
020. THE BEATLES.
—— BYERS, SERÁ QUE DÁ PRA EXPLICAR QUE TIPO DE PISTAS A GENTE TÁ PROCURANDO MESMO? —— Steve perguntou, girando a lanterna em minha direção, a luz ofuscando meus olhos por um segundo.
—— Harrington, o mundo está cheio de coisas óbvias... mas que ninguém jamais observa —— respondi, de forma enigmática.
Steve franziu a testa, confuso.
—— Sherlock. Foi o Dustin quem me disse isso uma vez —— completei.
—— É... bem a cara dele —— murmurou Steve, voltando a vasculhar o quarto empoeirado com a lanterna.
O lugar era abafado, o cheiro de madeira velha e mofo impregnava o ar. Teias de aranha balançavam em cada canto, como se ninguém entrasse ali há anos.
—— Sei lá, procura qualquer coisa que pareça... sei lá... suspeita —— apontei para o canto onde caixas velhas estavam empilhadas de forma estranha.
—— Tipo a sua relação com o Eddie Munson —— Steve disparou, com aquele tom típico de provocação.
Revirei os olhos, soltando um suspiro irritado.
—— Uau, Steve. É impressionante como você consegue achar coisas onde não tem —— falei mais alto, cruzando os braços. —— Eu só levei comida pro Munson porque ele tava igual um maluco chamando pelo rádio.
—— E preferiu sair sozinha em vez de chamar alguém? —— Steve questionou, a preocupação camuflada em raiva.
—— Eu precisava de um tempo, ok? Pensar um pouco. As coisas estão saindo do controle, querendo ou não —— confessei, com a voz mais baixa.
—— Sim, mas sair por aí sozinha, sabendo que tem uma coisa querendo matar você, é pior ainda —— ele rebateu, firme.
—— Eu e o Eddie somos só amigos. Literalmente. E olha... acho que nem isso direito —— declarei, antes de sair do quarto e entrar no corredor.
O rangido do piso de madeira sob meus pés parecia ecoar mais do que o normal. A cada passo, sentia o peso da tensão entre mim e Steve.
Era como voltar aos velhos tempos, quando brigar parecia ser nossa única forma de comunicação.
—— Samantha...
A voz. Aquela maldita voz outra vez. Só ela. Nenhum som de relógio. Nenhuma batida.
Minhas costas gelaram, e meu corpo travou por um segundo. Mas antes que eu pudesse pensar, Steve surgiu do nada, se debatendo como um louco e batendo no próprio ombro.
—— Aranha! Aranha! —— gritou, pulando de um lado pro outro.
—— Calma! Não tem nada aí —— corri até ele, ajudando a sacudir o casaco.
—— Era uma viúva negra! —— ele exclamou, batendo a porta do quarto que tínhamos acabado de sair. —— Não vamos mais entrar ali, nem ferrando.
—— Espera... ela tava no seu cabelo. Tá morta agora —— falei, jogando o corpo da aranha no chão com uma expressão de nojo.
—— Se tiver uma aranha aí, você só vai encontrar depois que ela botar ovos e os bebês nascerem —— Robin surgiu no corredor com Nancy, rindo enquanto caminhava para outra sala.
—— Qual é o seu problema, hein? Robin, é sério! —— Steve revirou os olhos.
Enquanto ainda tirava os restos de teia do casaco dele, notei algo no bolso. Uma fita cassete. Puxei e li o título: Help! — The Beatles.
—— Tá andando com isso por aí? —— perguntei, arqueando uma sobrancelha.
—— Precaução, caso... ele pegue você —— Steve respondeu, pegando a fita de volta com um olhar sério. —— Eu não quero perder você. De novo.
—— Você não vai. Tenho certeza que os Beatles vão me salvar —— brinquei, tentando suavizar o momento com um sorriso leve.
—— Gente! A Max achou uma coisa! —— Lucas surgiu chamando todos com urgência.
Seguimos até uma mesa. O lustre acima dela piscava, emitindo um brilho estranho e pulsante.
—— Que nem as luzes de Natal... —— murmurei, encarando o lustre.
—— Luzes de Natal? —— Robin questionou.
—— Quando o Will foi pro Mundo Invertido... ele usou as luzes pra se comunicar com a nossa mãe —— expliquei.
—— O Vecna tá aqui —— Lucas disse. —— Só que do outro lado.
—— Será que ele tá tentando se comunicar? —— Robin perguntou. Nesse instante, as luzes pararam.
O silêncio caiu sobre a sala como uma névoa espessa.
—— Será que ele ouviu a gente? —— perguntei, engolindo seco.
—— Será que ele tá vendo a gente? —— Steve completou.
—— Coloca o fone —— Lucas disse para Max, que já encaixava os fones e iniciava a música.
—— Todo mundo apaga as luzes e se espalha! —— ordenou Nancy.
A escuridão engoliu a casa. O silêncio, agora cortado apenas pela respiração baixa de cada um, era sufocante. Puxei Steve comigo, sem dizer nada.
—— But now these days are gone, I'm not so self assured... Now I find I've changed my mind and opened up the doors... —— cantarolei, baixinho, apenas para mim.
—— Help me if you can, I'm feeling down... and I do appreciate you being 'round... —— Steve completou a música atrás de mim, sua voz um pouco trêmula.
Me virei para ele.
—— Se alguma coisa acontecer comigo... —— disse, me aproximando. —— Quero que saiba que eu nunca quis que a gente acabasse assim.
—— A gente pode discutir isso depois, ok? —— Steve respondeu, tentando manter o foco.
—— Não, Harrington. Eu tô falando sério agora. Eu amava você. Ainda...
—— Você decidiu isso sozinha, Sam. Você não quis tentar —— Steve cortou, a voz cheia de mágoa.
—— Eu tava com medo... medo de você encontrar alguém melhor, enquanto eu tava longe —— expliquei. —— A gente tava muito longe um do outro.
—— Nunca ia ter garota melhor que você, Samantha Byers —— ele sussurrou, se aproximando e tocando meu rosto com delicadeza. —— Teria dado certo. Mesmo com você fora de Hawkins. Eu só queria você aqui.
—— Eu só... tenho medo de deixar o Will. De acontecer alguma coisa com ele. De perder ele, como aconteceu com o Charlie —— murmurei.
—— O Charlie era uma criança de 10 anos. O Will tem 15! Ele não tá sozinho. Tá com o Jonathan, a El, o Mike... eu tenho certeza de que ele tá em segurança na Califórnia —— Steve respondeu.
—— GENTE! EU ACHEI! —— a voz de Robin soou de outro cômodo.
Corremos até lá, onde a lanterna de Steve iluminava algo em movimento.
—— Tá se mexendo! Tá andando!
Avançamos por um corredor escuro, cada passo afundando o chão rangente sob nossos pés.
—— Acho que perdi —— Steve murmurou.
—— Perdeu não —— disse Max, ao abrir uma porta. A luz suave revelou uma escada íngreme.
—— Ah, um sótão. Que surpresa —— comentei, subindo primeiro.
—— Gente... e se for uma armadilha? —— Dustin hesitou, lá embaixo.
—— Sobe logo, Henderson! —— gritei de cima.
—— Ok, pode deixar, papai —— resmungou ele, sarcástico.
Entramos no sótão. O ar ali era mais frio, pesado. Deu pra sentir. Nossas lanternas, todas ao mesmo tempo, apontaram para o teto. A lâmpada acesa parecia mais viva do que deveria.
—— Então... o que tá acontecendo? —— Steve perguntou, virando a cabeça para mim.
—— Samantha... —— a voz. De novo. Mais próxima.
—— Ele tá perto. Muito perto —— sussurrei.
E, como se o próprio ar tivesse explodido, a lâmpada estourou acima de nós, faíscas caíram em nossos ombros. As lanternas apagaram uma a uma, num círculo perfeito.
Instintivamente, cobrimos os rostos com os braços.
O Vecna estava perto.
Perto demais.
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