26. Sua filha?
- Céus, Enzo. É só uma semana, a gente não vai se mudar pra outro país não - eu falei ao ver Enzo entrar com quinhentas sacolas pela porta da sala
Eu estava assistindo TV junto com Isa, deitada no sofá ao lado dela.
A menina se levantou ao ver Enzo e foi conferir o que ele havia trazido. Eu fiz o mesmo.
- Comprei só o que eu achei necessário - ele disse enquanto eu mexia em uma das sacolas
- Uma caixa de band-aid com 100 unidades? - eu disse com a caixa na mão
- É para emergências, ué.
- Se a gente precisar usar 100 band-aids em um machucado é melhor ir para o hospital de uma vez.
Ele revirou os olhos, rindo.
- E olha o que eu trouxe pra alguém... - ele disse se referindo a Isa, com algo na mão
- Quem? - ela perguntou inocentemente
- Alguém que gosta muito de conto de fada.
- Eu?
Nós dois rimos.
- Sim, linda - ele sorriu - Um livro de colorir das princesas e uma caixa de lápis de cor metálico!
Ela abriu a boca.
- Pra mim? - a menina disse sem acreditar, pegando o livro na mão
Enzo confirmou com a cabeça e ela folheou as páginas sem acreditar.
- Lápis de cor metálico? Que inveja! - eu brinquei
- Mas eu trouxe algo para você também.
- O quê? O quê? Diz logo, eu odeio ficar curiosa.
- Mas você é pior que a Isa, Mon - ele riu - Comprei uns três pacotes de filmes para nossa viagem. Deve dar três fotos para cada estado.
- Você pensa em tudo, né?
- Ei, posso buscar os outros lápis?
Nós concordamos e ela saiu com cuidado do banquinho e foi subindo as escadas pouco a pouco.
- Comprei outra coisa que eu achei interessante também - Enzo disse quase sussurrando,
me mostrando a caixa
Era uma babá eletrônica. Eu franzi a testa.
- Isso é por causa do tal Troy?
- E porque ela sempre parece estar acordada antes da gente. É bom para que a gente possa ter mais controle.
- Tudo bem por mim. Não vai ser muito invasivo, né?
- Ela nem vai perceber que está lá.
Respirei fundo, desejando que isso não fosse necessário.
Avisamos a Valerie que iríamos viajar e talvez não estaríamos em casa para a avaliação quinzenal, contudo, Valerie insistiu para que só viajássemos depois de sua visita, já que poderia ser útil para Isa se preparar melhor antes de uma viagem longa. Nós concordamos, é claro, e também agradecemos aos céus pela visita da assistente social ser só quinzenal.
Iríamos então viajar na segunda de manhã, logo após Valerie conversar com Isadora. A casa estava virada de cabeça para baixo: malas a serem fechadas pelo chão e brinquedos misturados com lápis de cor. A psicóloga teve que pular alguns gizes de cera para chegar até o sofá, onde Isa estava vendo TV enquanto eu e Enzo íamos de um lado para o outro. Valerie quis falar especificamente com Isa e, apesar de estar indo e vindo arrumando quinhentas coisas, fiquei de ouvidos atentos à conversa.
- Você vai ver muita coisa nova nessa viagem, ok? E se qualquer coisa te assustar ou te deixar nervosa, você não precisa ter medo de falar, ok?
Isa concordou com a cabeça.
- Você não precisa ter medo de falar o que pensa. Nada de ter segredos, lembra daquela história de que "ninguém pode saber"? Não existe isso mais, não acredita mais naquilo. Você sabe que pode me contar qualquer coisa também, então na semana que vem eu vou voltar e se você quiser falar algo só pra mim, pode falar, tudo bem?
Ela concordava com a cabeça. Eu fiquei curiosa quanto à "história de que ninguém pode saber", mas tive que disfarçar e subir as escadas para ajudar Enzo a separar as escovas de dente e outras coisas no banheiro. Valerie foi rápida, apenas conversou com Isa e nos desejou uma boa viagem. Disse que se acontecesse qualquer coisa, poderíamos ligar para ela, mas que semana que vem ela estaria aqui. Eu não quis perguntar sobre a tal história para não confessar que eu estava ouvindo o que não deveria, mas a pulga continuou atrás da minha orelha.
Malas fechadas, brinquedos e livros separados, portas e janelas fechadas, cintos colocados. Nossa viagem estava prestes a começar e eu estava apreensiva. Por via das dúvidas, separei remédios para enjôo, febre e dor de cabeça e juntei-os com a caixa de 100 band-aids de Enzo. Antes de Enzo dar a partida no carro, olhei para trás, checando Isa. Ela estava sentada na cadeirinha, no meio. Lolo, o cachorro de pelúcia, estava do seu lado enquanto sua boneca Gigi estava do outro. Ela me olhou com um sorriso e proferiu palavras que me deixaram nervosa: "o Troy não vem?".
Eu inventei algo na hora, com o coração pesado por estar falando mentiras.
"Os pais dele falaram comigo e ele tinha que ir no médico essa semana, então não deu para ele vir, amor". Enzo me olhou de lado, desconfiado com essa história toda.
- Ah... Tudo bem - a menina disse, desanimada
Com um aperto no peito, eu só queria entender isso melhor. Decidi mudar de assunto.
- Vamos tirar uma foto para marcar o começo dessa aventura, que tal? - falei, abrindo a minha câmera instantânea
Ela logo desfez o bico e sorriu, estreando a primeira foto da coleção.
Paramos para encher o tanque e seguimos viagem. Colocamos um CD de músicas infantis no rádio e eu tentava acompanhar as letras, fazendo Isa rir e tentar cantar também. Foi um começo de viagem tranquilo, animado, mas logo o CD acabou e mesmo colocando-o de novo, a graça tinha acabado. Isa se calou, olhando a paisagem pela janela.
- Qual vai ser a nossa primeira parada? - eu perguntei a Enzo
- O mapa está no porta-luvas.
Eu abri o compartimento e vi que havia um mapa cheio de anotações e um guia de viagens.
- Sabe o que eu acabei de perceber? Que eu estou quase me formando em turismo e foi você quem planejou toda essa viagem.
- Você acha que eu não pensei nisso?
- Como assim?
- Eu planejei a ida. A volta é com você - ele sorriu
- Você acaba de me deixar nervosa.
- Por quê?
- E se eu escolher atrações ruins, chatas, e se eu levar a gente para uma estrada perigosa?
- É sério que sua insegurança passou da fotografia pro turismo agora? - ele falou em tom de piada, eu apenas rolei os olhos - Eu marquei umas atrações bem toscas, mas como tudo é novo para Isa, ela vai gostar de tudo. Não fica pensando negativamente.
- Atrações toscas?
- Se você ver tem uma estátua de uma baleia azul gigante marcada como atração em Oklahoma. Não tem muito como errar - ele riu
Eu comecei a ler as anotações.
- Maior taco de baseball do mundo? - eu gargalhei
- É isso que dá deixar o planejamento pra mim. Isso sem falar nos restaurantes.
- A melhor parte!
- Já parou pra pensar que talvez nós sejamos os pais mais legais do mundo? Eu deveria colocar isso no mapa de atrações - Enzo brincou, colocando sua mão sobre minha perna
- Tem razão, vou anotar aqui junto com "as piores piadas de pai do mundo".
- Acho que é automático, alguém te chama de pai e as piadas ruins já surgem automaticamente.
Eu sorri, mas não falei mais nada.
- Desculpa, não fica assim. Eu sei que você está chateada porque ainda não ouviu a palavra mágica, mas tenho certeza que essa viagem vai mudar tudo.
- Vamos ver - eu suspirei - Vamos ver.
O sol quente estava fazendo com que uma miragem se formasse no chão. Nós estávamos na estrada interestadual 40, a famosa rota 66, e a paisagem não podia ser mais bonita: era uma mistura de azul do céu com todas os possíveis tons de laranja e vermelho das montanhas e cânions. Eu percebi que Isa olhava ora pra para a janela à sua esquerda, ora para à sua direita. Tudo ficou mais bonito depois que adentramos o Petrified Forest National Park, então guardei mentalmente o lugar para que pudéssemos adentrá-lo na volta. Contudo, paramos quando avistamos um ponto turístico, nosso primeiro de muitos. Era uma carcaça enferrujada de um carro antigo e Enzo explicou a Isadora sobre a rota 66, que ela ia da Califórnia a Chicago e que na época era uma viagem bem perigosa e muito longa. Entretanto não ficamos muito tempo fora do carro, isto é, fora do ar condicionado. Aproveitei para tirar uma foto de Isa do lado do carro velho e logo voltamos à estrada.
- Por que você está colocando a foto na saída do ar condicionado? - Enzo perguntou, acelerando
- Porque está calor demais e se ela revelar nessa temperatura, vai ficar tudo amarelo e super-exposto.
- Uau, você tem tanta coisa para me ensinar! - ele brincou
- Pelo visto você também. O que foi aquela aula de história lá fora?
- Eu só li muitos artigos na internet - ele fez uma careta
- No próximo semestre é você quem vai me ajudar nos trabalhos - eu ri, colocando a foto em contato com a minha roupa para não deixá-la esfriar muito
- Eu posso ver a foto? - Isa perguntou no banco de trás
- Ela está aparecendo - eu disse, entregando a foto instantânea à pequena - Fica prestando atenção porque daqui a pouco deve aparecer.
Depois de alguns minutos, tudo o que eu ouço do banco de trás foi um "uau" animado. A foto tinha deixado de ser um borrão azul e tinha se revelado.
- Isso é mesmo coisa de fada madrinha! - ela comentou, inocentemente
Eu apenas sorri no banco da frente.
◆
Depois de termos passado pelo fronteira com o estado do Novo México e, claro, ficarmos brincando de contar os carros com cores iguais, decidimos parar e comer algo. Enzo precisava descansar um pouco de tanto dirigir e eu estava morrendo de vontade de ir ao banheiro. Paramos em um restaurante de estrada, perto de Gallup. Era um ambiente familiar com comida sulista, havia música, muita decoração e, o mais importante, uma área para crianças brincarem. Isa foi correndo até o escorregador e nós nos sentamos em uma mesa onde podíamos observá-la. Eu a chamei quando nosso pedido chegou, mas ela mal conteve sua animação para acabar logo de comer e brincar mais. Era bom, era uma distração para ela já que ainda tínhamos chão para caramba pela frente.
- Se você estiver cansado de dirigir, eu posso assumir o volante, ok? - eu disse
- Não estou cansado, não. Mas vamos devagar, parando, observando as paisagens. Se ficar muito tarde paramos em um hotel. Eu quero que essa viagem seja tranquila, a primeira de muitas.
Enzo estendeu seu braço, sua mão pegou a minha e seu polegar brincou com o anel de noivado que ele me dera.
- Não me faz ficar sentimental, estamos em público - foi tudo o que eu comentei, rindo
- Desculpa, é que... Sinceramente eu acho que a vida no momento não podia ser melhor. E é bom falar em voz alta pra finalmente ter certeza que é real.
- Enzo! Eu disse pra você não me deixar mais emotiva - minha voz já estava quebrando, fraca e meia olhos estavam ficando molhados
Contudo, antes que ele pudesse falar qualquer outra coisa que me deixasse completamente sem palavras, ouvimos um choro de criança. Era Isa, que estava correndo até nós com os olhos molhados. Assim que Enzo a viu, eu percebi seu desespero.
- O que foi, amor? Você caiu? Se machucou? O que aconteceu? - ele disse, conferindo os braços da criança e a deixando ainda mais nervosa, fazendo-a chorar mais
- Calma, calma - eu disse, me agachando perto dela - Respira fundo. Estamos aqui, querida. O que aconteceu?
Ela soluçava, buscando fôlego entre as palavras.
- Ele... Disse que meu cabelo... Era feio... E ruim.
Isa apontou para uma outra criança no playground. Percebi que Enzo ficou mais calmo depois de ver que ela não havia se machucado, mas era melhor eu tomar o controle da situação. Ele a protegia demais e se apavorava por pouca coisa, como eu já havia notado.
- Saiba que você é linda. Seu cabelo é lindo e não existe essa coisa de cabelo bom ou cabelo ruim. Não acredite em quem te disser isso, ok? Agora vamos lá, vamos fazer ele pedir desculpas.
Eu a segurei pela mão e a levei até o playground de novo, seu rosto ainda estava vermelho, mas sua respiração havia se acalmado. Ela apontou de novo para o menino que a havia insultado. Eu sabia que era coisa de criança imatura, mas eu não podia ensinar a Isa a deixar essas coisas pra lá, a esquecer. Eu havia feito isso a minha vida toda e só me gerou insegurança; eu queria que ela fosse forte.
- Oi, tudo bom? - eu falei ao menino, que na hora estava subindo pela escada do escorregador
A criança se assustou com um adulto falando com ela.
- Você mesmo. Foi você quem disse coisas ruins o cabelo da minha filha?
Ele continuava assustado, parado no meio da escada sem se mover.
- Algum problema? - ouvi uma voz do meu lado
- Ah, olá. Você é a mãe desse menininho aqui? Queria mesmo falar com você - eu estava sendo educada ao máximo, mas percebi que a mãe do garoto não estava muito amigável
- Falar o quê? - ela foi grossa, cruzou os braços
- Acontece que o seu filho falou algumas coisas não muito legais pra minha filha, eu sei que às vezes as crianças aprendem essas coisas na escola, na TV, não é bom mesmo. Então se ele pudesse pedir desculpas, eu ficaria grata.
Isa segurava minha mão fortemente, engolindo o resto do choro. Meu tom de voz foi calmo, mais porque eu estava forçando uma educação e não porque realmente estava tranquila.
A mulher riu. Chegou a inclinar o corpo para trás. As crianças estavam imóveis, assim como eu, vendo a cena.
- Perdão? O que é tão engraçado?
- Sua filha? - a mulher riu novamente - Você tem certeza que não trocaram seu bebê na maternidade?
Nesse momento eu percebi de onde o menino havia aprendido a ser tão desagradável.
- Meu filho não precisa se desculpar por nada. Tenho certeza que provavelmente sua filha - ela riu novamente - o provocou.
- Espera. Além de você insultar minha família, você ainda está acusando minha filha - eu repeti essa palavra com mais força dessa vez - de provocar seu filho?
A mulher só ria, eu queria enfiar minha mão na cara dela. Seu filho também começou a rir, imitando a mãe. Isa começou a chorar tudo o que havia guardado para si nos últimos minutos. Eu não queria ser agressiva na frente de Isa, então apenas a coloquei em meu colo, abafando seu choro. Enzo, que estava na mesa, veio me amparar quando percebeu que Isa voltara a chorar.
- Vai lá pra fora, eu cuido disso. Tira ela daqui - ele sussurrou a mim
Eu saí com Isa chorando no meu ombro, mas eu estava prestes a chorar também. Deixei ela soluçar e se acalmar, sentindo minha roupa molhada de lágrimas. Não quis prestar atenção no que estava acontecendo lá dentro, mas esperava que Enzo resolvesse à sua maneira, isto é, sendo educado mas calando aquela maldita com o seu tom alto de italiano.
Isa respirou fundo enquanto eu passava a mão por seus cabelos cacheados e volumosos.
- Meu cabelo não é feio, né? - ela me perguntou, inocentemente, com voz de choro
- Seu cabelo é perfeito. Sabe por quê? Porque é seu e ninguém tem igual.
- Por que eu não posso ter o cabelo igual ao seu? Eu queria ser igual você.
O que eu iria responder àquilo?
- Por que ser igual quando você já é mil vezes mais bonita, mais inteligente e mais bondosa que eu, querida? - eu dei um sorriso quebrado - Você é uma princesa, não deixe nenhuma bruxa má te dizer o contrário.
Ela não se convenceu muito, mas encostou seu rosto no meu ombro molhado mais uma vez. Eu via os carros passarem na estrada com o coração quebrado, querendo que ela não se sentisse diferente de mim, querendo que ela me visse como sua mãe apesar de todas as pessoas que irão rir disso.
Enzo saiu do restaurante bufando, como uma bala.
- Assim que eu tiver uma boa conexão de internet, esse restaurante vai receber a pior avaliação do mundo culinário em todos os sites de viagem. Ah, se vai!
Se eu não tivesse tão abalada, provavelmente riria da sua revolta, mas somente coloquei Isa na cadeirinha e seguimos viagem, dessa vez sem reparar com tanto entusiasmo na paisagem.
O rádio estava desligado, no carro havia um silêncio chato e era provavelmente porque eu e Enzo estávamos nos torturando com os acontecimentos anteriores.
- Eu vou pular o próximo ponto turístico, ok? Acho que não estamos no clima - ele disse, sem me olhar
Virei-me para trás. Isa tinha caído no sono.
- Como as pessoas podem ser tão más? Tudo o que eu quero é voltar lá e descarregar toda minha raiva naquela mal-educada.
- Pode deixar, eu fiz isso por você - Enzo disse
- O que você disse a ela?
- Que eu não iria admitir que ninguém estragasse a felicidade de uma criança que já passou por coisas que provavelmente o filhinho mimado dela nunca vai passar. E umas coisas a mais também, eu mal me lembro. Quando eu comecei a soltar palavrões, o dono do restaurante pediu para que eu me retirasse e eu me retirei... Sem pagar e reclamando mais ainda.
Eu o olhei, quase rindo.
- Que a aquela mulher esteja apavorada até agora com seu tom de voz... Eu sei que eu estaria - ele sorriu - Obrigada por ter feito isso.
- Você está me agradecendo por defender nossa família? Isso não é mais do que minha obrigação.
- Você seria um excelente homem das cavernas, não deixaria nenhum animal selvagem se aproximar da nossa cria.
Enzo me olhou com estranhamento, segurando uma gargalhada.
- Você tem que parar de ver Discovery Channel - ele riu - E eu provavelmente te arrastaria pelos cabelos se eu fosse um homem das cavernas, nada é perfeito.
- Depende, uns puxões no cabelo às vezes são bons - eu comentei e ele abriu a boca
- Tem uma criança no banco de trás - ele sussurrou
- Ela está dormindo e isso não faria o menor sentido para ela.
- É isso que às vezes me assusta... Ela é inocente demais, apesar de tudo. Ela vê bondade às vezes onde não existe.
E então o silêncio desconfortável voltou ao carro enquanto seguíamos para Albuquerque. Decidi ligar o rádio.
◆
- Isso é uma cidade de verdade? - foi o primeiro comentário de Isa ao chegarmos em Albuquerque
De fato, parecíamos estar em uma cidadela mexicana e não no meio dos Estados Unidos. O calor conseguia ser pior do que o do Arizona, então antes de conferirmos os pontos turísticos, decidimos tomar sorvete. Porém, não fomos rápidos o suficiente e o sorvete começou a derreter em nossas mãos. Isa estava se divertindo e eu estava contente por ela ter se esquecido do que havia acontecido horas atrás. Pedi para que ela posasse com o sorvete em mãos na frente de uma loja com arquitetura típica da cidade: paredes feitas de barro, com cantos arredondados e placas de madeira escritas à mão. Do lado de fora, havia um enorme cacto. O resultado final foi uma foto alegre: o sorvete de morango rosa lambuzando a pequena e o cacto verde ao lado. Albuquerque era uma cidade nada convencional, havia inúmeras lojas de decorações mexicanas, uma banda tocando mariachi, igrejas que pareciam ter saído de um velho oeste por todos os lados. Compramos souvenires: um saleiro e um moedor de pimenta de caveiras coloridas e seguimos viagem, afinal, eu tinha prometido aos meus pais que chegaria lá amanhã sem falta.
Enzo já estava cansado quando chegamos ao hotel que ele havia escolhido a dedo. Era um hotel pequeno, mas cheio de personalidade. Toda a decoração relembrava os tempos áureos da Rota 66, a começar pelo grande neon da entrada. Eu também estava exausta, mal reparei quando dormi, só me lembro de ter acordado no dia seguinte por causa da cortina que esquecemos de fechar completamente. Isa dormiu ao nosso lado, em uma cama extra, encostada na parede. Eu olhei para o relógio retrô e bocejei. 7:37 da manhã.
- Bom dia - Enzo sussurrou, me fazendo virar para ficar à sua frente
- Bom dia - eu falei, fechando os olhos novamente - Posso dormir mais uns cinco minutinhos?
- Pode, mas não muito. Quero achar uma casa de panquecas aberta.
- O que você está fazendo acordado? Não está cansado de dirigir?
- Na verdade, eu acordei para ver se Isa não estava acordada.
Eu abri os olhos, virei o pescoço e vi Isadora dormindo tranquilamente. Voltei a encarar Enzo.
- Ela está sempre acordada antes de gente, certo? - concordei com a cabeça - Geralmente antes das oito ela já está de pé, olhando pela janela. Hoje ela está dormindo direto.
- Isso não significa muita coisa, talvez esteja cansada da viagem - eu rebati, tentando explicar essas teorias da cabeça de Enzo
- Não sei, não sei. Eu só sei que a primeira coisa que eu vou fazer quando a gente voltar vai ser instalar aquela babá-eletrônica.
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