1 • Ser Olyvar e O Príncipe Adormecido
A princesa Cecylla Nymeros-Martell de Lançassolar era uma personagem de pouca ou nenhuma importância na história da maior parte da gente de Westeros. Na verdade, pouquíssima gente sequer saberia reconhecê-la se pusesse os olhos na segunda filha de Doran Martell.
Espírito livre que era, com dez-e-oito dias de seu nome ela raramente ia a Lançassolar, em vez disso preferindo morar em uma pequena mansão afastada da capital dornesa que fora presente de sua mãe. A propriedade era grande o suficiente para ter estábulos, três jardins de água, um gazebo, um coreto, um riacho a cruzando e uma casa de banhos, mas era pequena o bastante para ter muito pouca ou nenhuma importância estratégica e era perto o suficiente da costa para que a princesa pudesse ir a praia sempre que quisesse e longe o suficiente para que o cheiro de maresia não se impregnasse nas madeiras e tecidos.
A princesa fizera de sua casa um lugar para tudo aquilo que ela considerava bom e bonito, enchendo seus salões de música, suas estantes de livros e suas paredes de arte. Mulher crescida, mas não casada – e não tinha nenhum interesse em se casar ainda apesar de ter boas propostas – vivia sua vida de forma calma e livre e feliz.
Toda semana, sem falta e sempre no mesmo dia, ela e sua guarda – assim como sua dama de companhia Kaetryna Stone e sua protegida Maryon Flowers – cavalgavam até a praia para um piquenique no qual, também sem falta, Athlas Sand, seu capitão da guarda e filho bastardo de Arthur Dayne, faria tentativas fracassadas de flertar com a princesa.
Foi em um desses dias que ela os viu, estirados na praia e quase mortos estavam dois homens e uma forma peluda que se assemelhava a um cão enorme. Imediatamente Cylla compeliu sua égua a cavalgar mais rápido e desmontou ao lado dos homens desacordados e queimados pelo sol.
Um deles, com cabelos ruivos de Tully e roupas que – embora desgastadas – eram feitas sob medida, tinha uma ferida no peito tapada por uma bandagem muito mal feita ao redor de uma haste de flecha quebrada.
O outro tinha cabelos da mesma cor que a areia da praia, usava cota de malha e para olhos desatentos não teria nenhuma ferida evidente, mas Cylla era dornesa e sabia muito bem diagnosticar o efeito de uma picada de cobra quando o via, então puxou para cima a calça do rapaz – estava descalço e o oceano provavelmente havia levado suas botas há muito – e viu exatamente a picada de cobra que previra.
Ela estava para se mover para checar o cachorro, que de perto parecia muito mais um lobo, quando o de cabelos acobreados abriu os olhos por um instante, intenso azul Tully contra o verde-dourado dos olhos da princesa e ela soube. Não havia como aquele rapaz não ser um parente dos senhores de Riverrun, mas era jovem demais para ser Edmure Tully, o que significava que aquele só podia ser Robb Stark, o Rei do Norte.
A princesa suprimiu um riso nervoso.
Tão logo quanto ele havia aberto os olhos, os fechou novamente enquanto o lobo soltava um rosnar baixo que, em sua condição enfraquecida estava mais para um ganido.
Sabiamente, Cylla tirou seu cantil da sela e se aproximou devagar do lobo, mantendo a postura aberta e relaxada, para que o animal visse que ela não era uma ameaça.
– Alteza! – Athlas chamou preocupado, e apenas recebeu um curto e autoritário "shh!" como resposta.
– Ei… – ela chamou mansa se ajoelhando e virando a água do cantil próximo à boca do lobo enorme, que a olhou desconfiado por meio segundo antes de colocar a língua para fora e beber a água que ela derramara. – Está tudo bem, somos amigos. Prometo que vou ajudar seu mestre. Ele está seguro comigo.
E então ela se virou para sua guarda com um olhar decisivo.
– Carreguem estes homens em seus cavalos, e mandem um batedor de volta à mansão para avisar o meistre e para que vá imediatamente buscar o melhor meistre que Lançassolar puder me oferecer. E me ajudem a colocar o lobo no meu cavalo. Vamos voltar imediatamente. Kaetryna, volte com o batedor e mande as cozinhas prepararem o soro anti veneno para picada de cobra!
E assim que a ordem foi dada, todos que a acompanhavam se moveram o mais rápido possível para obedecer sua senhora, Maryon se aproximando para ver Athlas e outros dois homens carregando o lobo para a sela do cavalo de Cecylla. O capitão da guarda teria perdido a mão para uma dentada do animal – que não parecia nada contente com a ideia de ser carregado – se a princesa não tivesse entrado no meio e acalmado o canino, que parecia confiar nela.
No caminho de volta, puxando a égua que carregava o lobo pela rédea e compartilhando montaria com sua protegida de Highgarden, Cylla finalmente recebeu a pergunta que esperava.
– Mamãe… Quem são esses homens? – Maryon questionou.
– Ora, estes são o rei do Norte, Robb Stark, seu lobo gigante e provavelmente um de seus escudeiros ou aliados, não sei dizer quem. – respondeu a princesa como se fosse uma informação óbvia.
– Desculpe… Mas como você sabe, mamãe? – questionou a Flowers, uma menina de apenas cinco dias de seu nome de quem Cylla não era mãe biológica – e sim sua falecida prima Alya Sand –, mas fizera o favor de acolher para seu tio Oberyn e sua amiga correspondente Lady Olenna Tyrell, pois Maryon era filha bastarda de seu neto Willas. Alya fora a melhor amiga de infância da princesa, que após a morte precoce da primeira, se tornou muito ligada à pequena menina.
– Preste atenção neles, querida Maryon. Vê os cabelos acobreados do que tem o ferimento de flecha? Ele vem da família Tully de Riverrun, certamente, mas suas roupas são boas demais para ser um dos… Filhos de Brynden Tully, e é jovem demais para ser Edmure Tully. – Cylla apontou com um tom calmo de ensinamento, trocando um olhar breve com Athlas ao perceber que quase dissera "bastardos". – A única opção possível é que seja Robb Stark, que está sempre acompanhado de seu fiel lobo gigante em batalha.
Com essa fala, a princesa puxou sua égua para mais perto, deixando um carinho na pelagem cinzenta de Greywind, que achou forças em si para abanar o rabo em gratidão.
– O coitado deve estar morrendo de calor com esse tanto de pelos pesados. – Athlas comentou olhando o bicho.
– Ele é fofinho, mas está tão sujinho e fedido! – disse Maryon com um pequeno e adorável bico de compaixão. – Mas, mamãe, como você saberia sobre o escudeiro?
– Lembre-se do que eu sempre digo: se mantenha informada sobre as guerras que você não está lutando… – Athlas interrompeu, e deixou a frase no ar para que a menina completasse.
– Assim estará preparada quando elas chegarem em você. – a Flowers completou.
– Isso mesmo, minha querida. – Cylla sorriu orgulhosa. – Quando Robb Stark ainda era Lorde de Winterfell, e não Rei do Norte, ele fez um acordo com Walder Frey para que lhe desse homens e passagem para seu exército pelas Gêmeas. Ele levaria consigo três dos filhos de Lorde Frey para serem seus escudeiros e se casaria com uma menina Frey da escolha dele.
– Mas eu achei que você havia dito que o vovô ouviu que Robb Stark havia se casado com Jeyne Westerling! – Maryon franziu o nariz em confusão.
– E se casou sim, desonrando seu acordo com Lord Frey e assim causando a queda do Norte para as mãos dos Lannister como meu tio Oberyn, o seu avô, contou no corvo que nos mandou esta manhã. – e então o sorriso de Cecylla se tornou político, um que lembrava um pouco seu pai Doran Martell. Ela virou-se para olhar seu capitão da guarda. – Athlas, nós temos conosco a chave para mudar o curso de tudo e muito possivelmente vingar minha tia e meus primos.
– O que quer dizer com isso, milady? – interpôs Athlas curioso. Se ele fosse confessar, aquele sorriso de Cecylla em particular o assustava mais do que encantava.
– Sabemos que lady Catelyn Stark, o herdeiro dos Westerling e lady Jeyne Westerling foram assassinados no banquete do casamento de Edmure Tully. E Walder Frey diz que também matou Robb Stark e seu lobo gigante. – a Martell explicou. – Mas ainda assim, aqui estão eles, vivos. E nós vamos garantir que continuem assim.
Com isso, deu a conversa por encerrada, clicando a língua para acelerar o grupo.
No tempo em que chegaram à mansão – que secretamente Cecylla chamava de Casa da Paz –, um mensageiro já partira para Lançassolar com instruções específicas de Kaetryna de que devia falar com Oberyn, Ellaria, Quentyn ou Arianne, mas não com Doran.
Com vinte-e-um dias de seu nome, Kaetryna Stone estava no serviço de Cylla há cinco anos, tendo fugido do Vale e da fúria de Lysa Arryn ao descobrir que a "protegida" de seu marido era na verdade sua bastarda. Acabara em Dorne por acaso, e também por acaso estivera em Lançassolar no mesmo dia que a princesa.
Desde então, haviam se tornado melhores amigas e se conheciam muito bem, o jeito duro e decisivo de Katy balanceando a diplomacia suave e calma de Cylla.
Uma vez que o caso do escudeiro era não apenas mais comum como também menos complicado, Cecylla disse a seu meistre que desse atenção a Robb Stark e que ela cuidaria da picada de cobra, pois já havia tratado de muitas picadas de cobra antes.
Enquanto isso, ela mandou Maryon ir aos jardins com sua Septã recolher as folhas mais grossas que achasse de planta babosa para misturar a seiva com azeite, óleo de côco e mel e passar nas queimaduras dos rapazes.
Nem era lusco-fusco de fim de dia ainda quando seu mensageiro voltou de Lançassolar na companhia do melhor meistre que poderia vir e do próprio Oberyn Martell.
Nesse ponto do dia, Cylla já usava um vestido simples de ficar em casa, sem espartilho, de costas abertas e estava de cabelos soltos e descalça.
Seu tio a encontrou sentada nos degraus da frente da casa com um lobo cinzento definitivamente bem maior que ela deitado aos seus pés mordiscando uma peça de carne que fora cedida das cozinhas enquanto a princesa se ocupava em molhar a pelagem grossa do animal para que não sofresse tanto com o calor.
Dos três, Greywind definitivamente fora o que se recuperara mais rápido, tendo energia o bastante para se levantar firmemente postado entre Cylla e os recém chegados e rosnar para Oberyn com todos os dentes a mostra.
– Está tudo bem, meu amigo querido. – ela disse em um tom calmo, gentilmente acariciando as costas do lobo para acalmá-lo. – Eles vieram nos ajudar.
Apesar de não relaxar completamente, Greywind parou de rosnar, voltando à sua posição aos pés de sua nova humana favorita. O lobo confiava nela, pois podia sentir que era boa e também pois o ajudara e ajudara Robb. O canino também não podia deixar de notar que gostava da forma como aquela humana sempre fazia carinho nele, ao contrário dos outros: sabia que Lady Catelyn não era sua maior fã, Robb simplesmente não costumava fazer carinho, e aquela pobre Jeyne Westerling tremia dos pés à cabeça com a simples visão de Greywind.
E no fim das contas, havia algo a se dizer sobre o caráter de humanos que se davam bem com animais, principalmente aqueles de natureza tão desconfiada quanto lobos.
– De onde veio ele? – Oberyn questionou, permanecendo seguro sobre seu cavalo enquanto o restante da comitiva desmontava e apressava o meistre para dentro.
– O mar o trouxe para mim. – ela respondeu sorrindo e coçando Greywind entre as orelhas, que abanou o rabo satisfeito.
– Acho improvável que essa coisa não saiba nadar, Cylla. – Oberyn respondeu olhando para o lobo imenso. – E dúvido que você mandaria buscar um meistre em Lançassolar só pra cuidar dessa sua bola de pelos gigante que parece muito bem de saúde e até meio mimado.
– Bem, se o lobo não estivesse bem, eu chamaria sim um meistre pra ele. Mas realmente, ele não foi o único que o mar trouxe pra mim. – ela lançou um olhar espertinho para seu tão querido tio. – Junto com ele vieram duas pessoas importantes.
– Pare de fazer mistério antes que Arianne vire minha sobrinha favorita no seu lugar! – alertou Oberyn.
– Robb Stark, o Rei do Norte, está vivo e dentro da minha casa, sendo tratado pelo meistre que você me trouxe nesse exato momento. Junto com ele, está seu escudeiro ou aliado que ainda não fui capaz de identificar e a nossa oportunidade de punir os Lannister pelo que fizeram com a tia Elia.
Pela primeira vez em anos, Oberyn Martell ficou sem fala, e quando falou foi apenas para comentar que Cecylla havia transformado sua casa em um abrigo não só de bastardos, mas agora também de reis mortos, lobos gigantes e escudeiros fiéis demais.
A semana foi passando, e Oberyn com muita hesitação voltou a Lançassolar no dia seguinte apenas após inúmeras assegurações da parte de Athlas Sand de que ele manteria Cecylla segura.
Não que manter a princesa segura fosse difícil, agora que o lobo gigante do Rei do Norte a seguia devotamente pela casa e para onde quer que ela fosse, ferozmente mostrando os dentes afiados a qualquer estranho ou Athlas, de quem Greywind parecia não gostar nada.
Quando o escudeiro acordou no sétimo dia da semana, ao ouvir o barulho de água corrente, sentir o cheiro de especiarias no ar e ver a luz do sol filtrada por cortinas amarelo-claras, ele acreditou verdadeiramente que chegara ao paraíso. Seria tudo perfeito se não fosse o calor e a forma como sua cara ardia.
Ou a dor na perna gerada pelo pulo que ele dera ao ouvir a porta se abrir. A primeira coisa que seus olhos captaram foi uma cascata de cabelos castanhos, pele morena de sol e um longo vestido azul céu.
Quando a moça se virou, ficou evidente que sua característica mais marcante eram os grandes olhos verde-dourados. Era o tipo de mulher com um rosto gentil e olhar esperto que levaria a maioria dos homens a loucura, mas não ele.
– Oh! Você está acordado! Graças aos deuses! – a voz dela era suave e melodiosa, um sorriso amigável aparecendo em seu rosto enquanto ela se aproximava, colocando a vasilha que segurava na mesa de cabeceira ao lado dele e servindo um copo de água, tomando um gole do mesmo na frente dele para que visse que não estava envenenado antes de lhe oferecer água.
Enquanto bebia, ele observou que aquela ação sozinha mostrava que ela era uma moça muito mais esperta do que qualquer uma das ladies desmioladas e cabeça de vento que o Sul tinha a oferecer.
– Onde estou? – ele questionou uma vez que havia terminado de beber um segundo copo de água.
– Em Dorne. – ela respondeu calmamente, se movendo graciosamente para o pé da cama e levantou os lençóis, mostrando a perna enfaixada dele. – Achei você e seus companheiros, tanto o humano quanto o canino, quase mortos na praia aqui perto há uns quatro dias e os trouxe para cá.
Foi quando ele notou que ela não havia entrado sozinha, mas o lobo gigante de Robb a seguira porta adentro e parecia muito confortável perto da moça, além de estar mais bem escovado e limpo do que jamais estivera antes.
– Agradeço sua bondade, milady, mas o senhor da casa não achou inapropriado que trouxesse dois homens para cá?
– Tenho certeza de que acharia se tal homem existisse. – ela comentou em tom bem humorado, terminando de ajustar a bandagem e se aproximando. – Me chamo Cecylla Martell, e sou a senhora desta casa.
A respiração do rapaz ficou presa na garganta por um momento: lá estava ele, um mero escudeiro, tendo seus ferimentos tratados pela segunda princesa Martell de Dorne.
– Alteza, me chamo Olyvar Frey e posso apenas oferecer à senhora meus serviços e minha lealdade como pagamento por sua gentileza! – ele falou tentando se levantar.
– Ora que besteira! Fique deitado! – apesar do tom gentil, estava óbvio que era um comando. Olyvar, a muito contragosto, obedeceu. – Você foi picado por uma cobra, nada de peso em cima dessa perna até ao menos daqui uma semana! E essas queimaduras de sol no seu rosto são sérias! Preciso passar remédio para que você não fique com cicatrizes para sempre.
Aquela era definitivamente a situação mais estranha da vida de Olyvar, deitado ali naqueles lençóis mais nobres do que os Frey das Gêmeas jamais poderiam pagar enquanto uma princesa Martell de Lançassolar espalhava por seu rosto alguma pomada que ao menos não cheirava mal como os unguentos que os meistres das Riverlands faziam.
– Vou buscar mais água, e mandar te trazerem uma refeição leve, uma vez que comer muito agora só iria chatear seu estômago. – Cecylla murmurou tranquilamente enquanto limpava as mãos e ajeitava novamente a vasilha nas mãos. – Quando tiver comido, se não estiver muito cansado, se importaria em contar como veio parar na praia com o Rei do Norte?
– É claro, milady. – ele concordou com um suspiro, percebendo a ardência em seu rosto diminuir.
Sentia-se em paz: se Greywind era tão amistoso com a princesa, então era sinal de que ela não iria machucá-los e, para ser sincero, todo aquele lugar exalava um ar de tranquilidade e paz.
O barulho do vento nas ramagens, o som de água corrente, a própria decoração em tons de amarelo claro do quarto mostrava que aquele era um lugar de pessoas felizes e tranquilas.
Mais tarde, quando o sol já se pusera no céu, uma brisa fresca bem-vinda agitava as cortinas do quarto e Olyvar já fora propriamente alimentado com um ensopado de legumes com o tempero mais maravilhoso que ele já provara, a princesa voltou ao quarto.
Olyvar percebeu que ela andava tão silenciosamente pois estava descalça, não usava os cabelos presos como as ladies do Sul, e sim livres e soltos. Ao redor de seus ombros, vinha uma echarpe transparente da mesma cor que o vestido.
– Boa noite, Ser Olyvar. Teve um bom jantar? – Cecylla perguntou com um sorriso amistoso e acolhedor, sentando-se na cadeira postada no lado oposto do quarto. Greywind imediatamente apoiou a cabeça nos joelhos da princesa, pedindo carinho.
– O melhor que já comi, para ser sincero. Acho que nunca havia comido algo tão bem temperado. – ele respondeu sorrindo de volta. – E… Não sou nenhum Ser, Alteza. Apenas um escudeiro.
– Não acho que um simples escudeiro arriscaria a própria vida da forma como você arriscou a sua por Robb Stark. – ela comentou com um tom sério, porém ainda suave. – Em minha casa, você é Ser Olyvar. Título esse que eu pretendo oficializar assim que possível.
– Vossa Alteza me honra além de como minha própria família de sangue o faria. Não vou me esquecer disso. – Olyvar afirmou. E era verdade. Ele jamais se esqueceria daquela princesa de olhos verdes e coração bom.
– Por favor, me chame de Cylla. Ou ao menos do meu nome, Cecylla. – ela sorriu, suas mãos correndo distraidamente os pêlos do lobo, que relaxava mais e mais contra o carinho.
– Cylla. – o Frey sorriu. Era um apelido tão singular e delicado, de soar tão harmonioso que combinava perfeitamente com ela. – Deve me chamar de Olyvar, então. Ou de Olly, como minha irmã Roslin costumava fazer.
– Olly. – a princesa retribuiu o sorriso. – Você me contaria agora que infortúnio trouxe você e Sua Graça até minha praia?
O que incentivou Olyvar a falar foi o olhar dela. Um que deixava bem claro que ela não estava ordenando que ele falasse. Que se ele não estivesse pronto para falar, ela esperaria até que ele estivesse.
– Meu pai… Lord Walder… Ele quis me enviar para alguma missão antes do casamento de Roslin com Lord Edmure, talvez porque soubesse que Robb era meu amigo. Eu jamais o trairia. – ele narrou, incentivado pelo olhar de puro interesse de Cecylla. – Quando se casou com Lady Jeyne, Robb me liberou dos meus deveres de escudeiro em favor do irmão dela, então eu não precisava ficar, mas… Era o casamento de Roslin. Eu não podia estar longe da minha irmãzinha em um dia como aquele, então eu me escondi nos canis para poder estar lá. Foi apenas a minha sorte que acabei trancado lá dentro junto com Greywind, essa bola de pêlos esperta.
Ele acenou com a cabeça para o lobo gigante cinzento que estava prestes a dormir no colo da princesa, parecendo muito mais um cão doméstico que um lobo de guerra.
– Greywind… – Cylla murmurou com um sorriso, coçando entre as orelhas do mesmo, que abanou o rabo contente. – Então esse é o nome do meu querido amigo. O que aconteceu?
– Bem, passei a tarde tentando dar um jeito de sair. Felizmente, estava com minha espada e minha adaga: consegui arrombar a porta do canil bem ao tempo em que Greywind começou a ficar agitado. Depois de um tempo convivendo com o peludo aí, a gente aprende a confiar na intuição do bicho. Ele disparou correndo para o salão do castelo e eu só segui. – Olyvar continuou, ajeitando sua posição na cama e bebendo um gole do suco refrescante que viera com seu jantar. – Bem a tempo. Quando cheguei, estava a maior confusão, gente sendo morta a rodo, Robb com uma flecha no peito e ambos os Westerling mortos. A pobre Jeyne… Era uma boa menina, mas tão cabeça oca… Eu me aproveitei do caos e da ajuda de Greywind para arrastar Robb para fora, já que ainda estava vivo.
– Que horror pensar que as pessoas hoje em dia não se importam mais com as leis dos hóspedes! E a pobrezinha da sua irmã! Tenho certeza que não merecia que um massacre ocorresse bem no mesmo dia que seu casamento. – Cylla comentou com os lábios espremidos em desaprovação.
– Exatamente! Eu mal pensei direito em um plano, só sabia que aqui em Dorne os Lannister não viriam atrás de nós, então catei o primeiro candelabro de ouro que vi, coloquei Robb em um cavalo e cavalgamos sem parar até chegar ao porto. Lá, troquei os cavalos e o candelabro por um veleiro pequeno e uma bússola. Infelizmente, não sou excelente em navegação, então viemos parar na sua praia. – ele terminou tomando um gole de suco. – Minhas botas estavam cheias de água: o barco furou no caminho. Então as tirei para escorrer, mas com a minha onda de boa sorte, logo fui picado por uma cobra. O resto você sabe. Nossa, que bebida boa! O que é?
– Suco de fruta. Abacaxi, e eu sempre peço pra minha cozinheira colocar umas folhas de hortelã amassadas. Deixa mais refrescante. – ela sorriu. – Eu sinto muito de verdade por essa dificuldade toda, Olyvar. Nem posso imaginar o desespero que você sentiu. Mas seus esforços não foram em vão: Robb vai viver.
– Os deuses foram bons em nos mandar para você, Cylla. – Olyvar sorriu. – Bons até demais! Essa é a cama mais confortável em que já estive na vida!
– Você me honra com seus elogios. – Cylla riu sincera, um riso tilintante e melodioso como água corrente. – Como imagino que voltar para as Gêmeas não seja uma boa ideia, saiba que pode ficar, Olly. Pelo tempo que quiser. Até para sempre. Adoramos gente nova por aqui.
– Se pretende me tornar um Ser, então gostaria de jurar minha espada a você, Cecylla. Os deuses sabem que se não fosse por você, seríamos todos comida de gaivota. – Olyvar sorriu com honestidade.
– Eu fico feliz em aceitar. E espero que saiba que não espero nada em troca de ter salvado vocês na praia. – a honestidade no sorriso de Cecylla foi igual.
Conforme os dias se passavam, a saúde do Rei do Norte melhorava, mas não havia indícios de que ele acordaria logo.
A perna de Olyvar já estava muito melhor, e ele ia a caminhadas curtas pela propriedade com Cecylla. Os dois rapidamente haviam se tornado bons amigos, e ele apreciava as caminhadas e a paisagem.
Vira que a propriedade em si era quase autossuficiente. Eles tinham uma estufa onde cresciam plantas medicinais de quase toda Westeros, uma horta de vegetais e outra de verduras, assim como um pomar de frutas e uma fazenda de animais, com algumas cabeças de gado, algumas vacas leiteiras, uma pequena vara de porcos, um galinheiro cheio de galinhas e um galo, um casal de cabras, gansos, quatro gatos de uma raça que ficava tão enorme que pareciam leões em miniatura, um pequeno haras de cavalos e um canil com alguns cães.
Logo ficou claro que todos os animais da casa eram muito bem tratados, e Cylla fazia questão de revezar os dias e alimentar os animais ela mesma. E não demorou a ficar óbvio que Greywind era levemente mais mimado que o restante dos animais da casa.
Olyvar logo conhecia bem boa parte do pessoal de lá, notando que a maioria eram bastardos. Ele nunca em sua vida vira bastardos tão felizes quanto os que viviam ali, provavelmente porque ali eram simplesmente pessoas sem qualquer julgamento. Ele se dera bastante bem com Athlas, adorava os comentários sarcásticos de Kaetryna e estava simplesmente encantado pela pequena Maryon.
Maryon ali era a princesa de seu próprio pequeno reino encantado. Ela corria pelos jardins floridos, conversava com a estátua de sereia em uma das fontes e era extremamente magnânima com seus súditos: os animais da fazenda. Especialmente com os gatos Chanceler, Duque, Duquesa e Almirante.
Mas no momento, a atenção da pequena não estava em seus súditos tanto quanto no misterioso estranho adormecido. Ela havia se convencido de que ele era um príncipe, então sempre que ia vê-lo, usava a linda tiara de pedrinhas lilás que seu pai dera para ela quando viera visitá-la da última vez com tio Garlan – tio Loras e tia Margaery não puderam ir daquela vez, ele explicara, pois tia Margaery iria se casar com o rei Renly Baratheon.
Maryon tinha quase certeza de que se a Septã Fanelle a pegasse ali no quarto do príncipe adormecido que sua mãe dissera que se chamar Robb, a pequena levaria uma ralhada e seria levada para outro lugar.
Ao mesmo tempo, ela não achava que estava proibida de fazer companhia para o estranho, afinal a porta do quarto dele sempre era deixada aberta durante o dia. Se ela tivesse perguntado ao Meistre Danael, saberia que era por que a circulação de ar fazia bem à saúde, mas aquela princesinha em particular não se preocupava com muita coisa além da magia de seu reino e dos biscoitos que a cozinheira Myria sempre guardava em um pote tão lá no alto que ela tinha que pedir para Athlas alcançar para ela. Ou para Ser Olyvar, que era muito bonzinho e alcançava os biscoitos sempre que ela quisesse.
Naquele dia específico, Ser Olyvar fora particularmente bonzinho e enchera uma bolsinha com um monte de biscoitos para ela carregar com ela e ir comendo onde quer que fosse. Ela decidiu que iria ver o príncipe adormecido, e foi caminhando até o quarto dele sendo seguida de perto pela gata Duquesa e usando sua tiara de pedrinhas lilás.
Maryon estava sentada no tapete comendo biscoitos – e Duquesa lambendo as migalhas espalhadas – há algum tempo quando o príncipe adormecido finalmente acordou.
Ele abriu os olhos, tão azuis quanto Maryon imaginou que seriam, e piscou algumas vezes resmungando baixo antes de finalmente ver a pequena menina.
Ela sorriu largamente, se levantando e espanando as migalhas de biscoito e os pêlos brancos de Duquesa de seu vestido cor de creme bordado com florzinhas lilás e se aproximou alguns passos.
– Finalmente você acordou! – ela falou animada. – Achei que tinha sido amaldiçoado como aquela princesa da história que dormiu por mil anos!
– Q-quem é você? – o príncipe adormecido perguntou confuso, com a voz rouca.
Maryon sorriu alegremente, e decidiu não dizer que era uma princesa logo de cara, para não assustar o príncipe adormecido, então respondeu:
– Sou a donzela da casa!
– A… Donzela?! – o príncipe adormecido arregalou os olhos em surpresa. – Onde estou?
– No reino da minha mãe! – ela continuou animada. – Aqui tudo é mágico, todos são bonzinhos e nenhuma bruxa má amaldiçoa as pessoas! Oh! Eu preciso chamar a minha mãe e contar que você acordou! Ela está cuidando de você e do Ser Olyvar há um tempão! Vai ficar feliz em te ver acordado!
E com isso disparou porta afora, os cabelos dourados esvoaçando atrás de si, deixando um Robb Stark chocado para trás, encarando a gata branca enorme que ainda lambia migalhas de biscoito do tapete.
•••
Eu estou tão tão taaaao animada!
Essa fanfic está guardada nos meus rascunhos há meses já, mas eu simplesmente não consegui resistir a postar porque eu simplesmente AMO todo o conceito que eu criei ao redor da Cylla!
Essa é pra você Lia!
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