{45} Câmara Secreta Pt. 2
— Vamos deixar o problema em suas mãos, então, Gilderoy. — Disse a Professora McGonagall — Hoje à noite será uma ocasião excelente para resolvê-lo. Vamos providenciar para que todos estejam fora do seu caminho. Você terá oportunidade de cuidar do monstro sozinho. Enfim, terá carta branca.
Lockhart olhou desesperado para os lados, mas ninguém veio em seu socorro. Ele não parecia mais bonitão, nem de longe. Seu lábio tremia e na ausência do sorriso costumeiro, cheio de dentes, seu queixo parecia pequeno e fraco.
— M-muito bem. — Disse — Estarei... Estarei em minha sala me... me preparando. — E saiu
— Muito bem. — Disse a Profa McGonagall, cujas narinas tremiam — Com isso o tiramos do caminho. Os diretores das casas devem ir informar os alunos do que aconteceu. Digam que o Expresso de Hogwarts os levará para casa logo de manhã. Os demais, por favor, certifiquem-se de que nenhum aluno fique fora dos dormitórios.
Os professores se levantaram e saíram, um por um.
Meus olhos começaram a lacrimejar e me levantei junto com o Ron ainda apertando sua mão. Foi provavelmente o pior dia da minha vida, eu, Rony, Harry, Fred e George nos sentamos juntos a um canto da sala comunal da Gryffindor, incapazes de dizer qualquer coisa. Percy não estava presente. Fora despachar uma coruja para papai e mamãe, depois trancou-se no dormitório.
Nenhuma tarde jamais se arrastou tanto quanto essa, nem tampouco a Torre da Gryffindor esteve tão cheia e, no entanto, tão silenciosa. Próximo ao pôr do sol, Fred e George foram se deitar, porque não conseguiam continuar sentados.
— Ela sabia alguma coisa. — Disse Rony, sentado ao meu lado, falando pela primeira vez desde antes de entrarmos no armário da sala de professores — É por isso que foi sequestrada. Não era uma bobagem sobre o Percy, nada disso. Descobriu alguma coisa sobre a Câmara Secreta. Deve ter sido por isso que foi... — Rony esfregou os olhos com força — Quero dizer, ela era puro sangue. Não pode haver nenhum outro motivo.
Continuei com a cabeça encostada no ombro do meu irmão com pequenas lágrimas saindo, eu deveria ter cuidado de minha irmãzinha. Isso era minha culpa, com certeza era minha culpa. De onde estava pude ver o sol se pondo, vermelho-sangue, na linha do horizonte. Nunca me senti tão pior na vida. Se ao menos houvesse alguma coisa que pudéssemos fazer. Qualquer coisa.
— Rony... — Falei com a voz embargada — Você acha que pode haver alguma chance de ela não estar... sabe...
Ron desviou o olhar e suspirou fundo. Harry também parecia não saber o que dizer, eu sei bem o que eles devem estar pensando. Não há como Ginny ainda estar viva.
— Sabe de uma coisa? — Falou Rony — Acho que devíamos ir ver Lockhart. Contar a ele o que sabemos. Ele vai tentar entrar na Câmara. Podemos contar onde achamos que é, e avisar que tem um basilisco lá dentro.
Eu não conseguia pensar em mais nada para fazer, mas queria fazer alguma coisa, então eu e Harry concordamos. Os alunos da Gryffindor na sala estavam tão infelizes e sentiam tanta pena da minha família, que ninguém tentou nos impedir quando nos levantamos, atravessamos a sala e saímos pelo buraco do retrato.
Já anoitecia quando descemos à sala de Lockhart. Parecia haver muita atividade lá dentro. Ouvimos coisas sendo arrastadas, baques surdos e passos apressados. Harry bateu e fez-se um repentino silêncio na sala. Então abriu-se uma frestinha na porta e vimos o olho de Lockhart espreitando.
— Ah... Sr. Potter... Sr. Weasley e... Srtª Weasley... — Disse, abrindo um pouco mais a porta — Estou muito ocupado no momento, se puderem ser rápidos...
— Professor, temos umas informações para o senhor. — Disse Harry — Achamos que podem ajudá-lo.
— Hum... bem... não é tão... — A metade do rosto de Lockhart que podíamos ver parecia muito constrangida — Quero dizer... bem... muito bem...
Ele abriu a porta e nós entramos. Sua sala tinha sido quase completamente desmontada. Havia dois malões abertos no chão. Vestes verde-jade, lilás, azul-meia-noite, tinham sido apressadamente dobradas e guardadas em um deles; livros tinham sido enfiados de qualquer jeito no outro. As fotografias que cobriam as paredes agora estavam comprimidas em caixas sobre a escrivaninha.
— O senhor vai a algum lugar? — Perguntou Harry
— Hum, bem, vou. — Disse Lockhart, arrancando um pôster com a sua foto em tamanho natural das costas da porta, enquanto falava, e começando a enrolá-lo — Chamado urgente... inevitável... tenho que partir...
— E a minha irmã?! — Perguntei intrigada
— Bem, sobre isso... foi muito azar... — Respondeu Lockhart, evitando nos encarar enquanto puxava uma gaveta com força e começava a esvaziar o seu conteúdo em uma mochila — Ninguém lamenta mais do que eu...
— O senhor é o professor de Defesa Contra as Artes das Trevas! — Ron exclamou — Não pode ir embora agora! Não com todas essas artes das trevas em ação!
— Bem... devo dizer... quando aceitei o emprego... — Resmungou Lockhart, agora amontoando meias por cima das vestes — Nada na descrição da função... não era de esperar...
— O senhor quer dizer que está fugindo? — Disse Harry, incrédulo — Depois de tudo que fez nos seus livros...
— Os livros podem ser enganosos. — Disse Lockhart gentilmente
— Mas foi o senhor quem os escreveu! — Gritei
— Minha cara... — Disse Lockhart se endireitando e amarrando a cara para mim — Use o bom-senso. Meus livros não teriam vendido nem a metade se as pessoas não achassem que eu fiz todas aquelas coisas. Ninguém quer ler histórias de um velho bruxo feio da Armênia, mesmo que tenha salvado uma cidade dos lobisomens. Ele ficaria medonho na capa. Nem sabe se vestir. E a bruxa que afugentou o espírito agourento tinha lábio leporino. Quero dizer, convenhamos...
— Então o senhor só está recebendo crédito pelo que outros bruxos e bruxas fizeram? — Perguntou Harry, incrédulo
— Harry, Harry... — Disse Lockhart, sacudindo a cabeça com impaciência — A coisa não é tão simples assim. Há muito trabalho envolvido. Eu tive que procurar essas pessoas. Perguntar exatamente como conseguiram fazer o que fizeram. Depois tive que lançar um Feitiço da Memória para elas esquecerem o que fizeram. Se há uma coisa de que me orgulho é do meu Feitiço da Memória. Não, foi muito trabalhoso, Harry. Não é só autografar livros e tirar fotos de publicidade, sabe. Se você quer ser famoso, tem que estar preparado para dar duro.
Ele fechou os malões com estrondo e trancou-os.
— Vejamos... — Disse — Acho que é só. É. Só falta uma coisa. — E tirou a varinha e se virou para nós — Lamento muito, rapazes, mas tenho que lançar um Feitiço da Memória em vocês agora. Não posso permitir que saiam espalhando os meus segredos por aí. Eu jamais venderia outro livro...
Harry apanhou a própria varinha bem na hora. Lockhart mal erguera a sua, quando Harry berrou:
— Expelliarmus!
Eu olhei com fúria para Lockhart que foi atirado para trás, caiu por cima do malão; a varinha voou no ar; Rony agarrou-a e atirou-a pela janela.
— O senhor não devia ter deixado o Professor Snape nos ensinar isso. — Disse Harry furioso, chutando o malão de Lockhart para o lado
Lockhart ficou olhando para ele, parecendo frágil outra vez. Harry apontava a varinha em sua direção.
— Eu sempre soube que era um pateta idiota que não sabe fazer nada. Fala sério, arrumaram um palhaço pra nos dar aula esse ano! — Falei com irritação — Se algo acontecer com a minha irmã, eu não sei do que eu sou capaz!
— Não precisa humilhar. — Falou Lockhart com a voz fraca — O que querem que eu faça? Eu não sei onde fica a Câmara Secreta. Não há nada que eu possa fazer.
— O senhor está com sorte. — Disse Harry forçando Lockhart a se levantar com a varinha — Achamos que sabemos onde fica. E o que tem lá dentro. Vamos.
Saímos os quatro da sala, descemos as escadas mais próximas, e seguimos pelo corredor escuro em que as mensagens brilhavam na parede até a porta do banheiro da Myrtle Que Geme. Empurramos Lockhart na frente. Fiquei satisfeita de verificar que o professor tremia. Myrtle Que Geme estava sentada na caixa de água do último boxe.
— Ah, é você. — Disse quando viu Harry — O que é que você quer agora?
— Perguntar como foi que você morreu.
A atitude de Myrtle mudou na hora. Parecia que nunca alguém lhe fizera uma pergunta tão elogiosa.
— Aaaah, foi pavoroso. — Disse com satisfação — Aconteceu bem aqui. Morri aqui mesmo neste boxe. Me lembro tão bem! Eu tinha me escondido porque Olívia Hornby estava caçoando de mim por causa dos meus óculos. Tranquei a porta e fiquei chorando e então ouvi alguém entrar. Disseram uma coisa engraçada. Deve ter sido numa língua diferente, acho. Em todo o caso, o que me incomodou foi que era a voz de um garoto. Então destranquei a porta do boxe para mandar ele sair e ir usar o banheiro dos garotos e então... — Myrtle inchou fazendo-se de importante, o rosto brilhante — Morri.
— Como? — Perguntei
— Não faço ideia. — Disse Myrtle sussurrando — Só me lembro de ter visto dois olhos grandes e amarelos. Meu corpo inteiro foi engolfado e então me afastei flutuando... — Ela olhou para nós sonhadora — E então voltei. Estava decidida a assombrar Olívia Hornby, sabe. Ah, como ela lamentou ter-se rido dos meus óculos.
— Onde foi exatamente que você viu os olhos?
— Por ali — Respondeu apontando vagamente na direção da pia em frente ao boxe em que estava
Logo corremos para a pia. Lockhart ficou parado bem mais atrás, uma expressão de puro terror no rosto. Parecia uma pia comum. Examinamos cada centímetro, por dentro e por fora, inclusive os canos embaixo. E então eu vi: gravada ao lado de uma das torneiras de cobre havia uma cobrinha mínima.
— Essa torneira nunca funcionou. — Disse Myrtle animada, quando eu tentei abrir
— Harry. — Disse Rony — Diga alguma coisa. Alguma coisa em língua de cobra.
— Mas... — Harry se esforçou, fixou o olhar na gravação minúscula, tentando imaginar que era real — Abra.
Logo olhou para mim e Rony, que sacudimos a cabeça.
— Nossa língua.
Harry tornou a olhar para a cobra e então um estranho assobio lhe escapara da boca e na mesma hora a torneira brilhou com uma luz branca e começou a girar. No segundo seguinte, a pia começou a se deslocar; a pia, na realidade, sumiu de vista, deixando um grande cano exposto, um cano largo o suficiente para um homem escorregar por dentro dele. Eu e Ron soltamos uma exclamação ao ver.
— Vou descer. — Harry anunciou
— Eu também. — Eu e Rony falamos
Houve uma pausa.
— Bem, parece que vocês não precisam de mim — Disse Lockhart com uma sombra do seu antigo sorriso — Eu vou...
E levou a mão à maçaneta da porta, mas eu, Rony e Harry apontamos as varinhas para ele.
— Você pode descer primeiro. — Rosnou Rony
— Concordo plenamente. — Falei séria
De rosto lívido e sem varinha, Lockhart se aproximou da abertura.
— Rapazes. — Disse com a voz fraca — Rapazes, que bem isto vai trazer?
— EU NÃO SOU UM RAPAZ! — Rosnei irritada e lhe dei um empurrão, e ele desapareceu de vista
Os meninos me olharam rapidamente e vendo que eu estava visivelmente irritada, não falaram nada. Harry seguiu-o em silêncio. Baixou o corpo lentamente para dentro do cano e se soltou. Logo eu fui e Ron veio logo em seguida. Foi como se eu me precipitasse por um escorrega escuro, viscoso e sem fim. Vi outros canos saindo para todas as direções, mas nenhum tão largo quanto aquele, que virava e dobrava, sempre e ingrememente para baixo, e percebi que estava descendo cada vez mais fundo sob a escola, para além das masmorras mais fundas. Atrás eu ouvia Rony, batendo-se ligeiramente na curvas.
E então, quando eu começava a me preocupar com o que aconteceria quando chegasse ao chão, o cano nivelou e eu foi atirada pela extremidade com um baque aquoso, e aterrissei no chão úmido de um túnel de pedra às escuras, suficientemente amplo para a pessoa ficar de pé.
Lockhart estava se levantando um pouco adiante, coberto de limo e branco como um fantasma, Harry já estava de pé olhando ao redor, eu me afastei um pouco para um lado enquanto Rony também saía chispando do cano.
— Devemos estar quilômetros abaixo da escola. — Disse Harry, sua voz ecoando no túnel escuro
— Provavelmente debaixo do lago. — Sugeriu Rony, apertando os olhos para enxergar as paredes escuras e limosas
Nós quatro nos viramos para encarar a escuridão à frente.
— Lumus! — Murmurei para minha varinha que acendeu, Harry fez o mesmo com a dele
— Vamos. — Disse ele
E lá se fomos nós, nossos passos chapinhando ruidosamente no chão molhado. O túnel era tão escuro que só conseguiamos ver uma pequena distância à frente. Nossas sombras nas paredes molhadas pareciam monstruosas à luz das varinhas.
— Lembrem-se. — Disse Harry baixinho enquanto avançavamos com cautela — A qualquer sinal de movimento, fechem os olhos imediatamente...
Mas o túnel estava silencioso como um túmulo, e o primeiro som inesperado que ouvimos foi o ruído de alguma coisa sendo esmagada quando Rony pisou em alguma coisa que descobrimos ser um crânio de rato. Harry baixou a varinha para olhar o chão e eu fiz o mesmo, logo vimos que ele se encontrava coalhado de ossos de pequenos animais. Tentando por tudo não imaginar que aspecto teria Ginny se a encontrassemos, à frente, viramos uma curva escura do túnel.
— Tem alguma coisa ali... — Disse Rony rouco, agarrando o meu braço
Nos imobilizamos, observando. Eu conseguia apenas ver o contorno de uma coisa enorme e curvilínea, deitada atravessada no túnel. A coisa não se mexia.
— Talvez esteja dormindo. — Sussurrou Harry, olhando para nós
Lockhart tampava os olhos com as mãos e eu tentava me manter forte mesmo com o coração disparado. Harry tornou a se virar para olhar a coisa. Muito devagarinho, com os olhos o mais apertados possível, mas ainda vendo, ele
avançou aos poucos com a varinha erguida.
A luz deslizou pela pele de uma cobra gigantesca, colorida e venenosa, que se encontrava enroscada e oca no chão do túnel. O bicho que se desfizera dela devia ter no mínimo uns seis metros de comprimento.
— Droga. — Xingou Rony em voz baixa
Ouvimos então um movimento súbito às costas. Os joelhos de Lockhart tinham cedido.
— Levante-se! — Disse Rony com rispidez, apontando a varinha para Lockhart
O professor se levantou – em seguida atirou-se contra Rony, derrubando-o no chão. Eu dei um salto à frente, mas demasiado tarde – Lockhart já se erguia, ofegante, a varinha de Rony na mão e um sorriso radioso novamente no rosto.
— A aventura termina aqui, meus caros. Vou levar um pedaço dessa pele de volta à escola, dizer que cheguei tarde demais para salvar a garota e que vocês três enlouqueceram tragicamente ao verem o corpo dela mutilado, digam adeus às suas memórias!
Eu o olhava com fúria enquanto ele erguia a varinha de Rony, emendada com fita adesiva, acima da cabeça e gritou:
— Obliviate!
A varinha explodiu com a força de uma pequena bomba. Eu ergui os braços para o alto e fugi puxando junto o meu irmão, tentando escapar do alcance dos grandes pedaços do teto do túnel que caíam com estrondo no chão. No momento seguinte, vimos que éramos só nós dois e o idiota do Lockart caído no chão enquanto contemplavamos uma parede maciça formada pelos destroços.
— Rony! Rox! — Harry gritou e sua voz parecia vim do outro lado — Vocês estão bem? Rony! Rox!
— Estamos aqui. — Respondeu a voz abafada de Rony — Sim, estamos bem, mas esse bosta aqui não está, a varinha acertou nele... — Acrescentou chutando as canelas de Lockart
— E agora, o que fazemos? — Perguntei desesperada — Não podemos passar, vai levar séculos...
Olhei para o teto do túnel e vi que tinham aparecido nele enormes rachaduras. Eu nunca tentara cortar, com auxílio da magia, nada tão grande como essas pedras, e agora não parecia uma boa hora para tentar – e se o túnel inteiro desabasse?
Ron parecia irritado e Lockart continuava a se debater como um idiota no chão olhando para o teto, com a maior cara de lesado. Estavamos perdendo tempo e tudo por conta daquele imbecil. Ginny já fora trazida para a Câmara Secreta havia horas. Eu sabia bem que havia apenas uma coisa a fazer.
— Esperem aí. — Harry gritou — Esperem com Lockhart. Eu vou continuar... se eu não voltar dentro de uma hora...
Houve uma pausa cheia de significação.
— Vamos tentar afastar umas pedras. — Disse Rony, que parecia estar querendo manter a voz firme
— Sim Harry, Para você poder... poder passar na volta. e...
— Vejo vocês daqui a pouco. — Disse Harry com a voz um pouco trêmula
Eu e Ron nos entreolhamos apreensivos e com medo. Só esperava que realmente daqui a pouco eu veria Harry e a minha irmãzinha. Começamos a batalhar para tentar tirar as pedras enquanto Lockart continuava caído.
— Tudo culpa desse idiota! Tudo culpa desse... ahhhh! — Exclamei
— Tudo culpa dele! — Ron concordou irritado
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