━━ 56.
𝗥𝗔𝗙𝗘.
Paro meu carro bem em frente aos portões enferrujados do enorme local público. Respiro fundo, tomo mais um gole da minha garrafa d'água e respondo as mensagens de Avery, dizendo que ela e as meninas poderiam enrolar mais um pouco, porque eu demoraria até voltar pra casa. Hoje é dia vinte e cinco de dezembro, também conhecido como o Natal. Eu literalmente não tive tempo pra decifrar sozinho que dia era hoje. Acordei com minha namorada em cima de mim, me chacoalhando e me enchendo de beijos completamente alegre, me dizendo que o melhor dia do ano chegou. Talvez eu tenha descoberto o feriado preferido de Avery da forma mais inusitada possível.
Pope ficou com Avery, Sarah e Kiara na cozinha, preparando as coisas do jeito que só ele sabia fazer. Kiara bateu os pés que sua comida era tão boa quanto, mas sendo franco, eu duvido muito que algum tempero ultrapasse o de Pope. Juro por Deus que nunca comi pratos tão bons quanto os dele. Quer dizer, acima dos mesmos, apenas os que minha mãe preparava pra mim quando eu era mais novo. Após isso, não me lembro de outra culinária que me impressionou tanto quando a dele. John B e Topper provavelmente estavam no mercado, comprando coisas pra decoração e mais pro resto dos pratos e sobremesas.
Queria ter ficado em casa e os ajudado como pudesse, mas eu não conseguiria seguir o dia tão entusiasmados quanto eles se não fizesse do jeito certo.
Após trancar o meu carro e caminhar sobre as minhas pernas tremendo até as portas do cemitério, penso no quão louco esse ano foi. Num período de praticamente seis meses, conheci uma pessoa que eu achava estupidamente irritante e me apaixonei por ela, fui proibido de viver como um jovem normal fazendo merda, perdi o meu melhor amigo, quase perdi a mulher dos meus sonhos e quase perdi a minha irmã. Saí do controle, venci o Frozen Four com os caras e consegui ainda mais visibilidade no esporte da minha vida. Pedi a mulher dos meus sonhos em namoro e agora estou aqui, com a vida estabilizada e com a cabeça completamente diferente do que era do início do ano.
Eu só percebi como mudanças afetam as pessoas depois do turbilhão de coisas que aconteceram comigo num curto período de tempo. Minha única preocupação era zelar pela minha reputação e me gabar por ser o cara mais foda daquela merda de faculdade. Hoje, só quero estar sossegado comigo mesmo e fazer minha namorada feliz. Ter meus amigos por perto também é um privilégio.
E a maior diferença da minha vida antes pra minha vida de agora é a ausência de JJ, algo que eu não imaginaria acontecer antes dos nossos setenta anos.
Quer dizer, eu sempre pensei que JJ morreria de velhice. A saúde do cara era blindada, apesar de cometer loucuras quando ingeria álcool demais. Sua ousadia em se meter nas piores situações de perigo possíveis era hilária, mas incrivelmente, ele sempre conseguia se safar. Por isso que nunca passou pela minha cabeça que uma fatalidade poderia tirar sua vida tão de repente.
Mas é óbvio que o destino costuma pregar peças com a minha cara. Esse ano foi a maior prova de que nada nunca é o que esperamos, muito menos o que parece ser.
Caminho pra dentro do extenso campo. Parece até que é algum tipo de quadra de futebol, onde crianças aparecem pra brincar de vez em quando e jogar bola despreocupadamente. Mas o que eu vejo infelizmente não é a inocência e a alegria de crianças, apenas um bocado de lápides e flores em algumas delas.
Preciso suspirar pra segurar o choro subindo na garganta. Não sei se um dia vou me acostumar totalmente com sua perda, mas ainda dói pra caralho. A morte é uma parada tão repentina e tão intensa ao mesmo tempo. Nunca esperei perder minha mãe e meu melhor amigo tão cedo. Não sou o tipo de pessoas que tem problemas com mudanças, porém a ida de JJ é algo que, honestamente, não sei se a ficha cairá completamente algum dia.
Talvez um dia existirá um mundo onde sua memória apenas me tragam coisas boas, e não a total falta de ter o meu irmão do meu lado todos os dias.
E então, depois de alguns minutos tão lentos andando pelo cemitério, eu chego até sua lápide. Seu nome completo estampado naquela pedra, pra absolutamente qualquer pessoa que passasse por perto lesse se quisesse. Tenho certeza que se JJ soubesse que seu primeiro e segundo nome estariam expostos para desconhecidos, ele arrancaria os próprios cabelos. Teve uma vez que depois de beber, insistiu que queria se registrar no cartório como JJ definitivamente. Eu chorei de rir nesse dia, John B e Pope passaram mal de tanta gargalhada. Foi um dos nossos melhores momentos juntos.
"⏤ Minha mãe me batizou de Jonathan Jason Maybank, cara. Jonathan Jason. Quem se chama Jonathan Jason? Eu sofria bullying igual um filho da puta no ensino fundamental por causa dessa merda. ⏤ JJ, completamente bêbado, gesticulava com uma mão segurando a garrafa de cerveja e um cigarro equilibrado entre seus lábios.
Minha barriga doía de tanto rir.
⏤ Isso não é engraçado, cara. Todos vocês tem nomes bonitinhos, agora, olha pra mim. Tenho nome de sei lá, um açougueiro.
⏤ E o que tem de errado em ter nome de açougueiro? ⏤ Pope dá corda.
⏤ Não vendo carne, só amasso. ⏤ JJ faz um gesto obsceno.
E nos cagamos de rir novamente."
Sinto falta dele.
Sinto muita falta dele.
Me agacho ao lado do seu túmulo, já notando minha visão embaçada pelas minhas lágrimas. Ele sabia como eu não era um cara de chorar fácil, mas era ele, não é? Não me julgaria por chorar num momento difícil. Talvez caçoaria da minha fragilidade por ele. Provavelmente me apelidaria de maricona ou coisa do tipo. Ele tinha um espírito forte de quinta série dentro de si.
⏤ Acha que vou perdoa-lo por ter aparecido pra minha namorada antes de mim? Isso não vai rolar, cara ⏤ brinco e acabo dando uma risada fraca, como se ele pudesse me escutar. ⏤ Ela te odiava no começo, eu nunca te odiei. Quer dizer, só as vezes, tipo quando você roubava as minhas camisas e sempre as sujava. Você tinha uma mania horrível de ser desastrado e derramar café nas minhas blusas de marca.
Observo como o céu está azul hoje. Tão limpo quanto a cor de seus olhos.
⏤ Porra, hoje seria um dia perfeito pra passarmos o dia na praia e quando voltássemos, a ceia de Natal toda estaria pronta. O Pope provavelmente se entreteria mais em cozinhar do que encher a cara na ateia com a gente, o John B virou o chicletinho da Sarah e a Avery, Kiara e minha irmã também prefeririam preparar pratos bons até a hora que fosse possível. Você sabe que eu sou um merda na cozinha, você também era, de qualquer jeito.
Respiro fundo e passo os dedos pelo seu nome lapidado.
⏤ Ganhamos o Frozen Four, sabia? Você vivia falando dessa merda o ano inteiro. Sua ida abalou todo mundo, mas eu me senti na obrigação de vencer isso por você. Cara, um dos caras do Bruins entrou em contato comigo. Tem noção que no próximo ano, estarei jogando na porra da Liga do Hóquei? É nosso sonho desde sempre, cacete.
Me pego com um sorriso idiota no rosto. Seja lá de onde JJ esteja, ele deve estar rindo demais da minha cara por ser alguém tão emotivo.
⏤ Hum... Avery e eu estamos namorando. Eu tô feliz. Na real, nunca estive tão feliz quando estou agora. Nunca me senti tão livre, cara. É surreal. Não me julgue por ela ter dado na sua cara e eu não ter te defendido naquele dia, mas você sabe que tava errado. Não compactuo com vacilação. ⏤ rio novamente, fitando a aliança brilhando no meu dedo.
Percebo as horas no meu relógio de pulso. Não posso me atrasar muito, afinal, ainda precisava ajudar o pessoal com o resto das coisas. Também não posso ser tão egoísta. Afinal, à noite, eu iria comer igual um desgraçado.
⏤ A noite não vai ser a mesma sem você aqui. Nenhum lugar é o mesmo sem você presente, irmão. Espero que você esteja comemorando o feriado de onde você esteja. ⏤ sinto uma lágrima escorrendo. ⏤ Sinto saudade, cara.
E assim que eu passo os dedos por sua lápide novamente, não estou mais sozinho. Uma borboleta azul pousa bem ao lado de seu nome. Ela brilha tanto quanto o céu, tanto quanto os olhos de JJ, tanto quando o oceano que envolvia Honolulu.
Me lembro exatamente de suas palavras naquele recado que me mandou por telefone no dia que tudo aconteceu. Do seu sonho e dos possíveis significados. Então, sorrio. Sei que ele nunca vai me deixar sozinho em qualquer lugar que eu fosse, seja lá qual.
Até depois da vida.
☼
aquele >não< é o nome verídico do JJ.
o nome verdadeiro dele nunca foi citado
pelos autores e roteiristas da série.
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