VII ➵ Língua Afiada
Dancing with the Devil | Hyunlix
Duas semanas
HAVIA SE passado duas semanas desde o que aconteceu depois que Félix acordou daquele desmaio ao descobrir que, tecnicamente, ele quem causou a morte de seu primo.
Para começar, ficou em observação por um dia, devido a falta de alimentação e mau aspecto. Dormiu profundamente e comeu bem antes de voltar para casa. Logo, a notícia do funeral de Gyumin chegou aos seus ouvidos, e só de ouvir isso o fez desmaiar... de novo.
Havia se tornado em um trauma? Não sabia exatamente, mas supôs que sim devido às imagens que se passavam em sua mente no momento em que alguém mencionava o nome de seu parente falecido, e a maneira como o mesmo morreu. Lembrava-se da palavra "Castrati" e começava a ter crises de ansiedade, um verdadeiro e insuportável pânico. Tão verdadeiro que pensou que pudesse morrer.
Por fim, foi quando lembrou que, segundos antes de cair na inconsciência no hospital, o Diabo não o havia amparado. Não sentiu a proteção em seus braços, não havia sentido nada, e internamente estava grato porque, naquele momento, foi a primeira vez que teve medo da mesma forma que todos tinham.
Medo de que ele fizesse algo consigo, mesmo sabendo que, naquele ponto, sua alma já estava sendo sugada.
Seungsu já havia voltado para casa. Depois de alguns dias, ficou sabendo da morte de seu sobrinho, e se trancou em seu quarto por mais de três dias. Normalmente ele ficava na sala, mas quando Félix chegava na mesma, ele ia para outro lugar, mesmo que fosse outro cômodo. Sequer o olhava mais, e rezava constantemente — ainda mais do que antes — e aquilo doía no garoto, já que esperava um pedido de desculpas por querer fazê-lo queimar a própria pele, por bater em sua mãe, tratar sua irmã mal...
Mas, obviamente, aquilo nunca aconteceria.
Mas o que mais doía em Félix de toda aquela situação não eram os desmaios, nem viver em constante ansiedade, ou carregar a culpa da morte de outra pessoa, de prejudicar seu próprio pai, e muito menos ao saber que ir para o inferno começou a ser algo inevitável...
... A verdadeira dor foi quando percebeu que, depois de acordar naquele dia no hospital, Hyunjin havia ido embora. Completamente. Não sentia mais o zumbido em seu ouvido esquerdo, não sentia o constante mal estar, sequer seu corpo continuava a adoecer. Ele até melhorou, não se parecia mais tanto com um cadáver.
A pesar de que, a princípio, teve medo de voltar a ver Hyunjin, mas definitivamente não se comparava à dor de tê-lo longe, de não sentir como este o envolvia em seus braços durante a noite ou acariciava seu rosto com uma genuína curiosidade. Era terrível, e o nó em sua garganta nunca diminuía, nem mesmo chorando alto nos braços de sua mãe, a qual não compreendia a tristeza do filho, acreditando que estava tudo bem.
Finalmente, depois de duas semanas, Félix voltou à escola. "A jornada onde Deus guia o seu caminho!" disseram, mas Deus não guiava nada que tivesse o nome "Lee Félix". O moreno tinha certeza disso.
Han Jisung continuava chateado por não ter ido na excursão, Félix estava com medo de ir por saber que quase todo o colégio iria, e isso significava que Kim Woojin e Song Jongsun também estariam lá. Aqueles jovens haviam transformado a vida de Jisung e Félix em um inferno, por não pertencerem fisicamente ao estereótipo de "homem". Jisung era um rebelde, uma causa perdida, mesmo sendo da mesma idade que Félix mas, por razões óbvias, não aparentava ser desse modo quando estavam no colégio. Por outro lado, o moreno não conseguiu mostrar sua personalidade para o mundo, embora quisesse.
Kim Woojin foi quem sempre seguiu Jongsun. O qual possuía um passado terrível, saindo de um orfanato e sendo adotado por uma família rica, apenas por ser o menino mais bonito. A fama subiu sua cabeça, ninguém sabia que ele era adotado, exceto os pais de Félix, os quais sempre se deram bem com os pais de Song. O moreno havia escutado o momento em que o Sr. e Sra. Song confessaram seu segredo aos Lee, mas nunca disse nada. Claro que ele nunca faria isso.
Supôs que teria uma viagem catastrófica. Pelo amor de Deus, ele tinha certeza, mas nada mais importava, ele não compreendia tanto as coisas como antes. Queria Hyunjin, era a única coisa que queria, a única coisa que desejava mas não poderia ter. Se sentia de certa forma traído e estranho por ter aqueles pensamentos. Mas ele era o diabo! Era óbvio que não deveria desejar aquele tipo de coisa!
O ônibus parecia estar esperando os alunos estudiosos finalizarem seus afazeres para embarcar. O professor de coral estava ao lado de sua porta, observando seu relógio, esperando que desse o minuto exato para poder partir para sua emocionante viagem. Félix pensou seriamente em fugir, passar o dia andando pela cidade, talvez pudesse comprar um sorvete e, logo, voltar para a escola quando estivesse na hora, mas sua mãe o mataria, então não hesitou ao entrar no ônibus.
Todos estavam sentados em seus respectivos lugares, exceto dois idiotas... que estavam incomodando o menino sentado à sua frente, que estava ao lado de outro jovem, ambos cobrindo suas cabeças para não serem golpeados pelos colegas. Félix implorou para poder correr pelo corredor, entre os assentos, e ele o fez. Não tinha a mínima ideia de como não havia sido notado. Se sentou atrás de todos, do lado de uma janela e ao lado de Christopher Bang, o qual estudava na universidade em frente a sua escola. O Bang estava lendo sua bíblia com muita atenção. Félix não entendia como ninguém havia sentado naquele lugar, já que, para ele, o melhor da viajem era poder desfrutar da paisagem que a mesma nos oferecia.
Uma vez que o garoto estava sentado, suspirou profundamente e recostou-se no assento, sentindo sua pele se arrepiar devido ao frio que fazia, mesmo estando mais agasalhado que de costume. Christopher, que sentiu o olhar do mais novo sobre si, parou de ler sua bíblia para se voltar ao colega que o faria companhia naquela viagem religiosa.
— Hey, Félix. — murmurou, sorrindo gentilmente.
Para falar a verdade, Christopher era um cara realmente legal. Um cara bom e bonito. Não se metia em confusões, e ninguém se atrevia a mexer com ele, devido ao seu porte; musculoso e um tanto sério... mas apenas com certas pessoas. Félix havia o conhecido quando teve que fazer uma peça de teatro onde Christopher era Moisés e ele... bom, vamos ignorar que ele era só uma ovelha e apenas pensar em que ele pelo menos estava na peça. Seu primeiro trabalho.
Desde então, cumprimentos começaram a ser dados até mesmo fora do colégio, e algumas vezes, até trocaram algumas palavras, mas nada mais que isso. Não era nem de perto uma amizade como a que Jisung e Félix estavam construindo.
— Chan. — o Lee cumprimentou de volta, notando o quão frio havia soado. Olhou para a bíblia com o canto de seu olho, franzindo um pouco a testa ao notar que a mesma, por dentro, não parecia realmente uma bíblia. — O que está lendo? — fingiu não saber.
— O que você acha? — Christopher riu, parecendo um tanto nervoso ao que voltou seu olhar para o livro em seu colo.
Félix o observou por alguns segundos, erguendo suas sobrancelhas enquanto lhe dava um pequeno sorriso tímido.
— Eu, definitivamente, nunca vi a palavra "vampiro" em uma bíblia antes. — comentou, direcionando seu olhar para frente, fingindo esquecer aquele assunto.
Christopher fechou a "bíblia" de maneira brusca, deixando-a sobre seu colo e apontando com seu dedo indicador em direção ao mais novo, o qual havia voltado a olhá-lo enquanto ria baixo.
— Se você não disser nada, eu posso te pagar... — tentou negociar.
Félix decidiu que continuaria com aquela negociação, parecendo pensativo antes de se acomodar em seu assento.
— Não direi nada, com uma condição. — ambos se entreolharam enquanto Félix, sem tirar os olhos do garoto à sua frente, acenava na direção de Woojin e Jongsun. — Está vendo aqueles caras?
Enquanto Christopher olhava para frente, encontrando os dois idiotas, o ônibus deu partida, e todos exclamaram com emoção antes que o motorista acelerasse lentamente pela rua. O professor interrompeu a conversa de Christopher e Félix para dizer a todos para ficarem em seus lugares.
— Aqueles idiotas? — murmurou o mais velho depois de alguns segundos.
— Eles me incomodam, e muito. E bem... você é grande, Chan. — por que estava o elogiando? — É muito... musculoso. — continuou, um pouco mais duvidoso e tentando não rir quando Christopher abaixou seu olhar para seus próprios bíceps, admirando-os enquanto franzia um pouco a testa. — Pode me proteger? — estava um tanto corado, e não apenas por tê-lo elogiado tanto, mas também porque nunca havia pedido proteção a alguém.
Apenas de Hyunjin, mas este não era exatamente uma pessoa.
O castanho ao seu lado o olhou de cima a baixo por breves segundos, assentindo lentamente, como se estivesse concordando com seus próprios pensamentos.
— Você mudou. — confirmou. As sobrancelhas de Félix se ergueram, surpreso, mas não totalmente. — Você parece confiante, e profissional. Quero dizer, sempre soube que era muito inteligente, observador, mas você era tão tímido e agora você está tão... ousado.
Alguém estava sendo incrivelmente direto!
O desconforto de Félix aumentou, fazendo com que se acomodasse novamente em seu assento, levando seu olhar novamente para frente enquanto sua insegurança voltava de maneira repentina.
— Eu não queria... bem, me desculpe. — engoliu em seco com força para tentar aliviar o nó em sua garganta, mas sentia que não estava funcionando. Hyunjin se foi, e ele se comportado como um garoto idiota. Ousado. Apenas para conseguir a proteção de alguém. Estava realmente triste. — Me desculpe, eu não tenho direito de... você sabe. Não direi nada sobre o livro, não se preocupe. — levou seu olhar para a janela, observando a estrada em que se encontravam. — Acho que todos nós fazemos coisas ruins às vezes.
— Acha que ler isso é algo ruim? — sorriu de lado diante a pergunta de seu colega. — Deveria experimentar, é realmente bom.
Félix não estava se referindo à leitura, nem a Christopher. Estava se referindo ao seu pedido, e as coisas que havia dito anteriormente.
— Não acho, por isso que não vou te entregar. Não está fazendo nada de errado.
Você irá para o céu, e eu não. Mas com boas razões e... provavelmente porque eu mereço.
— Você é uma boa pessoa Chan.
Christopher parecia pensativo, com seu olhar fixo no perfil de seu colega de viagem antes de suspirar, voltando a olhar sua suposta bíblia, retomando a leitura. Félix, entretanto, espiou a janela à sua direita, esperando presenciar algo anormal entre as árvores na estrada, algo que indicasse que Hyunjin não tinha — novamente — ido embora, que se importava com seu bem-estar naquele grande e cruel universo.
Não tinha a menor ideia de que momento o Diabo levaria sua alma. Queria saber, queria entender e a intriga estava o consumindo por dentro, muito mais rápido do que a ansiedade.
Suspirou profundamente antes de encostar sua têmpora no vidro da janela, fechando seus olhos e ignorando aquela bela paisagem junto de um corvo voando acima do ônibus.
⸸⸸
Finalmente, o condutor parou o automóvel assim que adentraram em uma mata, em uma estrada de terra, estacionando o ônibus em uma distância relativamente perto da estrada. Claro que não queriam se perder, deveriam ter muito cuidado, pois a responsabilidade era dele, e do professor Park.
Christopher acordou Félix, o qual se encontrava roncando levemente, com seu polegar escorregando por entre seus lábios. Quando seus olhos se abriram, olhou em volta mas permaneceu com seu olhar fixo no de Christopher, o qual sorria de uma maneira estranha.
— … O que foi?
— Estava chupando o dedo. — o mais velho mencionou, tentando não rir enquanto se levantava, arrumando as alças de sua mochila sobre seu ombro.
— Não estava não? — negou o moreno, duvidoso, em uma tentativa de deboche, sentindo as maçãs de seu rosto queimarem enquanto se espreguiçava. — Por que eu faria isso? Eu não faço isso. — se defendeu rapidamente, levantando enquanto inclinava sua cabeça para um determinado lado, esticando seu pescoço.
Christopher revirou seus olhos, dando seu máximo para que sua risada não fosse ouvida pelo moreno.
— Claro que não...
Félix saiu apressado, passando por outros alunos, não querendo conversar com o universitário novamente. Ele não apenas foi descarado ao tentar suborná-lo, mas também deixou que Christopher o visse dormir da forma mais vergonhosa e infantil possível. Seus olhos se arregalaram ao perceber que, provavelmente, Hyunjin também poderia ter presenciado aquilo. Que vergonha!
O menor desceu dois degraus do ônibus, erguendo seu rosto para contemplar a linda paisagem à frente, mas um forte empurrão em suas costas o fez tropeçar para frente, ofegando de dor quando seu rosto bateu no chão, manchando-o de terra, não sentindo seu nariz por breves segundos, devido ao baque forte.
A risada de seus colegas se fez presente enquanto duas mãos o levantava por trás, pegando-o por debaixo de suas axilas até que estivesse em pé novamente. Se ajeitou, dolorido e um tanto tonto enquanto se virava para Christopher, o qual havia sido o único que manteve uma expressão séria. O único que o ajudou.
— Obrigado. — murmurou Félix, envergonhado enquanto acariciava seu próprio nariz com gentileza.
O professor Park, o qual não havia visto o que aconteceu — e sequer perguntou — silenciou seus alunos, colocando seu dedo indicador frente à seus lábios ao que, com a mão livre, tirava um papel de seu bolso e o colocava em frente ao seu rosto.
— "Amados, amém uns aos outros, porque o amor vem de Deus. Todo aquele que ama, nasceu de Deus e conhece a Deus. João 4:17" — uma vez que finalizou sua leitura, olhou para todos os seus alunos com um sorriso amigável, como se tudo fosse extremamente simples. — Nós os trouxemos aqui porque desejamos que se amem mutuamente, que todos possam contar uns com os outros. O conforto, o respeito e, principalmente, o amor, agrada o senhor. Ainda não é tarde, nosso propósito é tentar alcançar a verdadeira felicidade. — finalmente, deu uma pausa para poder respirar, olhando em volta. — Bem, vamos procurar um lugar próximo em que podemos montar uma pequena fogueira e arrumar alguns troncos para nos sentarmos e podermos conversar. Sigam-me.
Todos começaram a caminhar, seguindo o adulto enquanto admiravam a beleza da natureza. Félix sacudiu a terra em sua camiseta e shorts, ouvindo Woojin e Jongsun atrás de si. Christopher, que estava ao seu lado, se manteve calado, com seu olhar em um ponto fixo da enorme floresta, parecendo pensativo enquanto segurava melhor sua "bíblia" com seu braço esquerdo. As risadas dos valentões não pararam, começando a se tornar mais altas do que o normal, embora quase todos os alunos o fizessem.
— Sim, ele morreu em um hospital. — mencionou Woojin, sem contexto aparente. Félix começou a sentir enjoo, tontura, mas continuou sua caminhada, tentando não tropeçar em seus próprios pés diante da súbita descarga de adrenalina. — Ele sangrou pra caramba. Eu acho que... não teve bolas o suficiente para seguir com a própria vida. — disse entre risadas, enquanto Jongsun o acompanhava com suas gargalhadas altas.
Claramente, falando sobre Gyumin.
Sentiu uma mão tocar seu braço quando começou a se inclinar para o lado, preparando-se para cair no chão, mas tentando normalizar, novamente, sua respiração. Sentia-se como se estivesse em um carrossel sem freios, com seu coração igualado ao ritmo do mesmo: rápido e descuidado.
Hyunjin, eu preciso de você.
— Sinto muito por seu primo. — murmurou o universitário. Félix assentiu rapidamente, sem deixar de observar à sua volta. — Vou cuidar de você.
O garoto dirigiu seu olhar para o castanho, o qual o olhou de soslaio, dando-lhe um amável sorriso, sem tempo de poder responder algo, ao que o professor Park parou em um local um tanto deserto de árvores. Era perfeito para viver.
— Aqui! — exclamou o adulto, emocionado. — Aqui é perfeito. Ajude-me com isso, por favor.
— Você realmente vai? — perguntou Félix, dirigindo-se a Christopher, o qual assentiu rapidamente. — Não é por causa do que eu disse sobre sua... bíblia, certo? Eu não direi nada, não se sinta obrigado.
— Não estou sendo obrigado. Simplesmente, acredito que não deveria ter que lidar com este tipo de porcaria, pelo menos, não hoje.
O moreno o agradeceu baixo, feliz por poder contar com alguém dentro deste miserável mundo em que se encontrava. Se ao menos Jisung estivesse ali, mesmo com a inconveniência que receberiam, poderiam dar risadas altas por qualquer pequeno detalhe naquele lugar. Seu amigo era muito divertido e, provavelmente, Christopher e ele se daria bem.
— Christopher Baaaang! — chamou o professor, e o nomeado aproximou, entregando sua bíblia à Félix para que a mesma fosse segurada. Este que o fez imediatamente, apertando-a contra seu peito. — Precisamos de seus músculos, senhor Bang.
— Com prazer. — Christopher riu envergonhado.
— Por que quis vir? — a voz de Jongsun se fez audível ao lado de Félix, o qual se sobressaltou em seu lugar. — Você é o esquisito daqui.
Woojin fingiu passar casualmente ao lado do moreno, batendo com força no ombro direito deste, fazendo com que o livro em suas mãos caísse no chão. Se inclinou imediatamente, agarrando-o e sacudindo a sujeira que havia no mesmo antes de, novamente, ser empurrado para o chão, perto de uma poça de lama de um dia chuvoso, manchando sua camisa branca. Agora era um desastre completo.
Christopher deixou um pesado tronco ir ao chão, e se dirigiu com rapidez até onde o Lee se encontrava, ajudando-o — novamente — a se levantar.
— Está tudo bem? — Félix assentiu rapidamente, passando suas mãos rapidamente por sua roupa, mesmo que fosse inútil. O universitário observou os outros dois garotos, sorrindo com uma gentileza falsa. — Vocês tem algum problema? — perguntou secamente, dando um passo à frente. — Estão entediados?
— N-não.
— Bom, eu estou. E sabe o que eu faço quando isso acontece? — se inclinou para Woojin, o qual se contorcia de maneira nervosa em seu lugar. — Eu bato em idiotas como vocês.
Park observou seus quatro alunos, deixando suas coisas pela metade ao notar a vestimenta do Lee, caminhando em sua direção.
Jongsun riu altamente, rodeando os ombros de seu amigo com um braço enquanto olhava para Christopher.
— Acha algo engraçado?
— Você não me dá medo, Christopher Bang. Sabe muito bem que se nós fizer algo, pode sair muito mais prejudicado.
Christopher também riu em deboche, dando outro passo à frente mas sendo detido pela gentil mão de Félix rodeando seu pulso.
— Querem que eu mostre o quão pouco eu me importo?
— Garotos? — o professor de canto se intrometeu imediatamente. — O que está acontecendo aqui? — perguntou com a testa franzida.
Christopher suspirou, girando em seus calcanhares enquanto levava Félix para longe de seus companheiros, ouvindo os murmúrios destes. Resolveram ignorar tudo aquilo, e apenas focar em ter um bom dia juntos, mesmo que Félix tivesse certeza de que não seria assim.
⸸⸸
— Cordeiro de Deus! — aplausos. — Cordeiro de Deus! — mais aplausos em uníssono. — Que tirais o pecado do mundo! Tende piedade de nós, tende piedade de nós!
Félix não mentiria, seria cuidadoso, mas sincero; as canções da igreja o deprimiam ainda mais, ainda sabendo que não vomitaria ao ouvi-los nomear o "pai do céu". Suspirou profundamente, aplaudindo com má vontade pela décima vez enquanto olhava a grama em sua frente, ignorando todos seus companheiros cantando terrivelmente, exceto por Christopher, que se encontrava ao seu lado, cantando lindamente.
Hyunjin?
Pensou. O diabo poderia ouvi-lo, mesmo em sua mente?
Pode me ouvir? Sinto muito se fiz algo que te incomodou, prometo não... desculpe-me. Por favor, volte.
Alguns pequenos galhos golpearam seu rosto, fazendo-o passar sua mão direita sobre sua bochecha para aliviar a ardência. Sabia que estavam jogando em si mas, tanto ele quanto Christopher não podiam fazer nada nesta situação.
Precisava estar sozinho.
Uma vez que a canção acabou, o garoto se levantou.
— Professor, posso ir... procurar um banheiro? — recebeu um aceno de cabeça e um sorriso gentil.
— Nós também queremos ir. — Jongsun se levantou imediatamente, assim como Woojin.
— Mh... está bem. Mas não demorem, tudo bem?
— Professor, eu também quero ir. — Christopher se levantou, sequer esperando uma confirmação.
— Christopher, melhor você ir com outro grupo quando eles voltarem. — Park olhou para todos os seus alunos. — A partir de agora, quando precisarem fazer suas necessidades... — parou de falar ao receber risadas, revirando seus olhos. — ... Certo, quando precisarem ir ao banheiro, irão em grupos de três, e deixem algo pelo caminho para ajudá-los a não se perder.
Félix assentiu rapidamente antes de começar a entrar na floresta, caminhando de maneira veloz, suspirando ao ouvir passos apressados atrás de si. Seria este um bom momento para correr e nunca mais voltar? Provavelmente não. Parou de andar no instante em que recebeu um forte empurrão por trás, tentando fincar seus sapatos no chão, sem sucesso. Seus olhos se fecharam com força diante do golpe que recebeu em sua bochecha, tentando se levantar, mas a mão de Jongsun em sua nuca o impedia.
— Que merda você pensa que é? O protegido de Christopher Bang? Idiota. — Félix acreditava que, em partes, ele tinha razão. Desde a chegada de Hyunjin, havia se acostumado a não lidar com qualquer tipo de problema, apoiando-se nos mais fortes e culpando a si mesmo, se perguntando o que havia feito de errado. — Quem é ele? Seu namorado? Claro que é, viadinho nojento de merda.
— Faça-o engolir terra, Jongsun. — Woojin encorajou seu amigo, parecendo animado.
Jongsun tomou os fios do garoto em um punho, enterrando seu rosto na terra por longos segundos enquanto Lee se debatia, desesperado para poder respirar normalmente. Inesperadamente, foi liberado do aperto, levantando seu rosto e buscando por ar, tossindo enquanto observava um pouco de terra cair de seus cílios.
— Por que não se mata logo, bichinha? — murmurou Jongsun, deixando a posição agachada e caminhando em direção ao amigo, o qual sorria com orgulho, como se fosse a coisa mais preciosa que possuía. — Você me dá pena.
Isso foi tudo.
Respirou com dificuldade, deitado de costas e apoiando-se em seus cotovelos para poder olhar seus dois colegas, os quais conversavam entre si como se nada tivesse acontecido, em um ritmo lento.
— Como se você não desse pena. Lixo adotado. — aumentou sua voz, engolindo o sabor amargo em sua boca.
Era a primeira vez que sentia aquele tipo de raiva sozinho, por estar insultando alguém intencionalmente e, caramba, se sentia incrível, mesmo que estivesse em total desacordo com o insulto.
Internamente, agradeceu sua língua afiada.
Ambos os garotos pararam em seus lugares ao que Woojin se afastou do amigo, voltando a olhar para Félix com surpresa. Com horror, Félix se pôs de pé, mesmo que todos seu corpo estivesse doendo, quando o olhar de Jongsun pousou sobre o seu. Não estava arrependido, mas estava assustado. Sabia que havia passado dos limites, que o espancariam até a morte mas, quem ligava?
Honestamente, qual era o propósito de tudo aquilo? Minutos atrás, haviam o recomendado cometer suicídio. Agora decidiram obedecer?
Uma risada incrédula, grave e muito falsa saiu dos lábios de Jongsun.
— Por Deus... — deu um passo para frente. — Você está morto, filho da puta.
Félix não hesitou sequer um segundo antes de se virar e começar a correr, entrando nas profundezas da floresta enquanto ouvia seus colegas seguindo-o. Woojin gritou o nome de seu amigo, avisando-o, querendo detê-lo. Provocar era muito diferente de partir a cabeça do garoto contra uma pedra ou algo assim. Sabia que seu amigo iria ultrapassar os limites.
O moreno começou a hiperventilar, correndo rapidamente, tropeçando em alguns galhos no chão, mas voltando a se levantar. Não iria permitir que o pegassem, porque se fosse para morrer por sua própria estupidez, seria apenas isso. Não pelas mãos daqueles caras.
Olhou para trás, percebendo que Jongsun estava alguns passos mais longe, mas mantendo seu olhar fixo, disposto a pegá-lo. Foi quando seu olhar se voltou para frente que sua respiração parou abruptamente, notando um lago médio e sujo que separava a mata. Claramente, não poderia se jogar ali, sequer sabia nadar. Concluiu seus pensamentos ao perceber que morreria naquele momento, mas preferia morrer afogado do que ser golpeado por seus colegas.
Soluçou secamente. Era assim que Hyunjin levaria sua alma? Ele havia causado aquilo? Talvez o arcanjo que decidisse o destino daqueles que o invocavam, mas isso não era um tanto injusto? Porque ele só...
... Ele só queria se sentir amado.
— Hyunjin! — exclamou em completo pânico antes de, sem sequer pensar, saltar assim que estava a centímetros do lago, se afundando lentamente no mesmo.
Fechou seus olhos com força, ouvindo o barulho da água e deixava seu corpo imóvel enquanto descia cada vez mais para o fundo. Um par de bolhas saíram de seu nariz, o moreno sequer tentou nadar, devido a extrema dor que estava sentindo em seu corpo, e a calma debaixo d'água — mesmo que estivesse um frio congelante — o daria uma morte um tanto tranquila.
Já havia experimentado se afogar antes, em seu banho, com o peso do arcanjo sobre o seu, foi terrível.
Mas pelo menos, desta vez, não acordaria novamente.
Mais bolhas escaparam bruscamente de seus lábios quando um forte braço rodeou sua cintura, prendendo-o em um torso rígido. E foi aí...
... Que o mal estar se fez presente.
Engasgou sozinho em uma desesperada respiração uma vez que seu rosto estava fora d'água, tossindo um pouco enquanto afastava os fios molhados de sua frente. Não havia entrado água em seus pulmões,
Mas passar por um ataque de hiperventilação e simplesmente parar de respirar logo em seguida o deixou exausto. Seu ouvido esquerdo voltou a emitir um zumbido, sentia como se estivesse congelando, mas quando seus olhos se abriram, ele entendeu.
O Diabo estava lindo, como sempre, com seu cabelo escuro molhado, penteado para trás, e seus olhos da mesma cor que sangue, olhando-o fixamente. Sua pele estava quente, mas seu olhar era frio. Félix sabia o que iria acontecer, então abraçou Hyunjin pelo pescoço firmemente, ocultando seu rosto no ombro do maior e fechando seus olhos com força.
Estava com tanta saudade que sequer conseguia dizer algo.
— Jongsun! Pare-...! — ambos os garotos pararam quando chegaram à beira do lago, observando seu colega de classe abraçado com um ser desconhecido, o qual dava medo. Woojin olhou em volta, franzindo a testa antes de voltar seu olhar para o arcanjo. — Quem diabos é você?
Tudo aconteceu extremamente rápido.
O mesmo corvo que havia vigiado Félix durante toda a viagem reapareceu, posicionando-se frente à cara de Woojin e começando a atacá-lo. Kim gritou, implorando por ajuda enquanto uma grande quantidade de sangue escorria por suas bochechas e seu rosto se separava de seus próprios olhos. O corpo caiu no chão, e o corvo se moveu para ficar em cima de uma pedra, mastigando seu novo almoço.
Jongsun presenciou tudo aquilo com seus olhos arregalados, seu amigo de longa data, imóvel, morto no chão. Gritou, horrorizado enquanto levava suas mãos até o próprio rosto, sem conseguir acreditar no que havia acontecido. O som daquela coisa mastigando os escuros olhos de Woojin o fez começar a correr pela mata, fugindo de volta para o acampamento. Talvez fosse a falta de ar, o pânico em seu peito ou devido a corrida que havia tido, mas sua cabeça doía terrivelmente forte. Uma dor anormal.
Finalmente, conseguiu chegar onde todos estavam reunidos. O professor Park silenciou seus alunos ao notar o rosto do garoto, pálido como um guardanapo, caminhando em passos lentos em direção a um dos troncos soltos e sentando-se com cuidado.
— Jongsun? O que aconteceu? — perguntou. Todos olhavam de maneira estranha o garoto, o qual estava sentado em cima do tronco, entre mais dois alunos.
Todos permaneceram em silêncio por alguns segundos enquanto a respiração de Jongsun cessou. Seu rosto foi ficando vermelho, pouco a pouco, se tornando literalmente violeta enquanto as veias do mesmo começaram a saltar, Park aproximou-se de seu aluno, querendo ajudá-lo mas, de maneira brusca, a cabeça do garoto explodiu em mil pedaços. O sangue e a carne humana voaram, sujando os demais, que gritavam e se afastavam daquele lugar.
O corpo de Jongsun caiu no chão, aos pés do professor de canto, o qual estava coberto de sangue, imóvel, sem saber exatamente o que fazer.
⸸⸸
Hyunjin levantou Félix pelas coxas enquanto o garoto utilizava a pouca força que restava para tentar sair do lago. Uma vez fora, deitou-se no chão, respirando de maneira rápida e profunda enquanto abria seus olhos lentamente. O céu estava azul, ensolarado... e muito bonito para um dia com tanta tragédia. Se sentou lentamente, tonto, e olhando de soslaio o Diabo sair da água com agilidade, pondo-se de pé e jogando seu cabelo para trás. Estava prestes a se inclinar para ajudar o garoto mas, por puro reflexo, Félix recuou pelo chão, soluçando secamente, mesmo que não houvesse lágrimas para serem derramadas.
— H-hyunjin... — inalou o ar com força diante a dor em seu peito. — Onde estava? — perguntou fracamente, olhando em sua volta e arregalando seus olhos quando notou o cadáver de Woojin a alguns centímetros de si. Um garoto idiota, imaturo, que havia recebido como castigo uma das piores mortes, apenas por não saber com quem estava de metendo. — Morto. — foi a única coisa que conseguiu dizer.
Hyunjin possuía olhos mais abertos que o normal, mas sem tirá-los de seu menino favorito.
— Ele mereceu. — disse.
Félix iria enlouquecer. Realmente iria.
— D-deus... — passou as mãos por seu rosto antes de bagunçar seus fios molhados, respirando com dificuldade. — I-isso não está acontecendo, certo? N-não pode estar acontecendo. — negou rapidamente, sentindo-se ainda mais tonto. — Eu deveria estar morto, eu não... o que está acontecendo? — o corvo, que anteriormente comia os olhos de Woojin, se posicionou sobre o cadáver, preparando-se para continuar seu almoço. — Deus...
O Diabo se agachou frente ao humano, pegando suas bochechas frias com cuidado.
— Escute-me. — murmurou mas, apesar da proximidade, ou do toque, Félix não tirou seu olhar de pânico do corvo. — Félix, você precisa me ouvir. — repetiu, e este assentiu lentamente, fechando seus olhos, já não podia olhá-lo fixamente. — Juro que vou explicar porque fui embora. Te direi a verdade.
— C-como sei que não está mentindo? — todo seu corpo tremeu, um tanto perturbado mas, ainda assim, tentando regularizar sua respiração, falhando repetidamente. — De qualquer forma, i-isso importa agora?
O garoto sentiu a testa de Hyunjin encostar na sua, e suas respirações se misturaram. Aquilo relaxou um pouco seus músculos, e as mãos cheias de terra não puderem evitar de se agarrar desesperadamente à camisa preta do Diabo.
— Nunca mentiria para o meu menino favorito. — simplesmente disse, acariciando o nariz do menor, fechando seus olhos e respirando profundamente. Gravaria seu aroma em sua memória, em seus sentidos, e o conservaria para sempre.
O arcanjo começou a dizer em uma língua incompreensível para simples humanos como Félix, que começou a se sentir um tanto sonolento, relaxando enquanto se aconchegava ainda mais contra o corpo quente de Hyunjin, passando as mãos pela camisa do mesmo. Sentiu carícias em suas costas frias e encharcadas, eram suaves, lentas, não tão desajeitadas como a primeira vez. Seus nervos diminuíram instantaneamente, apenas sentindo-se frio e pesado.
— Não enlouqueça. — Félix engoliu em seco com o aviso do Diabo, sentindo ambas as mãos repletas de anéis embalando seu rosto. — Também matei o outro ser inferior, e preciso que você faça o que eu disser, tudo bem? Não posso deixar que saia prejudicado. — Hyunjin recebeu um aceno rápido. — Você tem que voltar, dizer que eles pegaram outro caminho e que você caiu no lago. Isso foi tudo que aconteceu.
Félix exalou trêmulo, sem parar de lembrar da morte de Woojin. O que aconteceria quando chegasse ao acampamento, junto aos outros? Manteria sua sanidade?
— N-não sei se consigo.
Hyunjin respirou com força, parecendo menos neutro, e mais desesperado.
— Você tem que fazer. — murmurou em um tom suave. — A partir de agora, Félix.... terá que adicionar isso à sua lista de coisas que você finge que não aconteceram. — mesmo que pudesse soar como algo realmente difícil de se dizer, era a realidade, e o tom do arcanjo era suficientemente agradável, igual as carícias em suas bochechas. — Pode ir, eu vou cuidar disso.
Félix abriu seus olhos lentamente, mirando-os para frente, percebendo o Diabo se afastar alguns passos de si. Se levantou de maneira lenta, cambaleando um pouco antes de se virar e caminhar lentamente, sem olhar para trás. Manteria tudo sob controle e, eventualmente, esqueceria de tudo aquilo.
Porque é isso que um assassino faz, certo?
Uma vez no acampamento, sequer precisou fingir surpresa quando viu todo aquele sangue, um cadáver coberto por um pano branco no chão e a polícia rondando o local. Havia alunos subindo de volta para o ônibus em fila, e outros sentados na parte de trás de uma ambulância, sendo atendidos. Félix estava prestes a começar a caminhar rapidamente em direção à fila do ônibus, mas aquilo seria extremamente suspeito, então decidiu reunir toda a sua valentia e caminhar até seu professor de canto. O homem parecia pálido, com suas mãos tremendo enquanto tentava manter-se em uma boa postura.
— Senhor Park? — chamou o adulto, o qual se virou em sua direção. — O que aconteceu? — fingiu não estar ciente da situação.
O professor de canto o olhou de cima a baixo, notando como o aluno estava molhado e sujo.
— Meu Deus, garoto! — exclamou. — Onde se meteu? Em uma caverna?
— Eu tentei encontrar um banheiro, mas acabei caindo no lago. — respondeu com rapidez, franzindo a testa enquanto observava, novamente, ao seu redor. — O que aconteceu? A-alguém... se machucou?
Um profundo suspiro saiu dos lábios do adulto, o qual observou seu aluno com pena. Diante de seus olhos — e de qualquer outra pessoa — era muito claro que aquele garotinho não faria mal a sequer uma mosca.
— Não se preocupe com isso. Suba no ônibus, Félix. — deu um tapa gentil em suas costas. — Você pelo menos conseguiu...?
— Hm? — os dois se olharam fixamente por alguns segundos. — Oh, sim, sim. Eu fiz xixi.
— ... Incrível.
Aliviado por ter conseguido finalizar aquela incômoda conversa, entrou no ônibus, percebendo seus colegas conversando entre si, ou alguns — simplesmente — olhavam para o próprio nada. Choravam, falavam alto, totalmente em pânico, ou se encontravam submergidos em suas próprias mentes. Félix foi para o fundo, com seu olhar para frente, ocupando o mesmo lugar o qual havia se sentado anteriormente, percebendo que Christopher estava ao seu lado, o qual parecia estar mais são do que qualquer outro ali.
— Félix, onde estava? — perguntou, preocupado. Estava suado, e tinha algumas manchas de sangue em sua camiseta. — O que aconteceu?
— Caí em um lado, longa história. — se moveu desconfortavelmente em seu lugar, olhando fixamente para os olhos castanhos de seu colega. — O que aconteceu por aqui?
Christopher suspirou, mudando seu olhar para frente.
— É melhor que não saiba, pode ferir a sua sensibilidade.
É porque você ainda não sabe tudo que eu fiz, Chan. Tudo que eu causei.
Assentiu lentamente em resposta antes de se apoiar sua testa na janela fria, tremendo devido a brisa de inverno e fechando seus olhos por puro cansaço enquanto esperava que tudo aquilo acabasse.
⸸⸸
Não foi uma surpresa quando sua mãe gritou enquanto o abraçava contra seu peito quando foi buscá-lo na escola. Os pais dos alunos estavam cientes do que havia acontecido e, apesar de alguns alunos — incluindo Félix — serem maiores de idade, não permitiram que voltassem sozinhos devido a situação que havia presenciado. O garoto não se arrependia de ter Minah ali, beijando sua testa e tranquilizando-o com suaves carícias em suas costas.
— Está bem, bebê? — uma vez que os dois estavam dentro do carro, a mulher prestou muito mais atenção no estado em que seu filho se encontrava. — Tem sangue aqui!
— Estou bem, mamãe. Eu apenas caí.
— Está encharcado! — a mulher tirou a própria jaqueta e, mesmo diante da negação de Félix, sua mãe não hesitou em passá-la por seus ombros, esfregando seu braço.
— Eu caí em um lago... enquanto tentava fazer xixi. — disse, corando logo em seguida.
Ótimo, agora todos iriam acreditar que Félix tentou urinar em um lago.
— Oh, céus. — Minah o abraçou, olhando-o com puro amor. — Nós vamos para casa. Te farei uma comida, e você poderá fazer o que quiser, hm? — o moreno assentiu rapidamente, mais relaxado mas, ainda assim, fingindo. — Como saiu do lago? Não sabe nadar.
— Eu fiz o que pude. — ao ouvir um suspiro de sua mãe, Félix pegou sua mão, dando um suave aperto. — Estou bem, mamãe. Não precisa se preocupar comigo. — murmurou.
Minah assentiu, também sorrindo antes de se afastar da mão do filho e colocar seu cinto de segurança. Seu filho a copiou imediatamente, olhando para frente enquanto tentava acalmar os acelerados batimentos de seu coração.
Sabia que, em outras situações, estaria chorando, já que não gostava de mentir, mas a leve carícia em seu braço, o fez sentir que não estava sozinho.
⸸⸸
Assim que abriu a porta principal de sua casa, foi recebido com um forte abraço de sua irmã mais velha, a qual lhe disse o quanto havia ficado preocupada ao saber o que tinha acontecido. Seungsu, que se encontrava tomando café na sala, pegou sua xícara, se levantou e subiu as escadas do primeiro andar, indo para seu quarto. Mesmo que não devesse, aquilo machucava Félix.
Caminhou para seu quarto, descendo as escadas do porão e fechando a porta atrás de si. Pegou seu pijama, algumas meias brancas e curtas, roupa íntima e, sem querer se olhar no espelho, foi rapidamente para o banho.
A água quente caindo sobre sua pele era reconfortante, e talvez fosse porque, finalmente, estava sozinho, mas não hesitou em começar a chorar com força, fazendo com suas lágrimas se fundissem com a água que caía sobre si. A única prova de que estava realmente chorando sem parar era seus olhos levemente inchados, e vermelhos ao redor, igual ao seu nariz. Se secou, se vestiu e voltou para seu quarto.
Sequer se assustou quando viu a figura escura de Hyunjin, em pé, ao lado de sua cama. Félix limpou sua garganta, sentando-se e cobrindo suas pernas com um cobertor. Mantendo o olhar em suas mãos, as quais estavam em seu colo, sem saber direito o que fazer.
Sabia que precisavam conversar.
— Não posso estar sempre com você.
Mas não sabia que iria doer tanto.
— Entendo. — sussurrou, assentindo lentamente e tentando compreender qualquer que fosse os motivos do Diabo. A propósito, estamos falando do próprio Diabo! Que provavelmente possui muitas outras ocupações do que abraçar um simples humano.
— Se eu estou por perto, você parece um cadáver. — a testa do menor se franziu, querendo mais que tudo olhar fixamente em seus olhos, mas sem poder, graças ao zumbido infernal em seu ouvido esquerdo. — Quando fico muito tempo com você, seu corpo se autodestrói, você perde peso, não consegue dormir direito, vomita... fica triste. — o Diabo olhou para a outra parte do quarto, como se se expressar fosse algo realmente difícil. — ... Não quero isso para você.
Félix piscou lentamente, assimilando aquelas palavras. Do que ele estava falando? Era simplesmente isso? Hyunjin estava o protegendo de si mesmo?
— Mh. — não sabia exatamente o que dizer. Mordeu seu lábio inferior por alguns segundos, pensando. — Mas, às vezes... — jogou seus fios para o lado, suspirando. — Bem, quando dormimos juntos você sempre me abraça.
— Quando você dormir, eu vou ir embora e deixarei um corvo te vigiando. — Hyunjin respondeu, caminhando lentamente até estar frente à Félix, ainda em pé. — Todas as vezes que dormi ao seu lado você teve insônia, pesadelos e paralisia do sono. — se inclinou um pouco, embalando o rosto do humano em suas mãos cheias de anéis de ouro. — E você estava com medo. Medo de mim.
— N-não era-...
— Eu sinto o que você sente. Já te disse isso. — o arcanjo interrompeu. Félix se perguntava se era capaz de sentir o quão apaixonado se encontrava porque, se fosse, seria muito vergonhoso. — Pude sentir o seu medo no hospital, e foi por minha culpa.
Ele estava certo.
Havia sentido pavor com a possibilidade de Hyunjin estar por perto no momento em que acordou no hospital, após a morte de Gyumin. Foi como sair de um sonho em que o Diabo fingia cuidado, carinho e beleza. Parecia uma epifania, onde percebia que aquele ser não tinha coração.
Provavelmente, ele realmente não possui, então, por que parecia tão sincero?
— Não foi intencionalmente. — quis se desculpar.
— Não tem que explicar. — murmurou Hyunjin.
— Sim, eu tenho. — se apressou em responder, levando suas mãos frias até os pulsos do Diabo para poder se afastar um pouco do arcanjo em sua frente. — Eu estava muito assustado por tudo que havia acontecido. A única pessoa que eu queria ter por perto era minha mãe, e mais ninguém, foi um momento... horrível. Cada vez que me lembro sinto que vou enlouquecer, mas eu não quero... quer dizer, eu nunca... — sentiu suas bochechas queimarem. — Não quero que se afaste de mim. — conseguiu confessar.
Houve um silêncio confortável, que durou apenas alguns segundos, e Hyunjin olhou fixamente para seu menino favorito antes de, inesperadamente, se aproximar mais. Félix inclinou seu corpo, apoiando-se na cama com seus cotovelos enquanto o arcanjo se sustentava apenas com suas mãos no colchão, ao lado da cabeça do humano. Seus lábios se tocaram, mas ninguém se moveu.
Félix não conseguia respirar, seus olhos estavam arregalados, e seu rosto da mesma cor de um tomate.
— Repita. — murmurou Hyunjin.
As mãos do garoto tremeram, esquecendo seu péssimo dia graças a felicidade subindo desde seu estômago até seu peito. Iria morrer de ansiedade, de amor e de vontade de ser beijado.
— Mh? — foi a única coisa que conseguiu murmurar, ainda tremendo.
— O que acabou de me pedir. — esclareceu o Diabo, abaixando seu olhar até os lábios de Lee. — Repita.
Os olhos de Félix se estreitaram diante às doces e íntimas carícias que Hyunjin lhe proporcionava em seu nariz, com o seu próprio. Não pôde evitar de levantar seu rosto um pouco mais, amando aqueles pequenos toques. Poderia se contentar com isso pelo resto de sua vida.
— O-o que eu pedi?
Hyunjin respirou fundo, fazendo com que alguns objetos no quarto tremessem. Estava prestes a responder mas, em vez disso, substituiu suas palavras por um grunhido, apertando repentinamente o corpo do menor. Félix abriu seus olhos, confuso, enquanto via o Diabo se afastar para um canto escuro de seu quarto.
— Está vindo alguém. — avisou.
Rapidamente, o garoto se ajeitou na cama, passando suas mãos por seu rosto enquanto ouvia suaves batidas em sua porta, logo, percebendo que a mesma foi aberta por Minah, a qual sorriu docemente.
— Bebê. — chamou seu filho, fechando a porta atrás de si e caminhando até a cama. Sentou-se na mesma, ao lado de seu filho, e Hyunjin observava tudo aquilo com atenção, sendo visível apenas para o garoto. — Como você está?
— Estou bem, e você?
— Mh, bem. — respondeu a adulta, assentindo lentamente. — Amorzinho, preciso te perguntar uma coisa.
— Certo...
— No colégio... você notou algo estranho em seus colegas? — Félix permaneceu imóvel por alguns segundos, olhando de canto para a silhueta do Diabo antes de negar lentamente, parecendo pouco convincente. — Tem certeza?
— Pareciam nervosos. — mentiu, ainda olhando para Hyunjin, o qual assentiu lentamente, aprovando o comentário de seu menino favorito. Félix deu de ombros, voltando seu olhar para sua mãe. — Mas eu não sei, eu estava apenas tentando... fazer xixi.
Minah não pôde evitar de rir, beliscando as bochechas de seu filho, o qual lhe deu um sorriso tímido.
— Tudo bem, homenzinho. Hora de dormir. E sabe de uma coisa? Vou ficar com você por alguns minutos. — Félix assentiu, concordando, deixando um espaço na cama para sua mãe, a qual se deitou atrás do garoto e o envolveu em seus braços. Hyunjin rosnou em aborrecimento diante àquela cena, já que era ele que queria poder abraçar o moreno depois da bela reconciliação que tiveram. Ao perceber aquilo, o humano não pôde evitar de soltar uma risada. — O que está acontecendo?
Voltou a rir, negando lentamente enquanto olhava fixamente para Hyunjin à distância, o qual possuía suas sobrancelhas erguidas.
— Não, nada. Me lembrei de uma piada engraçada. — mentiu.
— Oooooh. Conte-me. — pediu Minah, animada. Félix congelou em seu lugar, desmanchando rapidamente seu sorriso e arregalando seus olhos ao que o Diabo sorria de lado. Doce, doce vingança.
— U-uh, eh... ah... — pensou, mas não conhecia nenhuma piada. — Estou com sono, amanhã eu te conto. — bocejou exageradamente, fechando seus olhos e começando a roncar alto após alguns segundos, esperando que a mulher acreditasse.
O que obviamente não aconteceu, mas a mulher apenas sorriu e continuou fazendo companhia para seu filho até que, pouco a pouco, os roncos exagerados se tornaram realidade, e Minah saiu do quarto, mas não antes de deixar um beijo na testa do filho. O Diabo analisou aquela aquela demonstração de afeto, franzindo a testa em curiosidade. Não que estivesse pensando em fazer o mesmo, mas se surpreendeu com a naturalidade da mulher.
Aquilo nunca havia acontecido com ele.
Hyunjin se aproximou da cama, notando que Félix realmente havia adormecido. Suspirou antes de decidir ir embora para que seu menino favorito não tivesse nenhum tipo de pesadelo, pensando que o que não havia conseguido fazer hoje, devido a interrupção de Minah, ele faria no dia seguinte: o caos.
Literalmente, o caos, e tudo isso porque, finalmente, o Diabo faria algo que não prejudicaria ninguém além dele mesmo. Isso tudo significava se resignar aos olhos do de cima, uma besteira total, para falar a verdade.
Mas ele não estava suportando mais...
... Realmente precisa beijar aquele garoto.
E um pouco mais.
Sim, depois de muito tempo finalmente voltaremos as atualizações de DWTD, espero que gostem e que continuem acompanhando.
Por falar nisso, o que estão achando da obra até agora?
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