𝑵𝒊𝒏𝒆
Até mesmo os gemidos de dor aos pés de [Nome] pararam quando as balas erraram o corpo de Manjiro.
Já que ele não estava, precisamente, no centro da porta, e sim inclinado para ao lado direito, perto de onde um dos caras ainda se rastejava. Mas ele não desviou o olhar para seu lamentável estado, e apenas encarou a mulher com a arma ainda apontada para si.
— Não importa se é em um galpão ou em uma festa, você sempre encontra um jeitinho de arrumar problemas.
Um meio sorriso se escondeu atrás daquelas palavra, e seu motivo deveria ser o pensamento e todas as possibilidades de fazê-la pagar por aquilo.
Ajustando a arma na mão, [Nome] considerou atirar nele, claro, não se esquecendo quem ele era, e o nome que carregava nas costas. Manjiro não era chefe da maior organização criminosa do Japão por seu senso de humor, ou pela sua persistência.
E com certeza, ele estava em um nível completamente diferente dos integrantes da Tokyo Manji que acabara de derrotar. E sair daquele maldito prédio, lhe renderia esforço.
Talvez devesse tirar os saltos antes disso.
[Nome] levantou o queixo, o dedo no gatilho estava pronto.
Mas enquanto sua cabeça pensava nas possibilidade de escapar sem chamar atenção, outros entraram atrás de Manjiro, os mais espertos sacaram as armas da cintura quando viram a situação se desenrolar, onde uma desconhecida, rodeada dos corpos de seus companheiros caídos, apontava o cano de uma pistola no peito de seu chefe.
Os olhos de [Nome] foram atentos ao contar quantos tinha, treze, sete de um lado e seis do outro, se movendo contra a parede, como duas meia luas tentando deixá-la no escuro.
— Se fudeu. — sua atenção não saiu do loiro, que parecia calmo demais para alguém que tinha o peito marcado por uma bala.
— Ah, mas que merda. — foi quase impossível não ver Draken passar atrás de Manjiro.
Ótimo, mais um. A mão de [Nome] apertou a arma, o líder, mais o vice-comandante e mais treze homens. Ela não sabia como já não estava sendo atacada, ou o por quê o Sano a sua frente não cuspir ordens, ordens para matá-la, trancá-la e amarrá-la e mais baboseiras sobre ferir o orgulho da Tokyo Manji.
Mas sua mente focou em passar por eles primeiro. E engolindo o nó na garganta, se recusou a deixar a figura de Manjiro lhe escapar da vista.
Sairia daquele prédio, mesmo que tivesse que deixar pedaços de seu corpo e a própria alma para trás.
— Ela não vai recuar para as armas, ainda mais estando com uma. — as palavras terrivelmente tranquilas.
A primeira fala de Manjiro quase a fez franzir a testa, e sua surpresa quase borbulhou quando o presenciou dar dois passos para frente. Tranquilo. Draken levou a mão a cintura, mas não tirou nada de lá.
— Mikey. — um aviso, ou talvez um chamado.
Manjiro achava, de verdade, que [Nome] não atiraria nele para sair dali? Céus, considerava suas poucas conversas um escudo contra a bala.
— Hã? Por que não tão atirando? Matem ela seus desgraçados!
Chiou o homem aos pés dela, e em meio a situação que estava, pensou se não teria sido melhor se tivesse dado um fim aquela sua língua.
— Calado. — o pé de Manjiro estava próximo o suficiente para pisar seu rosto, e foi isso que fez, amassando pele e músculo.
— Mikey. — A voz de Draken estava mais baixa, aquilo era um aviso. O loiro estava cada vez mais próximo do cano da arma.
— [N-Nome]?!
De novo, a voz famíliar quase a fez tirar sua concentração do alvo, mas não precisou, pois Takemichi entrara na sala parecendo um furacão em pessoa, e quase tropeçou no corpo perto da porta.
— O-o que tá acontecendo?!
Precisou de menos de segundos para perceber todas as armas em jogo, e que todas, tirando a da prima, tinham a mesma direção.
A lembrança de Hanagaki tinha lhe sumido da mente, o fato que ele próprio era um dos manda-chuvas da Toman, que provavelmente, ficaria do lado da gangue, mas por serem parentes, levaria metade dos problemas nas costas.
[Nome] não deveria ter brincado tanto com eles.
— Abaixe a arma, [Nome], vamos conversar. — Ken disse, mas ela sabia que no momento que fizesse isso, seu corpo iria ser pintado de vermelho.
Não importava se tinham trocado risos antes.
— Mande eles abaixarem primeiro. — retrucou, e foi quase inevitável não rir enquanto o fazia.
— Vamos conversar, sem armas.
Takemichi se colocou atrás de Manjiro. E sua indiferença com a situação apenas fazia ela querer realmente atirar em seu peito.
Toda sua trajetória fora esculpida por ossos quebrados e violência. Violência que ele poderia estar usando naquele momento contra ela, com as próprias mãos ou não.
Então, por quê não? Talvez não a considerasse uma ameaça digna. [Nome] evitou trincar os dentes.
— [Nome], por favor.
Os outros se entreolharam, — menos Draken, que estava preocupado demais em alguma medida precipitada para tomar as prováveis futuras dores de se chefe — como se estivessem confusos pela insistência de Hanagaki na garota.
— Eu tenho certeza que tudo isso tem uma explicação, e não vamos fazer nada com você, não é, Mikey? — perguntou, com um tipo diferente da cautela que ela conhecia.
E, novamente, Manjiro não respondeu, não confirmou e muito menos negou, não fez nada além de ficar parado, como a porra de uma estátua.
Mas [Nome] sabia que não faziam covas para pessoas que desafiavam organizações criminosas, e também sabia, que a partir do momento que ela levantara uma arma contra o líder de uma, seu nome se encontrava no topo de uma enorme lista de morte.
De novo. Ela quase cuspiu no rosto do homem que tinha a bochecha pisada por Manjiro ao pensar nisso. De novo.
Não se envolver em problemas no Japão, esse era o plano. E o ignorou no momento que pisara lá, e por mais que seu nome estivesse em uma lista de morte... Não arrastaria o de outra pessoa. Não...
— Tudo bem, vamos conversar. — a voz dele preencheu o ambiente pesado, cortando o pensamento de [Nome].
— Quê?! Mas Mikey... — ele não teve tempo de completar sua fala antes do pé de Manjiro pisar em sua garganta, com força.
— Eu mandei ficar calado. — repetiu, mas a ação agressiva dele fez todos ficarem alertas a reação automática de [Nome], os que tinham armas deram um passo a frente. — de que divisão eles são?
— Da... Primeira divisão, senhor comandante. — a arma quase tremera na mão do subordinado.
Depois de pensar, ele disse:
— Então, aceita conversar?
Perguntara com um casualidade que não se adequava a situação, ela inspirou, guardando o ar nos pulmões. O primo dera um passo a frente, com algum tipo de brilho no olhar, esperando sua resposta.
Algo dentro de [Nome] latejou, alertando que não iriam apenas conversar. Não, aquela ação dela renderia muito mais que palavras. Então, endireitando a coluna, se vendo obrigando a dizer:
— Tudo bem. Mas mande largarem as armas primeiro.
Mandou, se direcionando ao líder de todos que seguravam uma. E mesmo com seus olhares mudando de [Nome], que dava uma ordem aos subordinados de Manjiro enquanto o próprio estava presente, ou pior, quando outros subordinados estavam caídos próximos de seus saltos.
Um tremor no joelho de Takemichi se fez presente, junto a linha fina dos lábios.
O primo estava mais nervoso do que [Nome] achava, muito mais.
A mão do Sano se levantou e depois a abaixou, o som das armas caindo no chão quase a fez soltar o ar que guardara nos pulmões. Atrás de Manjiro, Draken aguardava ansioso a ação dela, e o alívio se fez presente quando ela abaixou a pistola, a deixando cair no carpete salpicado de sangue.
A atenção do líder saiu dos olhos de [Nome], parando em seu queixo, onde os resquícios do sangue ainda manchavam sua pele. E mesmo depois das armas terem sido guardadas, ninguém se moveu. Não sem um comando.
— Onde está o Baji? — os cabelos loiros deslizaram sobre os ombros quando se virou para encarar seu vice comandante.
— Inspeção, na Zona Leste. — Ken levantou o queixo, com o alívio lhe tomando as feições.
— Vá chamá-lo. — ordenou ao que estava mais próximo da porta. — avise ao Mitsuya que esvazie o prédio, agora.
Dois saíram pelas portas, reparando nos furos feitos pelas balas na parede da frente antes de sumirem, levando os sons de seus passos consigo.
Então Draken se moveu, passando pelo chefe até estar entre ele e [Nome], e tirando três comprimidos do bolso, ela desviou o olhar para seu rosto.
Seria fácil esconder um ou dois deles na boca, mas três, e daquele tamanho... Deveria ao menos engolir um, e apenas esse um lançaria efeito suficiente nela. Os pegou da mão dele, e os colocando na boca, passou a língua sobre eles antes de engolir todos.
[Nome] não esperou ele pedir para que abrisse a boca, e quando o fez, exibiu a língua para fora dos lábios, a movendo de modo que mostrasse que nenhum deles estava sendo mantido ali.
A visão do corpo de Draken sumiu, e a última coisa que viu foi Manjiro, ainda parado poucos passos dela, e um Takemichi trincando os dentes antes que um pano cobrisse seus olhos e quase seu rosto inteiro, amarrado atrás de seus cabelos com força.
Seus braços foram amarrados para trás por algo de couro, chutaria um cinto — ou algo mais resistente —, sentindo a mão em seu ombro, começou a andar, e quando estava para sair da sala, escutou o Líder da Tokyo Manji dizer:
— Limpem isso, e levem eles.
O ar do corredor estava gelado contra a pele dela, e escutava apenas os próprios passos misturados ao de Draken, a música abafada ainda rodava acima dela.
Menos de um metro depois, sentiu a formigação passar pelo corpo, como se estivesse prestes a ficar dormente. Cedendo o joelho, sua cintura foi segurada e o braço passado por cima do ombro de Ken, controlando a respiração para deixá-la mais devagar.
Estava escutando tudo abafado, e não era pelo pano cobrindo matade de seu rosto, os sentidos também tinham sido afetados.
Não sabia que comprimido era aquele, mas deveria colocá-la para dormir por boas horas.
Mais um par de pés foi adicionado, e sentiu seu outro braço ser apoiado também.
Desceram pelo elevador em um silêncio cortante, [Nome] esperava que eles tivessem ao menos uma troca de palavras e informações úteis, mas tudo que escutou foi "os carros já estão prontos", e nenhuma resposta vinda de Draken.
Quando o ar ficou mais frio, e o som de automóveis sendo ligados chegou aos seus ouvidos, percebeu que estava no estacionamento. Um de seus braços foi solto, e passos apressados ficaram cada vez mais longe.
[Nome] tentou ver pelo pano preto que cobria seu rosto como o carro era, ao menos um resquício de transparência seria útil, mas não viu nada enquanto era apoiada nos bancos traseiros.
Com os tornozelos juntos, a amarração acima do salto beliscou sua pele com força.
— Sabe para onde ir, não desvie a rota, nada de gracinhas. Vou logo atrás. — o aviso de Ryuguji veio detrás do carro, após uma batida forte no porta-malas.
— C-certo! — o outro respondeu, e depois de um suspiro vir se seu superior, entrou no veículo.
O carro balançava vez ou outra, e em cada casual mexida, levava as mãos mais para perto da própria cabeça, até o carro parar e as pontas de seus dedos estarem próximos da última asa da borboleta.
Mas mal tinha passado dois minutos, não poderia ser tão perto. Após buzinas soarem e o motorista xingar sem nenhum pudor, percebeu que estava presa no trânsito.
Era hilário ver criminosos presos no trânsito.
— Porra, porra! — buzinou, parecendo preocupado demais com a situação da estrada para prestar atenção na garota nos bancos de trás.
Carros seguiam eles, era um fato, mas ela não sabia quantos, quantos além de Draken a escoltavam até sabe se lá onde. E era esse último pensamento que a fazia querer cortar o pescoço do motorista e tomar o carro.
Não saber o que deixava Manjiro tão tolerante aquela situação era uma mistura de curiosidade e raiva.
Quando o carro voltou a se mover, ela ficou atenta a todas as falas de seu motorista — e vigia — a viagem toda, e por todas suas reclamações, ele já tinha pisado na bola com Draken alguma vez, desde que seu mínimo respirar parecia ser motivo para que lhe matassem.
Seus pensamentos saíram de todas os planos que maquinavam na sua cabeça quando o carro começou a andar mais devagar, e depois parar.
Relaxou o corpo de novo, e outras pessoas além deles pareciam estar ali.
— Mikey deve tá puto. — escutou enquanto alguém se aproximava.
— Eu também estaria. — outro estalou a língua, então a porta traseira foi aberta. — uma coisinha dessas causou essa comoção toda? Que porra.
— Levem ela, e sem gracinhas, Draken já tá vindo para cá.
Repetiu a frase com a voz mais firme do que a que usou durante o trajeto para xingar. Eles ficaram em silêncio enquanto a pegavam, e arrastaram seus pés pelo chão sem nenhuma delicadeza.
[Nome] subiu uma escada em aspiral, ou melhor, foi arrastada por uma, era inevitável uns tropeços aqui e ali, já que aqueles homens eram preguiçosos até para levá-la direito, ou fazer uma inspeção decente.
A porta, no entanto, foi aberta com calma, ótimo, então ali seria seu confinamento até que Manjiro tivesse a boa vontade de aparecer.
O ruído da cadeira sendo puxada ecoou pelo local, então foi quase jogada contra ela. Por mais que os comprimidos tivessem deixado seu corpo relaxado, os músculos tiveram o bom senso de se flexionarem ao sentir suas mãos serem soltas e amarradas de novo a cadeira por cordas.
A estupidez deles quase fez um sorriso nascer nos lábios de [Nome]. Fizeram a mesma coisa com os pés, amarrando-os às pernas da cadeira. A luz incomodou por cima das pálpebras dela quando o nó do pano foi desfeito, dois dedos jogaram sua bochecha para o outro lado.
— Vocês dois, eles estão chegando, e não recebemos ordens de começar o interrogatório. — alguém avisou.
Estalando a língua no céu da boca, eles saíram, fechando a porta atrás de si.
Abrindo levemente os olhos, o suficiente para ver uma mesa lisa a frente e uma cadeira vazia atrás dela, as paredes cinzas não portavam nenhuma câmera.
Segundos depois escutou os pneus cantando do lado de fora, aquela sala deveria ser perto da entrada para o som estar tão nítido.
[Nome] respirou fundo, expirando logo em seguida, deixou as lufadas de ar menos frequentes.
Virando o pulso pelo braço da cadeira de metal, as cordas se prensaram e apertaram a pele dela, mas parou os movimentos ao escutar os passos se aproximando, antes de abrirem a porta.
— Deveríamos ir para a reunião primeiro. — Draken chiou, parecendo não adentrar mais que o necessário. — ela tá apagada, e vai ficar assim por mais um bom tempo.
Os ouvidos se atentaram a captar algo a mais que poderia vir do lado de fora, mas nada.
— Aqui tá cheio de membros da Toman. Temos tempo.
Quase conseguiu ver o familiar trincar de dentes de Ken, tão nítido como a trança balançando em total discordância com algo que Smiley disse uma vez. E a falta de resposta junto ao tom que usara mostrava a [Nome] que já estavam discutindo aquilo a um tempo.
Eles deveriam estar ansiosos para o interrogatório.
A outra pessoa parecia ter aceitado, pois quase não escutou o movimento deles saindo se não fosse o fechar da porta novamente, mas dessa vez, a trancaram por fora.
[Nome] apoiou a cabeça para trás, pela frase de Draken, deveria fingir estar desmaiada por pelo menos mais uma hora. Fingir estar desmaiada era uma coisa, mas aqueles leves sintomas de cansaço estavam presentes.
Deveria dar créditos a ele por isso.
Fechou os olhos, ainda pensando sobre tudo que aconteceu nas últimas horas, e em tudo que poderia acontecer pelas próximas.
☾︎
Já estava ficando cansada depois de mais de uma hora e meia esperando, encarava o teto com as pálpebras quase fechadas quando alguém finalmente entrou.
[Nome] esperava que viessem, ao menos, umas cinco pessoas, mas julgou que não precisava quando viu Sano pelo canto do olho, com as mãos nos bolsos.
Ele não disse nada enquanto se sentava a frente dela, apoiando os pés na mesa vazia.
— Minha situação não tá nada boa se estou amarrada e a primeira pessoa que vejo é você. — a voz saiu meio grogue, como se tivesse acabado de acordar.
— Então já sabia? — perguntou, e seu rosto demostrava que a reunião tinha lhe sugado metade das energias.
— Não tinha como não saber... Você não é muito discreto.
Girou a cabeça de leve, piscando os olhos devagar. Quando decidiu não se envolver com nada mais que a faculdade e em sua relação com o irmão e Takemichi, não quis dizer que não pesquisaria sobre quem comandava o Japão por trás dos panos.
Escutou algumas vezes o nome da Gangue Manji de Tokyo antes de ir embora, mas nada interessante o suficiente que provocasse sua curiosidade.
Assim como não o associou na casa do primo, estava surpresa pela situação que encontrara Takemichi, surpresa o suficiente para não dar atenção a ele, ou com quem ele se parecia.
Mas na segunda vez... [Nome] sabia, sim, quem ele era, quando insistiu para se apresentar descentemente.
— Você não parece muito surpresa, [Nome]. — sua voz a arrancou de seus pensamentos, e se deu conta novamente de onde estava.
Enquanto olhava as amarrações, passou os olhos pela sala, de novo, não encontrando nenhum material de tortura. Não que ele não fosse conseguir um com apenas um comando.
— Achei que fosse acordar com um balde de água, igual nos filmes. — deu de ombros, realmente, estava mais que confortável.
— Não está com medo? Alguns dos homens aqui embaixo daria uma boa grana por alguns minutos com você. — um sorrisinho sorrateiro se estendeu, ela já imaginava que uma boa quantidade de pessoas gostariam de ter sua cabeça em uma bandeja.
Ela pensou no que diria, mas inclinou minimamente a cabeça para o lado.
— Se isso não está acontecendo, deve ter um motivo.
Manjiro tirou os pés de cima da mesa, colocando os dois braços sobre ela, exibindo uma jaqueta preta e uma blusa da mesma cor. Ainda parecia estar com a roupa da festa.
— Eu já tinha percebido isso, mas você e Takemichy são diferentes. — como uma lâmpada sendo acessa, disse:
— Ele não tem participação em nada que aconteceu. — a voz saiu calma, o primo não receberia castigos severos por ser da gangue, assim esperava.
— Tirando isso. Ele queria muito fazer parte dessa conversa. — se encostou na cadeira, as marcas roxas da falta de descanso despontando por baixo dos olhos escuros.
[Nome] não respondeu nada, mantendo a mão fechada enquanto esperava, toda a construção parecia estar vazia.
— Isso seria mais fácil se não tivesse tido testemunhas. — falou com a voz firme. — mas muita gente acabou vendo o que fez com meus subordinados.
Evitou falar alguma coisa que acabasse com aquela conversa e com seu sangue no chão cinza escuro. Ele não disse se considerou ou não a participação de Takemichi.
A falta de resposta fez com que [Nome] abrisse a boca manchada por sangue e batom.
— Então, qual vai ser minha punição? — frisou, indicando mais uma vez que aquela ação não tivera ajuda.
— Quero que trabalhe para a Gangue Manji.
O álcool de horas atrás se revirou no estômago vazio dela, torcendo cada veia de seu corpo ao se lembrar de todos os bordéis no nome da maior organização criminosa do Japão.
Afinal, não se tinha registros de mulheres trabalhando para ele — sem ser desse jeito.
— Eu recuso. — o olhar pareceu lascas de gelo na direção dele, queria que realmente fossem lâminas.
— E eu achando que alguém no seu lugar não desperdiçaria uma chance dessas. — as palavras saíram banhadas em um riso contido, que [Nome] pagaria para fazê-lo engolir.
A recusa coçou para ser repetida, então o motivo dele estar tão calmo era aquele? Durante aquelas horas, fazê-la de escrava era o plano que mantinha aquele sorriso vivo no rosto?
[Nome] afrouxou a mão esquerda, e o rosto de alguém que possuía olhos verdes passou por sua mente.
— Tem uma coisa que você não sabe, que mais da metade das pessoas daqui não sabe.
— Vai me contar? — sorriu sarcástica.
— Vou. — o semblante dele se suavizou, sem sorrisos.
Se apoiando na cadeira, esperou por qualquer que fosse a pegadinha que sairia dos lábios dele.
— Aqueles não eram meus homens. — cruzou as mãos sobre a mesa, não quebrando o contato visual. — e não tenho nenhum tipo de responsabilidade sobre eles.
[Nome] piscou os olhos, como se aquele milésimo de segundo pudesse apagar a informação da mente. Mas Manjiro não diria nada que envolvesse a Toman para uma estranha, e aquela era a mentira.
— Não acredita? — perguntou diante o riso irônico estampado no rosto bonito dela.
— E essa é a informação que quase ninguém sabe? Então, se não são seus, o que são? — o veneno tamborilou na língua dela.
— Espiões. — a palavra saiu a medida que seu rosto ficou sério.
Ok, se aquela fala deveria fazer [Nome] confiar naquilo, não funcionou.
— Os dois homens que você matou, e mais quatro que espancou, são comandados por outra pessoa.
Manjiro falou calmo, mantendo o olhar firme nela.
Algo na mente dela trincou, se aquilo fosse verdade... A face do líder da Toman se iluminou, como se soubesse os pensamentos dela.
— Essa pessoa não sabia que seu plano era falho desde o começo, e não medirá esforços para descobrir quem acabou com tudo. — ele falou como se conhecesse a pessoa por trás das armações. — aceitar minha oferta é sua melhor opção.
Pela primeira vez considerou as palavras de Manjiro, porque ali, em Tokyo, não estava sozinha, e se fosse arrastada para um buraco sem fim, outras pessoas segurariam seu pescoço durante a queda.
— Quem é essa pessoa?
Se fosse verdade, fazia sentido ele não estar bravo por ela ter matado alguns deles.
— Não posso falar. — ele sorriu no final da frase.
[Nome] mordeu o lábio inferior de leve, maldito Sano que tinha richa com mais da metade da população do Japão.
— O que vai fazer se eu não aceitar?
Ela sabia que, se fossem realmente espiões, eles também eram fontes preciosas de informações, e também sabia, que se não tivesse deixado sobreviventes, a conversa não estaria sendo tão pacífica.
— Nada. — deu de ombros.
— Nada? — [Nome] indagou devagar.
— Se conseguir sair daqui, será uma inimiga da Toman, também será uma inimiga do líder dos espiões. — um lado de sua boca subiu enquanto quase sussurrava. — a essa altura, muitas pessoas já devem saber o que aconteceu.
Não precisarei fazer muito esforço. Eram essas palavras implícitas na fala. Se os que sabiam dos espiões ficassem quietos, todo o resto da gangue acreditaria que ela machucou seus companheiros.
Mas Manjiro estava dando a ela tempo, se aceitasse aquela oferta, teria que refazer todo o plano, mas teria o tempo.
— E o que o chefe da Toman ganharia me oferecendo isso?
Por que estava se dando o trabalho de contar aquilo, se fosse verdade, era uma inegável informação valiosa.
O loiro soltou uma risada anasalada, e os cabelos loiros presos pela metade se moveram quando ele inclinou a cabeça.
— Diversão. — [Nome] segurou o ar nos pulmões, com um tipo de raiva diferente lhe tomando as veias. Porque ele podia, porque era divertido.
Erguendo minimamente o queixo, arrastou as pontas dos dedos pelo braço da cadeira devagar.
— Então, [Nome], vai aceitar?
Expirando, se lembrou da última vez que fizera um acordo assim, da dor, do chão, dos olhares e do escuro. Porém, ao contrário do que pensou, não sentiu nada além do gelado metal contra a pele.
— Certo, Sano.
Também não era com aquelas palavras que pensaria firmar seu contrato de serviços, já que geralmente, não tinha outra opção além de balançar a cabeça em concordância.
— Não vou precisar assinar nada? Dando minha palavra de obediência? — ironizou.
— Não acho que seja necessário, mas posso criar um contrato. — devolveu a ironia.
[Nome] revirou os olhos, mas os manteve firmes ao vê-lo se levantar, se aproximar com passos leves — sem o familiar som dos sapatos contra o chão —, e se colocar ao lado dela, desembanhando uma faca da cintura.
Apertar a mão esquerda foi a única reação que teve ao esperar o que o Sano faria com ela. E poderia dizer que ficou até mesmo surpresa por vê-lo raspas as cordas do braço direito dela.
— Cadê a outra? — perguntou, não olhando para ela.
— Outra o quê? — devolveu a pergunta, girando o pulso ao tê-lo solto.
— Adivinha o que achei no chão da sala? — esticou uma das asas da borboleta que estava envolvida nas mãos.
Abrindo a palma esquerda, a outra parte do enfeite afiado brilhou a luz azul da sala, e em um simples puxão, desfez o nó da corda daquele braço.
Um meio sorriso apareceu enquanto Manjiro se afastava da cadeira, embainhando a adaga. Não foi preciso passar mais que duas vezes o objetivo em mãos para livrar os próprios tornozelos da amarração.
Estava tão afiada quanto gostava.
— O que irá dizer quando me verem trabalhando para a Toman? — girou os pulsos, vendo as marcas roxas ao redor deles.
— Que você já era uma integrante nova. — deu de ombros, como se tivesse pensado naquela parte apenas naquele momento.
[Nome] puxou a manga da blusa sobre as linhas que rodeavam a pele, levando o olhar até às cortinas empoeiradas.
— Cadê o Takemichi? — se virou, o líder mantinha a atenção segura nela.
— Esperando. — colocou as mãos nos bolsos de volta, sem dar indícios de sair da sala.
— Qual divisão ele lidera?
Não se aprofundou tanto em saber isso, sobre quantos homens obedeciam suas ordens, sobre o tempo que passou lá. Queria que Take abrisse o jogo com ela antes que fosse embora.
— Você sabe mais coisas do que eu esperava. — não pareceu estar irritado ao dizer isso.
— O suficiente. — de fato, devia dar créditos ao encarregado de limitar informações que vazavam da Toman.
— Quinta divisão, e será nessa que você irá entrar.
Depois das palavras serem ditas, se afastou da parede, indo em direção a porta, sem notar o olhar que recaiu sobre ele, e apesar de esconder toda a estranheza que aquela frase causou, não conseguiu controlar a própria língua.
— Quê? — [Nome] também se virou a porta, mantendo as duas asas — e armas — seguras dentro da palma da mão.
— A partir de hoje você faz parte da quinta divisão da Toman. — ergueu uma sombrancelha enquanto dizia, segurando a maçaneta.
Sinceramente, nem em seus pensamentos mais normais imaginou que entraria para a parte principal da gangue.
E Manjiro saira para o corredor em um único puxar da porta, deixando [Nome] sozinha na sala. Os saltos fizeram o mínimo barulho ao acompanhá-lo, e imaginou que ele seria muito seguro de si próprio por dar as costas a ela enquanto ainda segurava os objetivos pontiagudos.
Os corredores cinzas eram iguais, sem contar as rachaduras que tinham em uma ou outra curva, mas nenhum membro da Toman fazendo ronda ou a segurança da área
Ela soube que não precisava ao se deparar com uma única porta dupla no final do caminho, e após abrí-las, viu os rostos que circulavam pelo Japão como "criminosos e foras da lei".
Parou na divisória da sala e do corredor, todos deles — incluindo Manjiro —, faziam a polícia de idiota, fugindo em motos e carros enquanto seguravam armas e acabavam com qualquer pista que os levassem a cadeia.
E lá estavam eles, em pé, ao redor de uma mesa grande e oval, esperando que seu líder se acomodasse para que pudessem se sentar. Draken foi o único que ficou de pé, ao lado do loiro com os braços cruzados, mas todos levaram o olhar a [Nome] e a cadeira vazia poucos metros a frente dela.
Do lugar onde estava, viu o primo engolir em seco enquanto a analisava, dessa vez com menos pressa.
Ela não esperou alguém fazer uma piadinha e se sentou, ciente da arma que Ken carregava na cintura, — e que provavelmente todos os outros tinham.
— Parece que a conversa foi boa. — Nahoya disse, aquela era a primeira vez que o via longe do irmão.
E foi o único que se atreveu a fazer comentários, [Nome] reparou um por um, em todas suas feições e contrações de boca, mas um em especial manteve a atenção unicamente nela.
O silêncio de seu líder e a indiferença dela fez com que o de cabelos platinados se encostasse na cadeira.
— Então temos uma resposta? — se virou ao loiro, e os outros acompanharam.
O fato de que eles talvez não estivessem ciente da decisão tomada pelo Sano fez com que ela relaxasse na cadeira, não queria — e sequer estava com ânimo — ter que fazer parte daquela reunião.
Mas aquela fala fez os murmúrio começarem, rodeando a mesa como pequenos atos infelizes e sussurros de opinião.
— Considerando que ela ainda está aqui, nosso comandante foi complacente. — disse, mais alto que o resto dos integrantes da Toman, e foi outro estopim para que as conversas retornassem.
Seus óculos quase refletiram a feição de [Nome] quando se virou para encará-la, com os olhos semicerrados, tentando olhar ela de cima.
Tentou caçar fundo na memória seu nome, mas a insistência da queimação no estômago sugava toda sua vontade de fazer algo.
— Eu acho que — começou, baixo, mais baixo que as conversas que ladeavam a sala, mas todos se calaram para ouví-lo.— tem um motivo para ela estar aqui, e não gostaria de ouvir teorias agora.
O homem de óculos arrumou a postura, mantendo aquela hostilidade que tinha por [Nome] longe da vista de todos.
— A forma que eu planejei de contar isso a vocês não era essa, a situação não é das melhores. — olhou um por um todos os seus subordinados de alto escalão. — mas [Nome] é um membro oficial da Gangue Manji, e será realocada para a quinta divisão.
A expressão de surpresa deles foi deliciosa o suficiente para fazê-la esquecer do incômodo físico e aproveitar a bela vista. Ainda mais com o semblante totalmente contratado de Draken. Como se não soubesse daquilo, até aquele momento.
— Hã? Por que ela entraria na Toman? — ele olhou para [Nome] com uma cara estranha, o corte das sombrancelhas se ondulando junto a cicatriz na boca.
— Ver o que ela fez com os integrantes da primeira divisão é um motivo. — apoiou a mão no braço da mesa.
— O que garante que ela não vai atacar membros de outras divisões? Da quinta divisão? Deixá-la fazer parte disso é perigoso. — o homem de óculos argumentou.
— Ela não vai. — Takemichi revidou, lançando um olhar de ódio a ele.
— Aquilo não foi algo planejado, — piscou os olhos devagar. — tenho uma testemunha que afirma que não foi ela que começou a briga.
A imagem do homem atrás do balcão lhe apareceu na mente, talvez ele não tivesse só ficado olhando. Quando voltou a si, todos olhavam para ela.
— Eu não deveria ter revidado? — falou tranquila. — tentei avisar que era um membro da Gangue Manji, mas não me escutaram. — deu de ombros, engatando na mentira do Sano.
— Claro, isso não muda que ela matou dois membros da divisão do Baji. — olhou por cima do ombro, na direção de Draken, que continuou por ele.
— Todas as armas achadas pertenciam a primeira divisão. — segurou as mãos atrás do corpo.
Todos pararam para pensar, menos Takemichi, que esperava qualquer que fosse a reação dos outros.
— O que os sobreviventes disseram? — o de cabelos platinados indagou.
— Confessaram tudo. — Ken fechou os olhos por um momento antes de responder.
— Tudo o quê? — [Nome] revirou os olhos, se aquele cara mal encarado continuassem a fazer perguntas, não sairia de lá tão cedo. — por que atacaram ela?
Foi rápido, mas conseguiu pegar o olhar que Manjiro lançou a ela.
— Eu não sei se você sabe, — atraiu a atenção dos outros quando começou a falar. — mas alguns homens não sabem receber um "não".
Disse sarcasticamente, encarando diretamente os olhos por baixo da armação cinza. E mesmo que não se importasse, só naquele momento percebeu o próprio estado, a roupa rasgada e suja de sangue.
Ele pareceu ter se dado por vencido, pois só cruzou os braços sobre a parte de baixo do terno.
— Esse foi o estopim disso tudo? — ergueu uma das sombrancelhas platinadas com um pequeno corte. — uma rejeição?
— Sim. — o líder deu de ombros.
— Que coisa mais besta. — Smiley ciciou. — está tranquilo com isso Baji? Eles eram de um círculo próximo á você.
Aquela alfinetada fez com que o de cabelos escuros e grandes se virasse, semicerrando o olhar na direção do cacheado.
— Sem objeções. — mostrou os caninos afiados ao dizer, a raiva dele era palpável. Então ele era o líder da primeira divisão.
O silêncio que se seguiu foi animador, saber que sairia dali fazia o incômodo se acalmar.
— Dito tudo o que conversamos antes, e o que acabei de esclarecer... Se ainda não gostarem da minha decisão, estou aberto a sugestões.
Manjiro se levantou devagar enquanto dizia, querendo ou não, colocando um ponto final naquela reunião, e se alguém quisesse ir contra, teria que procurá-lo depois.
— Ótimo.
Disse por fim, olhando Takemichi por tempo o suficiente para que ele se levantassem e fosse até a prima. [Nome] se ergueu sem fazer barulho, não esperando que ele segurasse sua mão.
— Esse sangue é seu? Eles te machucaram? — perguntou, levando-a até os corredores sem graça do lado de fora.
Ainda conseguia ver o olhar de superioridade por baixo das lentes, e teve certeza de que ele viu seu sorriso.
— Nem se tivessem tempo o suficiente.
Ele sorriu, andando lado a lado pelas escadarias até a parte de baixo, não dando tempo para ver o que tinha na sala ao lado dela, mas pôde ver os cachos azuis de Souta pela fresta da porta.
Realmente, um não ficava muito longe do outro.
O portão estava enrolado para cima em uma camada espessa de metal enferrujado, deixando o espaço livre para os três degraus que separavam o chão de cimento ao de terra batida, onde várias motos e carros estavam estacionados ao redor.
E apesar de todos os homens e adolescentes encostados nos veículos, de braços cruzados ou fumando, ninguém falava nada.
Seus olhos rolaram devagar até o homem encostado na extensa grade que rodeava o local até onde podia ver, usando óculos escuros com cara de poucos amigos, mas se afastou dela ao ver o loiro se aproximando.
— Acho melhor você passar uns dias na minha casa, né?
De fato, já tinha conversado com ele de dormir dois ou três dias lá... Adiantar aquela estadia não faria mal.
Além de que Manjiro — até certo ponto — estava certo, aquela hora a situação deveria ter sido estendida a pessoas que não pensariam duas vezes antes de irem atrás dela. Que bom, [Nome] não hesitaria também.
Sequer prestou atenção a lâmpada fraca que ajudava a iluminar a parte de fora da construção junto ao céu mesclado de roxo, rosa e azul escuro ao ver o motorista abrir a porta do carro preto poucos metros de si.
— Para minha casa, volte para cá depois. — Takemichi avisou, recebendo um aceno curto em resposta. — Me espere lá, tá? Não vou demorar tanto.
Ao chegarem próximo da porta aberta, apoiou a mão sobre ela enquanto o silêncio da conversa se dissipava e sobrava apenas o inicial nada.
Um mínimo levantar de lábios foi a deixa para fazer o primo voltar em passos rápidos para dentro.
E quanto Takemichi chegou em casa, acompanhado e com os cabelos bagunçados e cansado, [Nome] não estava lá.
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