04. PROCESSO DE ADAPTAÇÃO
────── PROCESSO DE
ADAPTAÇÃO.
( ☯ )
SEGUNDA VEZ CONSECUTIVA NARRANDO isso. Sério, a falta de profissionalismo da autora é inacreditável. Acho melhor não reclamar tanto, mas espero que ela reveja esses hábitos.
Onde nós paramos da última vez? Oh! Certo. Uniforme com a Zara Julliard. Ela é muito simpática, não é mesmo? Acontece que depois daquele dia, eu meio que relaxei. Não um relaxamento normal, como se jogar no sofá e ligar a televisão em um canal aleatório, com um programa minimamente interessante, e me entupir de frango frito enquanto deixava a minha vida definhar em um processo contínuo de procrastinação e negação. Não. O meu processo funciona um pouco diferente nessa parte.
Mel me enchia o saco constantemente. Naquela semana, em especial, eu fui obrigada a treinar em uns quatro dias, praticamente. Não pude me estabelecer na cidade, espalhar as boas novas do meu retorno (e assim conseguir algum emprego) e nem mesmo sair com alguns amigos. Fazer amigos, em geral. Eu não sou muito boa nisso, mas nunca me impediu de tentar.
Enfim, eu acabei procurando maneiras mais físicas de extravasar tudo isso. Eu nunca tinha processado a mudança repentina de estilo de vida, e agora estava vindo à tona. Minha melhor alternativa foi buscar por um espaço em Hell's Kitchen que tivesse um saco de areia bem pesado e resistente, e socar ele em algumas noites da minha semana. Fiquei mais tempo na academia do que o de costume e se eu não tivesse comido o suficiente para acompanhar essa rotina, provavelmente estaria abaixo do meu peso.
Inclusive, realmente teve uma vez na semana que me entupi de frango frito, mas não foi nada relevante para a história. Ou até mesmo para esse capítulo.
O que foi relevante foi a pesquisa que fiz desde que cheguei. Um projeto particular, apesar de eu sentir que Meleasel sabia de tudo. E o título daquilo era grande, agressivo e destacado com marca-texto: O que Wilson Fisk queria para Hell's Kitchen?
É óbvio que eu não esqueceria o único motivo de ter retornado para cá, afinal. Mas Wilson não era uma figura pública. Como uma verdadeira ratazana, ele vivia sobre as sombras, mandando seus subordinados fazerem todo o trabalho sujo e nunca arriscando o próprio pescoço.
Covarde.
Agora mesmo, na minha sala, eu estava com várias canetas espalhadas pelo chão, uma enorme xícara de café do lado da minha coxa esquerda e um pedaço de sanduíche de queijo ao lado da outra perna. Encarando Wilson, centralizado na minha cartolina. Não ele de verdade, já que eu não fazia ideia de como ele era, mas o seu apelido especial. Rei do Crime.
Uma coisa que percebi é que ele estava em tudo. Em cada prédio, em cada empresa, em cada esquina, monitorando cada cidadão, se certificando que nada saísse da linha. Mas outra pessoa também estava. Alguém misterioso e cuja forma ainda não havia sido revelada pelas mídias locais. Mas ele tinha um nome, pelo menos. O Diabo de Hell's Kitchen. Adorável, não?
Aparentemente, os métodos dele não são os mais pacíficos, mas nunca vi nada sobre ele matar pessoas... Até agora.
Depois de dois dias nessa cidade, eu percebi que tudo estava sim, um caos completo. Só não era levado para a imprensa de Nova York. Ou do Queens. Ou do Brooklyn. Então Fisk também controlava isso.
Mas, recentemente, um evento ocorreu. Algo impossível de ser contido.
Vamos recapitular.
Dois dias atrás. Ruas 47ª e 12ª. Ruas 48ª e 9ª. Ruas 42ª e 10ª. E ruas 44ª e 11ª.
Um incidente aconteceu nessas regiões da cidade ou algo assim. Resumidamente, uma baita de uma explosão. E todas as vítimas desse ocorrido estavam mortas, com exceção dos que estavam perto dos depósitos e acabaram feridos ─ momento de choque: isso foi suavizado pelos jornais, e muito pouco comentado. Mas sabe a parte realmente interessante desse evento? O vigilante menos favorito dessa cidade teve a sua participação.
Tive o prazer de acessar mais alguns nomes associados ao Fisk durante minha estadia. Um deles era Vladimir. Apenas Vladimir. Tem um certo charme nisso. É tipo falar sobre a Zendaya. Ninguém nem precisa do sobrenome para saber quem ela é. É claro que eu não devo comparar um ícone da moda e televisão com um assassino. Certo, vou parar.
Enfim, esse cara, um russo característico, trabalhava para Fisk. Mas a julgar pelo modo como tentaram matar ele, o homem deve ter se rebelado. E Wilson procurou dar um recado significante não só para Vladimir, como para todos os outros que tentassem traí-lo. Esperto, tenho que admitir.
Então, só para ninguém se perder: Vladimir se rebela contra Fisk. Fisk tenta matar Vladimir. Vladimir consegue sobreviver. Vladimir tenta fugir e o Diabo encontra ele. O justiceiro dá uma puta surra nele. Os policiais chegam. Os policiais são corruptos e tentam apagar o russo e prender o Diabo. Eles levam uma surra e o justiceiro foge com o cara que Wilson Fisk queria matar.
E agora, depois de uma história muito mal contada na 47ª e 12ª, o Diabo de Hell's Kitchen estava ainda mais longe de ser considerado um dos mocinhos. Mas sabe quem realmente estava curiosa pra parar de teorizar contos e conhecer esse mascarado de uma figa? Acertou, euzinha.
Quando saí da minha linha de raciocínio, eram nove horas da manhã. Mesmo sem perceber, eu havia terminado o seu sanduíche, o resto do meu café já havia esfriado e eu havia rabiscado demais alguns cantos da cartolina.
Tudo o que eu tinha eram suposições.
Levantei do tapete com cuidado, levando o prato e caneca até a pia e depois voltando para pegar a cartolina e esconder dentro do meu armário. Sim, péssimo esconderijo, mas eu nunca recebi a visita de ninguém a ponto de me preocupar com os meus próprios segredos.
Já estava vestida ─ uma saia de estilo lápis preta, até a altura dos joelhos, e uma camisa de mangas compridas e justa, da cor vinho ─ e apenas ajeitei as pontas do meu cabelo antes de abrir a porta... E visualizar alguém que eu não esperava.
─ Foggy? ─ Eu levanto uma sobrancelha, e equilibro minha bolsa no braço.
Do outro lado do meu apê, o rosto familiar e confiável de Franklin me encarava com aqueles olhos azuis e intrometidos. Ele sorriu de modo desajeitado para mim.
─ Lilith, bom dia!
─ O que você está fazendo aqui? ─ Ainda segurando a porta, decidi dar abertura caso ele queria entrar. Apesar de inicialmente hesitar, ainda sim o fez. ─ Quer dizer, achei que estaria trabalhando.
─ É. As coisas estão um pouco calmas depois das explosões. Acho que ninguém está muito preocupado em arranjar advogados para processar o mascarado. ─ Ele tenta sorrir, se sentando no sofá.
─ Como pode ter certeza de que foi ele? ─ Eu cruzo os braços, curiosa, e ele revira os olhos.
─ Também vai defender ele? Já basta a Karen.
─ Acho que deveria escutar a loira; ela parece saber das coisas.
─ Só porque tem a mesma opinião que você? ─ Ele perguntou, sorrindo.
─ Precisamente. ─ Me sento ao seu lado, e ela leva a mão à costela em seguida, fazendo uma expressão de desconforto. ─ Está tudo bem?
─ Só me machuquei um pouco com todo esse caos. Mas já cuidei disso.
Eu fico quieta. Não havia como prosseguir com aquele assunto.
Nunca tive intimidade com Foggy a ponto de contarmos muito sobre nós mesmos para o outro. Obviamente que tínhamos afinidade e carinho, mas tudo isso também se dava por Matthew.
Algo estala na minha cabeça.
─ Matthew está bem?
─ Está sim. ─ Ele me encara, e depois de um tempo, sei que está prestes a me perguntar algo. ─ Posso fazer uma pergunta?
─ É claro.
─ Vocês voltaram?
─ O que?
─ Eu sei que o relacionamento de vocês dois não me envolve mas... ─ Ele estava mentindo. Desde o início ele esteve nisso. Era como o Ted com Lily e Marshall, de HIMYM. Ele também teve que processar todas as merdas do término. ─ Nós dois sabemos como isso acabou. Não quero que ele se machuque de novo.
─ Eu não estou com o Matthew. Por que achou isso?
─ Ele não pareceu surpreso com a sua volta para Hell's Kitchen. Era como se esperasse por isso. E a conversa que vocês tiveram quando saíram do escritório durou muito pouco.
Eu tentei contornar a situação. Era evidente que Matthew não estava surpreso; ele sabia que eu iria voltar pra cá. Ele foi a primeira pessoa para quem anunciei a ideia em voz alta. Em uma sala de interrogatório. Algemada. Com sangue escorrendo da minha cabeça. E um uniforme de super-heroína no corpo. Essas coisas são difíceis de explicar.
─ Como isso poderia provar que estávamos juntos?
─ Eu não sei ─ Ele gesticula com as mãos. ─ E ele tem sumido bastante ultimamente, pensei que estaria com você. Em algum lance casual ou algo do tipo.
─ É extremamente desagradável a ideia de conversar a minha vida sexual com você, Nelson. ─ Eu balanço a cabeça, afastando a visualização de eu e Matt juntos. ─ Talvez ele esteja com outra garota.
O loiro parece refletir a possibilidade, os olhos perdendo o foco enquanto se distraía com isso. Depois, ele levanta a cabeça. Parece concordar comigo quando diz:
─ E por fim, você continua chamando ele de Matthew. Ninguém chama ele assim.
─ É o nome dele! ─ Eu seguro a risada.
─ Parece um provocativo.
─ Eu te chamo pelo nome também. ─ Tento me defender, levantando as mãos em sinal de rendição.
─ E isso é muito irritante! Deveria parar. ─ Ele ri, e eu acompanho o gesto.
─ Veio aqui para confirmar isso? Para se certificar de que as coisas não dessem errado de novo?
Ele confirma com a cabeça.
─ Nem um pouco disso tudo foi para me ver? ─ Eu pisco os meus olhos como uma boneca, esticando o pescoço e fingindo uma tristeza repentina.
Ele riu.
─ Você deveria passar lá um dia.
─ Acho que quando eu começar a frequentar a firma de vocês, provavelmente estarei encrencada.
Ele estala os dedos.
─ Tem razão. Mas deveríamos sair para beber. Você pode conhecer Karen melhor, e pode me arranjar para ela.
─ Como sempre, você continua com segundas intenções comigo, não é mesmo?
─ Quem não arrisca, não petisca. ─ Ele sorri, de orelha a orelha, se levantando em seguida e tirando um papel do bolso. ─ Mas eu também vim te dar isso.
Ele me entrega o pedaço de papel, metade de uma folha sulfite amarela dobrada no meio, e quando eu abro, tem um número de telefone.
─ Deveria tentar fotografia jornalística. ─ Ele falhou um pouco no termo, mas eu não pude conter a adorável surpresa que senti com a sua iniciativa. Era uma indicação?
─ Ainda existe jornal nesta cidade?
─ Não com a mesma influência que antes. Mas Karen tem um amigo na The New York Bulletin. Talvez possam se interessar por seu trabalho.
─ Não mexo mais com esse tipo de fotografia, Foggy. ─ Eu tento sorrir, guardando o papel no bolso.
─ Não é tudo a mesma coisa? ─ Ele franze o cenho, mas sei que está brincando.
─ Vai se foder.
─ Está bem, está bem, agora eu preciso ir. Imagino que você também vá sair, espero não ter atrapalhado.
Eu balancei a cabeça.
─ Você sempre me atrapalha, mas foi legal te ver.
Quando ele está na porta, prestes a ir embora, se vira e acena para mim de forma breve.
─ Eu estou falando sério sobre sair pra beber.
─ Eu não mudei meu número, Franklin. É só me chamar.
E ele some, andando para fora do prédio com seu terno cinza e a maleta escura.
Eu voltei a atenção para o papel no meu bolso. Junto de um número, havia o endereço e um nome: Ben Urich. Talvez fosse quem eu deveria procurar.
Eu fiz questão de salvar o número no meu celular e guardar o papel na minha estante, recheada de livros fornecidos pela SHIELD que eu provavelmente nunca leria. Mas eu tinha que ver alguém naquele momento. Uma antiga conhecida que tinha interesse em uma sessão do meu trabalho exposto na sua galeria.
E considerando que eu estava cinco minutos atrasada, Vanessa provavelmente me mataria.
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