa de arame e ele deve ter se surpreendido quando, apoiando meus braços em cima da coluna de madeira, pulei para o outro lado com cuidado.

- Me fala que a gente não está invadindo uma fazenda - Enzo falou

- Na verdade é algo que você tem muito mais experiência em invadir.

Ele ficou curioso e também pulou a cerca baixa de arame.

- O que estamos fazendo aqui, Mon? - Enzo continuou andando até mim e eu tive que colocar meu braço na frente de seu corpo, impedindo-o de dar mais um passo, e assim fazendo-o olhar para baixo

Ele olhou para seus pés e tentou enxergar algo somente iluminado pelos faróis do carro metros atrás de nós.

- Não me diga que isso é uma piscina.

Era.

- Quer dizer que a turminha popular vinha para cá fazer festas? Para uma piscina abandonada no meio do nada?

Estávamos sentados na curva inferior da piscina, no concreto áspero com uma rachadura evidente.

- Não, você não entendeu. Antes dos populares virem para cá, a turma mais alternativa da escola tinha descoberto esse lugar e vinha aqui aos sábados para ouvir música, fazer uma pista de skate improvisada e provavelmente para fumar. Mas os populares ouviram falar disso e então ficou algo famoso demais e os alternativos acabaram achando outro lugar.

- Quem eram esses alternativos?

- Na sua escola não tinha? Aquela turma de gente considerada estranha, com piercings, cabelo colorido, skates e um gosto diferente para música.

- Góticos? Punks? Grunges?

- Acho que tudo isso junto. Eu os achava bem mais legais que os populares e suas bandinhas pops com gel no cabelo. Essa piscina aqui ficou horrível quando eles tomaram conta. Parecia uma discoteca bem ruim com um monte de gente bêbada se pegando.

- Como você sabe dessas coisas? Você vinha nessas festas? - Enzo me olhou desconfiado

Eu soltei um riso.

- Não, eu nunca vim. Eu comecei a vir depois que a badalação desse lugar acabou, quando ninguém mais lembrava. Eu vinha no final da tarde, aproveitar a vista e olhar pro céu virando noite. Mas como eu não me encaixava em nenhum grupo desses da escola, eu tinha muito tempo para observar e sempre ouvia sobre as festas na piscina abandonada.

- Eu não estou te criticando, ok? - Enzo colocou uma mecha do meu cabelo atrás da minha orelha - Eu só quero entender: como que, numa escola tão grande em uma cidade razoavelmente pequena, você nunca encontrou um grupo de amigos como qual se identificasse?

- Olha, tinham os populares, dos quais eu queria distância, que provavelmente me achavam estranha, isso se soubessem que eu existia. Eu achava os alternativos legais demais para mim, eu era estranha de um jeito sem graça. Já os nerds me achavam alternativa demais, ou quem sabe não estudiosa o bastante. O pessoal do grupo de teatro não se misturava com quem não sabia de cor musicais da Broadway... E o resto das pessoas... Elas eram normais demais, com amigos normais, vida normal, eu não conseguia me encaixar. Aposto que deviam ter também pessoas que se sentiam deslocadas como eu, mas acho que nunca fomos apresentadas.

Depois desse meu discurso todo, Enzo só soltou um "hum", como se fosse algo muito interessante.

- O que foi? - perguntei

- Estava pensando que a maioria dos bons artistas, escritores e músicos geralmente dizem que sofreram um pouco no colegial por não conseguirem se encaixar, por serem diferentes do resto. Talvez seja isso, sabe? Você nunca se encaixou em nenhum padrão porque você pensa por si própria, você é única e não precisa ser de nenhum grupinho para saber quem você é. Você nem sabia no colegial, mas você nunca foi "rotulada" porque era como se você fosse algo tão novo, tão especial, que ainda não existia um nome para você.

- Uau - eu disse, olhando-o - Você me deu muita coisa no que pensar.

Seus braços se envolveram aos meus ombros.

- Isa provavelmente vai passar pelas mesmas coisas. Eu já sei que ela é tão especial quanto você. Você inventou seu próprio mundo na fotografia e Isa faz exatamente o mesmo.

- Oh, céus. Primeiro minha mãe dizendo que ela tem o mesmo nariz que eu e agora isso? Vocês querem que meu coração exploda?

Enzo segurou meu rosto, olhando pro meu nariz e analisando-o.

- Não é que sua mãe tem razão? - ele riu, mas seu sorriso estava perto demais do meu para que eu resistisse a ele

Foi um beijo rápido que aconteceu logo após que puxei seu lábio inferior com meus dentes. Foi impossível me segurar.

- Como ninguém nessa cidade percebeu o quão incrível você é? - ele soltou assim que nossos lábios se desgrudaram num estalo

- Bom, não era como se muitas pessoas me conhecessem. Eu mal entendo como eu deixei você se aproximar tanto assim de mim para que pudesse me conhecer... E olha no que deu: agora parece que me conhece melhor do que eu.

- No fundo eu acho que você precisa se conhecer melhor, Mon. Como você pode ser tão linda, em todos os sentidos, e tão insegura ao mesmo tempo? Você tem todo esse seu jeito marrento no começo, toda essa atitude de fazer as coisas sozinha e do jeito certo, e isso é ótimo, mas quando o assunto é você mesma, parece que você se assusta.

- Eu não sei, Enzo. Eu juro que eu não sei. Eu... Eu mal sei como eu fiz tudo o que eu fiz nesses últimos meses! Comprar uma casa, adotar de fato uma menina linda, virar mãe num piscar de olhos, fazer uma exposição na minha sala! E olha que eu morro de medo de fotografar pessoas, já que paisagens são muito mais confortáveis de se registrar. Eu olho para trás e pra agora e às vezes não entendo. Mas eu olho para você, me olhando desse jeito... É tão forte, mas tão gentil, e eu sei que foi você quem me ajudou nisso tudo.

A luz do farol do carro estava deixando nossos rostos brancos e tudo o que eu via eram seus olhos em mim. Sua mão foi atrás de minha orelha.

- Quem fez todas essas coisas foi você, Mon. Foi você. Eu talvez só tenha te mostrado a confiança que você não sabia que tinha. Porque eu realmente não me lembro de ter comprado casa nenhuma, nem de ter entrado em lista de adoção e nem de ter tirado um monte de fotos e as revelado e montado uma exposição na sala.

Eu ri, de leve. As palavras que saíam de sua boca derretiam em meus ouvidos.

- Na verdade, você que fez muita coisa por mim.

- Eu? - minha sobrancelha se arqueou

- Pra começar, você não precisava ter me ouvido desabafar sobre Catherine aquele dia porque eu sabia que você tinha me convidado por educação e eu fui assim mesmo. Depois você me fez ter um dia maravilhoso no aniversário de quatro anos da minha tragédia pessoal. E você ainda aceitou ir num casamento comigo tirar fotos de quem nem conhecia! Você fez muito por mim mesmo eu sendo um implicante e arrogante.

- Um implicante e arrogante bem gato que vivia sem camisa na piscina de casa, então não era tão ruim assim te aturar.

Eu ri enquanto ele abria a boca fingindo não acreditar.

- Ah, então era só interesse nesse corpinho aqui? - ele me fez rir - Falando nisso, fica parada um minutinho nessa posição - falou com o dedo indicador para cima e se afastou de mim, subindo pela borda da piscina

- O que foi? - perguntei enquanto ele parecia correr até o carro

- Não se mexa! - ele gritou

Eu esperei sentada no concreto liso do fundo da piscina abandonada, tirando um pouco de terra que tinha sujado a barra da minha saia.

Ele logo desceu, quase escorregando, pela beirada da piscina, carregando em suas mãos minha câmera Polaroid.

- Não, não! - eu expressei, cobrindo meu rosto - Você sabe que eu não presto para ficar na frente das lentes, só atrás.

- Sem essa, Montreal. Hoje é o dia de você fazer o que nunca fez. Saia da sua zona de conforto porque eu não vou desperdiçar essa luz contrastando com seu perfil.

- Ih, quem é mesmo a fotógrafa aqui?

- Finalmente se chamou de fotógrafa sem completar com um "amadora". Agora só falta se soltar mais. Vamos!

Eu sorri, tentando ficar mais relaxada enquanto ele apontava a câmera para mim. Enzo dirigiu minha pose e clicou no botão para tirar a foto.

- Ok, pronto - eu disse enquanto ele tirava a fotografia da câmera e a colocava em seu bolso, como eu tinha ensinado a ele

- Você acha que acabou? Uma foto só? Você realmente acha que eu vou deixar você se livrar dessa tão fácil?

Cerrei meus olhos. Ele sabia me irritar quando queria.

- E só para te avisar, se tivessem azulejos nessa piscina, daria para contar e ver que você está do meu lado.

Esse foi o momento em que eu voltei a ser a barraqueira do dia em que o conheci, afinal, ele estava sendo o mesmo implicante.
Eu me levantei com calma, ficando à sua frente. Levei minhas mãos ao meus cabelos, presos por causa do calor, e os soltei. Meus dedos desabotoaram cada botão, de cima para baixo, da minha camisa. Enzo parou de olhar pelo visor da câmera quando percebeu o que eu estava fazendo.

- O quê? Achei que o senhor mesmo uma vez disse que era mais divertido pular na piscina sem biquíni - eu disse enquanto tirava minha saia pelas pernas, enrolando-a pelas minhas coxas

Enzo parecia estar sem palavras, mas nem um pouco contra o que eu estava fazendo.

- Tem certeza?

- Não é você quem diz que eu preciso ter mais confiança, me expor mais? Resolvi seguir seu conselho.

Minha roupa íntima ficou junto à minha saia e camisa em um canto no chão. Enzo ia para trás e para frente e para um lado e para o outro tentando achar o melhor ângulo. Eu não estava me sentindo tão estranha como achei que ia me sentir. Era só eu, ele, o farol do carro me iluminando e o barulho da câmera. Mais nada. Vocês poderiam contar para mim aos dezesseis anos que um dia eu deixaria alguém tirar fotos minhas nua no meio da noite na piscina abandonada na rua perto do cemitério que eu nunca iria acreditar. Mas realmente aconteceu.

Enzo parecia concentrado. Observando, achando a melhor pose para não desperdiçar o filme. Eu estava me sentindo... Nua. Em todos os sentidos. Era diferente estar assim junto a ele e não em meu quarto com as luzes apagadas ou de noite na piscina ou no chão do laboratório escuro. Aquela noite era clara, transparente, cada pedaço de mim estava exposto aos seus olhos... E tudo pareceu normal.

- O filme acabou - Enzo disse quando tentou tirar outra foto, mas não saiu mais nada

Eu acordei do meu transe, olhando minhas mãos atravessarem a luz branca do farol do carro. Enzo parecia me olhar sem acreditar.

- Enzo, não é como se você nunca tivesse me visto nua - eu falei, buscando minhas roupas enquanto ele continuava parado

- Não desse jeito - foi tudo o que ele disse e eu não quis perguntar o significado, afinal, eu já sabia

Eu me vesti no silêncio que se instalou no local. Não havia vento naquela noite de verão do Arkansas. O céu estava limpo, mas eu não conseguia ver muito por causa do farol alto do carro. Enzo esperou eu me vestir com a câmera na mão, sem dizer nada, antes de me ajudar a subir pelas bordas arredondadas da piscina.
Só consegui subir na quarta tentativa e acabei ralando meu joelho no processo de me apoiar nas beiradas sujas de terra e plantas.

- Machucou? Está doendo? - senti um certo desespero do tom de voz de Enzo quando ele reparou em meu machucado

- Não. Não fica desesperado, só ralei um pouco.

- Eu não estou desesperado, só estou querendo te ajudar.

- É que eu às vezes acho que você é super-protetor demais... - eu soltei esse comentário sem pensar muito

Fui andando para o carro, mas Enzo me parou e me puxou pelo braço.

- Você quer que eu pare de me preocupar com você? É isso?

Não consegui saber se era decepção ou apenas grosseria na sua voz.

- Não, Enzo. Eu gosto, mas eu vivi tantos anos sob tanta proteção que agora eu sei o mal que não quebrar a cara e se machucar pode trazer pra vida. E às vezes sua preocupação é exagerada.

- Montreal - ele respirou fundo - Eu já perdi uma mulher da minha vida, eu já perdi um filho. Tudo por falta de cuidado meu, falta de atenção. Eu não vou perder a outra mulher da minha vida, outra criança. Eu não vou parar de me preocupar, você querendo ou não.

Seu tom foi assertivo, não deu brechas para que eu contestasse nada. Eu tive que entendê-lo.

- Ok. Mas nesse caso eu não preciso nem de band-aid, então assunto encerrado, tá?

Ele concordou um pouco relutante.

- Outra mulher da sua vida, é? - eu brinquei

Seus braços que antes me seguravam firme foram ficando mais relaxados. Ele envolveu minha cintura e puxou meu corpo para mais perto.

- A mulher da minha nova vida - ele escolheu as palavras - Essa vida cheia de surpresas... Como a que aconteceu minutos atrás.

Eu devo ter rolado os olhos, mas, depois, ao perceber que seus olhos estavam fixos em mim, devo ter corado. Enzo levou uma de suas mãos ao bolso, tirando uma foto dele. Estendeu seu braço, colocando a foto na luz do farol e fez uma careta. Ainda estava se revelando, mas era uma foto que mostrava desde minha boca até minha cintura. Havia sombras, mas a luz estava forte, exposta na quantidade certa.

- É mais bonito pessoalmente - ele comentou, fazendo com que as próximas cenas da nossa noite acontecessem

Pulamos os arames da cerca com cuidado e voltamos ao carro. Os faróis foram apagados, mas o motor continuou desligado. Não saímos do lugar. A noite lá fora foi testemunha de cada toque trocado entre nossas peles.

Enzo tentou achar alguma rádio que prestasse, tentando achar alguma de flashback para que pudéssemos cantar juntos. Eu segurei sua mão quando ele foi girar a chave na ignição.

- Vamos ficar aqui mais um pouco - eu afirmei, mas ele concordou achando que era uma pergunta

Ele ainda estava inconsciente de meus desejos quando minha mão foi ao seu pescoço e meu corpo se inclinou do banco de passageiro ao de motorista.

Brinquei com sua orelha, mas ele só percebeu e parou de mexer no maldito rádio quando inclinei-me mais, beijando de leve a lateral do seu pescoço.

- Agora? Aqui? - ele sussurrou, virando seu rosto ao meu

Eu confirmei mexendo a cabeça para cima e para baixo e a proximidade fez com que nossos narizes se encostassem no processo.

- Essa não era a noite que eu faria tudo o que não fiz quando adolescente? Não vamos perder essa chance - eu sussurrei de volta a ele

Ele direcionou seu olhar à minha boca, suas pálpebras quase fechadas, seu corpo sentindo meu dedo anelar tentar se enrolar eu seu cabelo.

- Eu fiquei mesmo um pouco decepcionado quando você se vestiu lá na piscina - ele confessou, me fazendo rir de leve

- Bom, agora é a sua chance de me fotografar com seus próprios dedos - falei, pausadamente, respirando contra sua boca

Eu sabia exatamente que esse tipo de frase surtiria um efeito de estopim. Era exatamente o que eu queria.

Quando o ar dentro do carro parecia entrar pelos meus pulmões como brasa e quando as janelas começaram a suar, fiquei de olhos fechados, sentindo o banco colado à minha pele que, por sua vez, também estava colada em outra pele. Dentro da minha mente, sensações tão intensas que eram incapazes de se definirem. Era como um disco de Newton: todas as cores girando dentro de minha mente e formando uma mistura perfeita, me dando um branco instantâneo. Ao abrir os olhos, de leve, não acreditei na minha auto-confiança exercida nos momentos anteriores. Enzo estava embaixo de mim, seus olhos fechados, seu peito subindo e descendo com rapidez. Eu não lembro do momento em que a cadeirinha de Isa fora para o banco da frente e nós para o banco de trás, mas me lembro dos pequenos detalhes: da sua boca se arrastando pela minha cintura, dos meus dedos pressionando seus ombros, da sinfonia que nossos corpos orquestraram no silêncio daquela parte da cidade. Agora nossos corpos estavam tortos no banco de trás, doloridos por causa dos encaixes dos cintos de seguranças.

Estiquei meu braço, alcançando o botão do vidro elétrico, mas nada aconteceu quando o apertei.

- Precisa ligar o carro - Enzo disse entre sua respiração forte

Com cuidado, me descolei de seu corpo e me estiquei ao máximo até alcançar a chave na ignição. Girei-a com a ponta dos meus dedos, meus braços já doloridos ao tentar alcançá-la. Consegui abaixar um pouco o vidro, vendo que não havia vento nenhum do lado de fora, mas que uma noite de verão no Arkansas parecia uma madrugada de inverno no Alaska se comparada à temperatura dentro do carro. O rádio ligou-se automaticamente e eu reclamei, não querendo ter que me esticar de novo até o painel.

Enzo estava respirando ainda forte, seu peito se inflando e se esvaziando debaixo de mim. Seus olhos estavam praticamente fechados, ele me observava com suas pálpebras pesadas. Não dissemos nada enquanto a ponta de seus dedos passou pelas minhas costas, espalhando a fina camada de suor em minha pele.

- Dentre todas as vezes em que você disse que me amava, essa foi uma das minhas favoritas.

Fiquei tentando lembrar qual momento dessa noite disse que o amava até que finalmente entendi o que ele quis dizer.

- Eu -  ele se pronunciou com a voz pesada, quase sem fôlego - Eu demorei para aceitar que te amava. Eu não achava justo com meu passado, com Catherine. Relutei, passei noites em claro tentando lutar contra o que eu sentia... Quando quase te beijei no carro depois do casamento do Fred, vi que não ia ter como fugir.

- Você nunca me disse isso - eu me intriguei

- Se eu te dissesse antes, você só ia ficar mais insegura, ia questionar ainda mais o que eu sinto por você. Mas, agora, depois de hoje, depois dessa confiança que você me mostrou, não acho que preciso mais te assegurar nada.

- Hum - foi tudo o que eu consegui dizer enquanto tentava discernir sua expressão dentre a má iluminação da rua que entrava pela janela

- Você não entende, né? Se você se abrisse assim com outros caras, se eles te vissem do jeito que eu te vi, especialmente como eu te vi hoje, você teria todos aos seus pés. Mas eu tive essa sorte. Eu tive a sorte de encontrar alguém maravilhoso, excepcional e que resolveu se abrir para mim... Duas vezes.

- Me vissem assim como? Nua?

- Estonteante, Montreal - era como se ele estivesse me dizendo o óbvio

Ele sorriu e eu quis beijar seus lábios ali pelo resto da vida. Sua mão alcançou a minha, brincando com o anel de noivado que ele me dera, ou seja, com a única coisa que eu vestia no corpo. O barulho da rádio dessintonizada estava me desconcentrando da cena.

- Eu vou desligar esse rádio - eu disse, tentando me levantar e alcançar o painel

Ele puxou a mão com qual brincava, me trazendo de volta ao seu peito.

- Você não está ouvindo a música?

Eu me concentrei para tentar discernir alguma melodia.

- Hum... Isso é Take My Breath Away?

- Exatamente. Acabei encontrando uma rádio boa, pelo visto. Eu ainda lembro a primeira vez que eu vi Top Gun na TV... Acabou sendo minha fantasia de Halloween no mesmo ano. As crianças não entenderam, mas eu lembro que os adultos me elogiavam e me davam mais bala por isso.

Ele riu, eu devia estar sorrindo de um jeito bobo.

- O que foi? Tagarelei demais? - ele percebeu

- Eu gosto quando você me conta sobre você, Enzo. Eu gosto de ouvir sua voz, ver seus olhos lembrarem de memórias boas.

- Gosta de ouvir minha voz? - ele riu e começou a cantar

Cantou fora do ritmo, sua voz alta ecoando pelo carro, encobrindo a rádio já cheia de chiados. Eu gargalhei. Não contei as horas, mas ficamos mais longos momentos dentro do carro, cantando todas as musicas chiadas que tocavam no rádio - músicas das quais eu mal lembrava que sabia a letra - até nossas pernas ficarem dormentes e nossas gargantas secas.

Quando estacionamos em frente da casa dos meus pais, pude notar que Enzo estava apreensivo.

- Aquilo que meu pai disse de chegar às 10 era brincadeira - eu disse, como se fosse óbvio

- Eu só não quero que eles tirem conclusões precipitadas sobre mim. Apesar de que... Nós realmente fizemos coisas que preocupam pais de adolescentes por aí - ele riu

- Fica tranquilo, eles devem estar dormindo. São quase quatro da manhã.

- Quem me garante que seu pai não vai estar sentado na sala com uma espingarda na mão?

- Meu pai nem tem nenhuma arma em casa, no máximo minha mãe deixou um chá preparado - eu sorri, puxando-o para dentro de casa

A sala estava com as luzes acesas, mas não havia ninguém lá. Subimos as escadas sem fazer nenhum barulho e dormimos por mais algumas poucas horas. Eu não estava com sono e não queria acordar tarde novamente.

De manhã, achei que tinha acordado cedo, mas quando desci as escadas minha mãe já estava lá, com a mesa posta, tentando desenformar um bolo. Passei pelo quarto de Isa no caminho, só para notar que ela também já tinha acordado e descido, e agora estava sentada à mesa, brincando com um livro novo.

- Bom dia, querida - eu disse, beijando o topo da cabeça de Isadora - Dormiu bem? Vovó te mimou muito?

Ela confirmou com a cabeça.

- Comi sorvete - a criança disse

- Hmmm, de quê? Aposto que era de morango, nessa casa parece que só existe sorvete de morango.

Ela confirmou com a cabeça. Algumas coisas não tinham mudado em vinte anos enquanto outras coisas mudaram por completo.

- Acordou de bom humor, ein? - minha mãe falou - Vem aqui me ajudar a desenformar esse bolo.

- O que você está insinuando, mãe? - eu percebi pelo tom de sua voz e fui até ela

- Nada, só acho que a noite foi boa já que você está de bom humor logo cedo.

- Mãe, foi você quem insistiu que eu saísse. O que isso quer dizer agora?

- Esquece, o mau humor de sempre apareceu.

- Mãe! Eu juro que não estou te entendendo. O que você quer insinuar com isso? Nós saímos, jantamos, passeamos pela cidade. Eu não devia ter ido?

- Eu ein, só quero saber se valeu a pena. Bom, deve ter valido a pena já que vocês voltaram às quatro da manhã - ela sorriu e me fez encará-la

- Você estava acordada me esperando?!

- Seu pai insistiu para que eu fosse para o quarto e não ficasse na sala te esperando. Eu fiz chá pra vocês e vocês nem viram.

Eu rolei os olhos, era previsível.

- Eu fico feliz por você ter se divertido - ela piscou

- Não foi nada demais, nós só passeamos - eu menti por pura vergonha

- Se não foi nada demais, vocês perderam uma bela oportunidade. Na minha época não tinha ninguém para cuidar de você para que eu e seu pai nos divertíssemos um pouco.

- Sem detalhes, por favor, não me dê imagens mentais. Você não queria ajuda para desenformar o bolo?

- Já desenformei, foi só uma desculpa para Isa não ouvir nossa conversa - ela sorriu - Quem quer bolo? James! Venha!

Meu pai entrou pela porta da sala com sua roupa de jardineiro e eu mal pude acreditar na conversa com a minha mãe. Eu queria me esconder de vergonha, afinal, nós aproveitamos sim a oportunidade.
Enzo desceu as escadas instantes depois, procurando todo mundo, com um sorriso nos lábios, e eu lembrei que eu não precisava ter vergonha porque eu não me arrependera de nada ocorrido na noite passada.

- A gente vai embora amanhã cedo - eu avisei a minha mãe enquanto a ajudava a limpar a mesa

Enzo estava dando atenção a Isa e conversando sobre as notícias com meu pai.

- Ah, poderiam ficar mais.

- Nós já planejamos de ir na galeria em Charlotte sábado de manhã, não vai dar tempo se ficarmos mais. Além disso, não quero mais te incomodar.

- Incomodar? Agora que você comprou uma casa esqueceu que essa é sua também? Além do mais, Isadora gostou tanto daqui...

- Falando nisso, como foi ontem à noite? Ela deu trabalho?

- Nenhum. Nós jogamos dominó, assistimos TV e na hora de dormir, foi ela quem acabou contando uma história para gente.

- Sério? - eu sorri - Ela deve ter repetido alguma história que Enzo inventou pra ela.

- Era algo sobre um amigo dela, Travis, Troy, algo assim.

Senti meu corpo gelar.

- Troy? O que ela disse?

- Que ia contar todas as aventuras da viagem pra ele quando voltasse e ia mostrar todas as fotos. Disse que ele só não veio porque precisava ir no médico.

- Mais alguma coisa?

- Não me lembro, por quê?

- Esse Troy... A gente acha que é amigo imaginário. Pelo menos foi o que a psicóloga e a assistente social nos disseram.

- Imaginário? Mas isso não faz sentido, né?

- Por que não?

- Por que ela esperaria para contar tudo isso pra ele? Não era só ela imaginar que ele está aqui?

Eu não tinha pensado naquilo.

- Enzo está desconfiado também.

- E tem toda a razão. Vai que seja um adulto mexendo com a mente dela? Alguém por telefone ou carta? Que a contacta quando vocês não estão por perto? Sei lá, pela história dela, pode até ser o pai de verdade querendo se reconciliar!

Meu olhos se arregalaram. A possibilidade de ser o pai biológico me fez ter um arrepio.

- Mas não deve ser nada, senão vocês iam notar. Coloca o leite na geladeira, filha? Filha?

Eu demorei um tempo para pegar o leite das mãos de minha mãe e colocá-lo na geladeira. Minha mente tentava pensar em algum momento de descuido, se realmente tínhamos aberto brecha para alguém se aproximar de Isa assim. Eu nunca desejei tanto que ela tivesse uma mente puramente criativa em relação a isso.

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