Capítulo 06
C A P Í T U L O S E I S
Algumas poucas lágrimas deslizavam pelo rosto de Graziela.
Do lado de fora da UTI ela observava com um aperto no coração e um nó enorme no estômago o filho que permanecia entubado ainda e sendo analisado por Adriano. O médico estava todo coberto por uma vestimenta própria para a entrada na UTI pois qualquer coisinha, por mínima que fosse, trazida do lado de fora daquela sala seria o suficiente para agravar o estado delicado em que Lucas se encontrava.
Graziela tinha sido informada de que infelizmente não poderia entrar e o sentimento de culpa estava corroendo-a por dentro. Graças a esse sentimento a mulher havia passado as últimas horas se martirizando e torturando-se enquanto seu eu interior lhe dava uma bronca dizendo a si mesma de que ela deveria ter dado mais razão ao seu lado de mãe protetora e ter levado o filho de volta para o hospital.
Adriano conseguiu tirar Graziela de seus pensamentos quando abriu a porta. Ele abaixou a máscara que cobria sua boca e a proteção de acrílico do rosto para poder falar com ela.
── Por favor, me diga que meu filho vai ficar bem.
── Tendo em vista o estado em que Lucas chegou eu posso te aliviar um pouco dizendo que ele teve uma melhora significativa. ── Adriano respondeu, olhando algo na prancheta em suas mãos. ── Alguns dos sinais vitais estão normalizados mas ele ainda está com dificuldades na respiração.
── E o que isso quer dizer? Ele vai ter que continuar na UTI ainda? ── ela insistiu, necessitando de uma resposta mais clara que aquela.
── Quero dizer que se tudo continuar ocorrendo bem ele vai poder voltar para o quarto ainda hoje, mas vai precisar do auxílio de uma cânula nasal para respirar. ── ele concluiu, abrindo um sorriso para tentar confortar a mente de Graziela.
Aquilo funcionou um pouco. Ela deixou seus ombros tensos relaxarem, soltando a respiração prendida.
── Não posso acreditar que uma coisa dessas está acontecendo. ── murmurou, encostando a cabeça no vidro.
Adriano se aproximou e repousou sua mão no ombro dela.
── Graziela, seu filho estará bem dentro de alguns dias. Devemos levantar as mãos para o céu e agradecer ao Renato. ── ao ouvir o nome daquele homem ela girou a cabeça e direcionou um olhar de indignação para Adriano. ── Não me olhe assim, sabe que o que estou dizendo é verdade.
── Eu não tenho que agradecer nada a ele! Isso não teria acontecido se eu não tivesse deixado minha razão de lado para permitir que meu filho ficasse lá com eles. ── ela revidou. ── Escute bem doutor Adriano; Eu não quero que esse menino ou o pai dele voltem a se aproximar do Lucas novamente.
── Graziela, não acha que isso já é demais? Não pode privar o seu filho de ter amizades. Elas também são importantes para a saúde dele. ── Adriano rebateu, manifestando sua total discordância com aquela atitude.
── Não me diga como cuidar do meu filho, Adriano! ── Graziela esbravejou furiosa enquanto se virava na direção da lanchonete. ── A decisão já está tomada com ou sem o seu consentimento.
Ao chegar na lanchonete ela pediu um café e se sentou em uma daquelas cadeiras desconfortáveis. Passou as mãos pela nuca e apertou a região, percebendo o quão tensa estava. Sua falta de atenção com as coisas ao seu redor era tão grande que Graziela sequer notou a aproximação de Renato e apenas se virou assustada quando sentiu o toque da mão gelada dele em sua pele, descoberta pela abertura do vestido nas costas.
── O que está fazendo aqui? ── ela o encarou de olhos cerrados, se levantando da cadeira para manter distância dele.
── Graziela, eu queria... Sobre o que aconteceu, eu... ── Renato gaguejou, não conseguindo controlar seu nervosismo. ── Eu sinto muito Graziela. Só queria saber como seu filho está.
── Você sente muito? ── ela questionou com um tom de revolta na voz. ── O meu filho está na UTI e respirando com a ajuda de aparelhos Renato. Aparelhos! Você tem noção do que essa sua falta de responsabilidade poderia ter causado? Eu poderia ter pedido o meu filho.
── Graziela, eu te entendo e me desculpo por isso, mas você também precisa me entender. Como eu poderia imaginar que uma chuva iria cair? ── ele rebateu, tentando se defender. ── Por favor, Terence também está preocupado. Ele está com medo e queria saber notícias sobre o amigo.
── Que bom que mencionou o seu filho porquê eu tenho um aviso para dar a vocês dois. ── ela molhou um pouco os lábios antes de prosseguir. ── A partir de hoje eu não quero que Terence continue vendo meu filho.
Renato se calou, processando o pedido absurdo.
── Está castigando o meu filho por um erro meu?
── Estou fazendo isso por motivos de proteção e você sendo pai deveria me entender melhor do que qualquer outra pessoa.
── Você está tentando dizer que Terence é um problema para o seu filho? ── Renato logo mudou seu tom de voz, mudando também o rumo daquela conversa que havia começado de forma amigável.
── Honestamente eu acho que Terence é uma má influência para o bem estar do meu filho. ── Graziela apoiou as mãos em sua cintura. ── Lucas tem se tornado uma criança totalmente diferente e eu tenho certeza que isso é influência do seu filho.
── Perdão? Terence jamais foi uma má influência para alguém. O que aconteceu foi um acidente que eu infelizmente não pude prever e você deveria tentar entender isso, e não punir uma criança.
── Você não entende. ── novas lágrimas brotaram dos olhos de Graziela enquanto ela se sentava na cadeira. ── Essa doença levou a pessoa que eu mais amava de mim. E agora ela voltou para levar o meu filho, mas dessa vez não vou permitir outra dor. Eu vou fazer o possível e o impossível para manter meu filho vivo.
Renato conseguia sentir a dor nas palavras de Graziela. Queria conforta-la mas não sabia se deveria.
Aquela era uma dor que até poderia passar mas nunca seria esquecida por Graziela. A mãe era a razão de sua vida e depois que ela se foi o seu mundo desabou. Em um dia a mulher achava que tudo estava bem e no outro um novo baque e um novo mundo reconstruído desmoronando novamente; A descoberta de que Lucas estava com leucemia, a mesma doença que levara a mãe.
No início Graziela pensou que o universo estava lhe pregando uma peça e por vezes se viu brigando até mesmo com Deus, achando que o grande senhor estava castigando-a por algum mal que sua pessoa tinha feito em uma outra vida passada. Mas não era castigo nem nada, era apenas a vida e o caminho que ela havia decidido tomar.
Graziela negou a ideia de que teria que passar novamente por todo aquele caminho doloroso repleto de falsas esperanças. O transplante era a única salvação de Lucas mas o impedimento para essa cura era a compatibilidade. Encontrar um doador que fosse compatível com o garoto era o mesmo que buscar uma agulha do palheiro. Nem mesmo parentes eram compatíveis com ele.
Ninguém poderia ajudar e a espera agoniante na fila matava as esperanças de Graziela um pouco mais a cada novo dia. Talvez fosse por essas razões que ela se jogava de corpo e alma no trabalho, chegando até mesmo a esquecer que era mãe e que estava fracassando nessa tarefa.
Ao ver o estado em que Graziela se encontrava Renato decidiu tomar coragem e se aproximou para abraça-la,mas a mulher tratou de se recompor e limpar o rosto completamente manchado pelo rímel.
── Graziela, eu sinto muito por isso.
── Não sinta. Isso não diz respeito a você. ── ela fungou e foi até o balcão para pegar seu café que havia ficado pronto. Ao passar por Renato ela olhou para ele. ── Você já está avisado. Eu não queria ter que fazer isso mas não tive escolha.
Ao perceber a aproximação de Graziela Adriano se ajoelhou no chão para poder ficar escondido atrás do vaso grande de planta.
Ele estava de passagem pelo corredor em frente a lanchonete quando ouviu boa parte da conversa da mulher com Renato, então decidiu esperar até que ela fosse embora para poder ir falar com o rapaz. Após verificar se a zona estava segura Adriano se levantou e caminhou até Renato. Ele estava sentado e de cabeça baixa, pensando em como daria aquela notícia ao seu pequeno.
── Renato? ── Adriano o chamou, vendo-o se virar para ver quem o chamava.
── Doutor Adriano? O que faz aqui?
Adriano arrastou uma cadeira e se sentou de frente para ele.
── Desculpe se vou parecer intrometido ou algo do tipo, mas eu estava passando aqui no corredor e não pude deixar de escutar o pequeno desentendimento que teve com a Graziela.
Renato suspirou, apoiou seus cotovelos na mesa de metal e passou as mãos pelo rosto.
── Quem não ouviria não é. Nós estávamos brigando feito dois adolescentes. ── ele riu, mas no fundo estava desolado. ── Eu entendo que ela tenha um trauma com o passado mas chegar a tomar uma medida como essa? Ele são apenas crianças Adriano.
── Eu também não concordo com essa atitude dela. Eu sei que o Lucas não vai gostar dessa decisão e meu medo é de que ele fique triste ao ponto de não querer mais fazer o tratamento logo agora que está tão perto de se conseguir um doador.
── Então quer dizer que encontram um doador compatível com ele?
── Estou esperando a confirmação ainda, mas é quase cem por cento de certeza que sim.
Renato sorriu.
── Isso é uma ótima notícia! Mas por que está contando ela para mim? Graziela é quem deveria saber primeiro.
── Esse doador é de fora. O hospital em questão fica na capital e se tudo for confirmado Lucas será transferido de hospital e seu filho e ele não irão mais se ver. ── Renato se encolheu na cadeira, se sentindo mais derrotado do que nunca. ── Diga ao Terence que o amigo dele está bem e que muito em breve vai poder lhe fazer uma visitinha. Não se preocupe, eu darei um jeito nessa situação e garantirei que eles se despeçam um do outro.
As esperanças dentro de Renato se renovaram junto com aquela confirmação de que Lucas estava bem.
── Obrigado doutor. De verdade, muito obrigado.
Adriano se levantou da cadeira e deu um forte abraço no homem. Se por um lado Graziela iria fazer de tudo para ver o filho vivo, do outro Adriano também iria mover céus e montanhas para ver um sorriso no rosto de Lucas.
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