
𝑳𝒂𝒗𝒂𝒏𝒅𝒂 𝒆 𝒓𝒐𝒔𝒂𝒔
Quando você perde o marido, fica viúva. Quando você perde seus pais, você é órfão. Mas não há nome para alguém que perdeu sua irmã. E Dahlia havia perdido três irmãs, duas ligadas pelo sangue, mas uma ligada pela alma. Tudo o que lhe restou delas foi um inabalável sentimento de culpa e um colar de dahlia dourado.
A cor dourada parecia ter perdido o brilho quando foi devolvido a Dahlia, anos de má sorte cobrando seu preço no item que antes era um tesouro. Ela mal suportava olhar para ele e o guardou em uma gaveta o mais rápido que pôde. Parecia um presságio de morte até mesmo estar associada a ele, tendo sido usado por Cove e Lavender quando tiveram seus fins cruéis. Como um amuleto amaldiçoado que traz sofrimento sem fim para quem o usa. Dahlia certamente já havia sofrido bastante sem a ajuda do colar, mas o pior ainda estava por vir. Agora ela tinha que viver com as consequências, e nem mesmo Alaric poderia salvá-la de si mesma.
A simples visão de lavanda e rosas a fazia entrar em pânico, lembrando-a da morte de suas irmãs mais novas. Chuveiros estavam fora de questão, pois seu medo intenso de se afogar, devido ao trauma de sua quase morte, se intensificou após a inundação nos Jogos de Annie. Até mesmo banhos rasos se tornaram uma raridade, pois apenas o som da água escorrendo a deixava tensa, na expectativa de uma inundação iminente. Esses medos eram irracionais, Dahlia sabia disso, mas ela estava perdida em sua própria loucura. Nada poderia aliviar sua mente.
─ Flor ─ Alaric chama suavemente no quarto sem ar, mal conseguindo ver a silhueta de Dahlia na escuridão. As cortinas estavam bem fechadas, deixando pouco espaço para a passagem de luz, enquanto a garota se enterrava sob as inúmeras cobertas da cama. Ela estava tentando se esconder de um mundo cruel que gostava de infligir dor a ela, mas, ao fazer isso, ficou presa com sua culpa inevitável. Não havia como se desligar de sua própria mente.─ Você precisa se levantar.
Ele sabia que ela o tinha ouvido, ela sempre ouvia. Mas ele não obteve resposta. Nenhum sinal de que ela o tivesse reconhecido. Era como se ela tivesse se tornado morta para o mundo. Não estava vivendo, apenas existindo. Até isso parecia drenar toda a sua energia.
─ Flor? ─ Ele tenta novamente, com mais firmeza desta vez, mas continua sem resposta. Com um pequeno suspiro, Alaric acende o interruptor de luz, enchendo o quarto com a claridade necessária. Dahlia se levantou da cama, girando a cabeça e lançando um olhar assassino para Alaric. ─ Seu olhar de Dahlia Negra pode aterrorizar o Capitólio, mas não funciona comigo, Flor.─O homem zomba desafiadoramente, caminhando mais para dentro do quarto bagunçado enquanto o olhar dela segue cada movimento dele.─ Você precisa se levantar.
O tom de insistência de Alaric surpreende Dahlia, diferente de seu habitual incômodo.
─ Por quê? ─ Ela questiona com tristeza, com a garganta seca por falta de uso e as pálpebras pesadas de exaustão. Dessa vez, é Dahlia que não recebe resposta. O silêncio de Alaric a tira de seu estado atordoado, seu corpo se retesa diante da expressão grave e sombria no rosto dele. ─ O que você não está me dizendo? ─Ela pergunta com severidade enquanto Alaric se concentra em qualquer coisa, menos em seu olhar penetrante. Depois de alguns momentos de evasão, Dahlia se cansa desse jogo de gato e rato e rosna furiosamente─ Apenas cuspa.
─ Snow tem outro cliente para você.─ Alaric diz, com os olhos fechados em preparação para a inevitável explosão de Dahlia. Recentemente, ela estava se provocando com facilidade, ficando irritada e com raiva rápida. Então, quando ela não explodiu imediatamente, ele abriu um olho apenas para verificar se ela ainda estava consciente.
Ela estava de fato consciente e fervendo furiosamente. Seus lábios se curvaram em um rosnado e suas narinas se dilatavam a cada respiração, como um dragão se preparando para soltar seu fogo. Os olhos escuros, pelos quais ela era tão conhecida, pareciam ter se estreitado em fendas e estavam girando em um perigoso inferno de raiva. Justamente quando ela achava que Snow não aguentaria mais nada dela, ele encontrava outra maneira de aumentar o tormento.
─ Não tenho mais família para ele ameaçar ─ela murmura amargamente com os dentes cerrados, com a mandíbula fazendo barulho enquanto balança a cabeça em descrença.─ Mas ele ainda detém todo o poder.─Porque Snow sabe que o amor de Dahlia não terminou com sua família e, enquanto ela tiver essas pessoas em seu coração, ele terá poder sobre ela.
Ela não sabe se conseguirá encontrar energia para lutar mais, uma parte dela só deseja que toda essa dor acabe. Mas se ela ceder, Snow vencerá e o homem que ela ama sofrerá ainda mais. Por ele, ela perseverará. Por Finnick, ela sairá de sua depressão. Por Finn, ela enfrentaria as águas mais traiçoeiras.
─ Eu vou me levantar.
Ela faria isso por ele.
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Dahlia ficou surpresa por Snow ter lhe confiado a visita de mais clientes depois de ter matado o último, mas tudo fez sentido quando ela conheceu sua última vítima. Ele era um fanático pelos Jogos Vorazes, gago e desajeitado, cujo fascínio incômodo pela sua suposta "loucura assassina" era, no mínimo, perturbador. Ela, a contragosto, atendeu a seus desejos sexuais perturbadores pelo tempo que pôde aguentar, mas chegou ao limite quando ele pediu para recriar sua morte favorita dos Jogos. O único resultado positivo da visita foi um belo par de copos de uísque de cristal lapidado que seu cliente certamente sentiria falta.
Ao voltar para seu apartamento no Capitólio com os copos tilintando em suas mãos, uma onda de alívio inundou sua mente quando ela foi recebida pelo espaço familiar. Ao contrário do resto do Capitólio, que se afogava em um arco-íris de cores, ela havia escolhido tons neutros e calmos para decorar seus quartos. Essa era sua maneira de mostrar que essas pessoas não poderiam mudá-la. Era sua casa longe de casa, um esconderijo no ninho de víboras.
─ Al! ─Ela grita pelo apartamento para o homem que, atualmente, nunca permite que ela vá ao Capitólio sem ele.─ Estou de volta! ─Ela ouve um grunhido de resposta do outro quarto e rapidamente deduz que o acordou de um cochilo.─ E eu lhe trouxe um presente... Um presente roubado.
─ Ooh! ─Ele suspira de prazer e ouve-se uma briga quando ele se levanta ansiosamente. Dahlia balança a cabeça diante da atitude infantil dele e deixa os copos no balcão da cozinha para que ele os encontre antes de ir para a sala de estar.
Tentando se distrair dos eventos desagradáveis que já havia vivenciado durante a viagem, ela imediatamente pega o controle remoto para entorpecer sua mente com os desagradáveis reality shows da Capitol. No entanto, um toque de cor desconhecido na mesa de vidro chama sua atenção. É uma sacola de presente vermelha que está inocentemente à sua frente, com um envelope encostado nela, com o nome dela rabiscado em uma caligrafia ondulada. Sua curiosidade leva a melhor e Dahlia pega o envelope com seus dedos trêmulos. A única coisa que está dentro é um bilhete dobrado e o que ela lê lhe causa arrepios na espinha.
─ Como uma flor murcha rapidamente quando todas as suas pétalas foram arrancadas.
Ela teme o que pode encontrar lá dentro. Seu coração bate descontroladamente dentro do peito como uma fera furiosa lutando para escapar da jaula, como se soubesse de algo que ela não sabe. Ao olhar para dentro, seu estômago se revira horrivelmente e ela sente uma súbita vontade de vomitar. Uma única flor de dália negra aninhada em um canteiro de pétalas murchas... Lavanda e rosas.
Dahlia sabia que essa mensagem era uma provocação de Snow. A flor era uma representação dela, sozinha, mas cercada pelas cinzas de suas irmãs. Ele arrancou todas as pétalas de sua árvore genealógica e agora pode vê-la definhar também.
Antes que ela percebesse, sua respiração aumentou rapidamente enquanto sua mente a levava para o lugar mais sombrio. Os fortes aromas florais dominam seus sentidos enquanto seus olhos se fixam naquelas pétalas murchas e moribundas. Ela se lembra de como suas irmãs sofreram, de como a inocência delas foi roubada antes que suas vidas fossem tiradas também.
A culpa foi dela.
─ Flor.
Por que ela não as salvou?
─ Flor, por favor.
Elas precisavam dela e ela as decepcionou.
─ Flor, por favor. Você precisa respirar.─As súplicas chorosas de Alaric caíram em ouvidos surdos quando o corpo de Dahlia se fechou diante de seus olhos. Seu peito subia e descia enquanto ela hiperventilava, seus olhos olhavam para a distância, mas não viam nada. Ela havia tido muitos desses episódios nos últimos meses, mas nunca um tão grave quanto esse. Alaric se assustou ao vê-la tão genuinamente abalada. E ele não sabia se conseguiria consertá-la dessa vez. Ajoelhado em frente à estrutura trêmula dela, sua mão se aproxima do ombro dela em uma tentativa de acalmá-la.─ Flor...
─ Não! ─Ela gritou, atacando sua mão e se afastando dele.─ Saia daqui! ─ Alaric segue hesitante, tentando mais uma vez estabilizá-la, mas ela o chuta para longe. ─ Pare com isso! Fique longe de mim! Eu os matei...Eu os matei.─Parece que alguém a está sufocando, espremendo todo o ar de seus pulmões com um aperto de ferro. Mas não importa o quanto ela se debata, o agressor invisível não a solta. Ela jura que vê suas irmãs acima dela, olhando fixamente para baixo, sem emoção, enquanto a observam sofrer como elas sofreram, querendo que ela sinta cada grama de dor que elas passaram por causa dela.
─ Sinto muito! Eu sinto muito. A culpa é toda minha! ─Ela se desculpa desesperadamente, com a garganta seca e rouca enquanto clama por eles.─ Lav, Rosie... Por favor! Eu sinto muito. Eu sinto muito!.
Sua culpa.
Alaric sabe que ela está sendo assombrada por fantasmas, demônios que brincam com seu cérebro para fazer com que seus piores medos se tornem realidade. Ele sabe melhor do que ninguém que, às vezes, as lembranças podem ser o pior tipo de tortura. E ele não pode simplesmente ficar aqui e deixá-la enfrentar isso sozinha. Mas ela não aceitará sua ajuda, então ele terá que encontrar a solução em outro lugar. Ele sabe exatamente o que fazer, aonde ir... Quem encontrar.
Dahlia mal percebe quando Alaric deixa o apartamento, ocupada demais implorando perdão às suas irmãs fantasmas. Soluçando incontrolavelmente, ela se enrola em uma bola para se esconder dos fantasmas que a cercam. Os rostos daqueles que ela matou inundam sua mente enquanto ela fecha os olhos. Homenagens, família, amigos... Todos eles começaram a sibilar em seus ouvidos.
Sua culpa.
Sua culpa.
Sua culpa.
Cantando em sua mente como uma melodia horrível, ela bate com as mãos nos ouvidos para bloquear os sons. Mas tudo está em sua cabeça. Ela nunca consegue escapar deles. As provocações deles ficam cada vez mais altas até que ela não consegue nem ouvir a própria respiração ofegante. Balançando a cabeça profusamente, ela geme pateticamente e sussurra repetidamente:
─ Não, não, não, não, não, não. Vá embora! Vá embora! Me deixe em paz!.
Quando Alaric retorna, ele a encontra balançando para frente e para trás, murmurando incoerentemente sob sua respiração. Era como se ela estivesse possuída, vendo e ouvindo coisas que ninguém mais via. Ele odiava Snow por ter destruído uma alma tão forte e preciosa. Mas ódio era uma palavra branda para o que Finnick Odair sentia por aquele homem. Ele desprezava Snow.
─ Oh, minha florzinha ─ele suspira suavemente, com o coração partido pelo estado em que ela se encontra.─ O que eles fizeram com você?.
Quando Alaric irrompeu pela porta de Finnick momentos antes, ele só conseguiu dizer o nome de Dahlia antes que o garoto saísse correndo do quarto. Ele nunca havia se movido tão rápido em sua vida, mas agora que a está vendo desmoronar, ele está congelado no lugar. Como ele pode protegê-la de si mesma? Ele não pode, é impossível... Mas ele desafiaria todas as probabilidades por ela.
Finnick estava ao seu lado em um instante, gentilmente afastando suas mãos dos ouvidos. Ela se defendeu ferozmente, como ele esperava que ela fizesse, tentando arrancar os braços do controle dele. Mas o amor de Finnick por ela era mais forte do que as palavras de ódio que ecoavam em sua cabeça. Ele não se importava com o quanto ela o machucasse, ele não a deixaria ir.
─ Estou aqui, florzinha.─Ele murmura com ternura, manobrando o corpo tenso e contorcido dela para que ela repouse as costas em seu peito.─ Estou aqui, amor.
─ Finn? ─Ela sussurra fracamente, parando de se debater enquanto seus olhos se iluminam com um lampejo de esperança. Por um momento, ela pensou que era apenas sua mente pregando peças nela novamente. Apenas outra voz para provocá-la. Mas os braços de bronze envolvendo seu corpo lhe trouxeram uma sensação de segurança que seu cérebro jamais seria capaz de imitar. Ele estava aqui com ela, para ela.
─ Sou eu. Estou aqui.─Ele a tranquiliza suavemente, dando um beijo carinhoso em seus cabelos enquanto ela se derrete em seu abraço. As mãos trêmulas dela se agarram aos antebraços dele, mas a respiração ainda sai da boca dela em arfadas irregulares.─ Respire comigo. ─Ele a instrui, mas a garota balança a cabeça com olhos arregalados e em pânico.─ Sim, você pode. Você tem sido muito forte, Lia. Apenas aguente e se concentre em mim. Só eu, amor. ─Desta vez, Dahlia ouve suas palavras e olha fixamente para os olhos de Finnick. Ele imediatamente percebe uma diferença na respiração dela, com as respirações ofegantes se transformando em pequenos suspiros. Um belo sorriso se espalha por seus lábios enquanto ele a elogia─ Essa é a minha garota. Continue respirando por mim.
Por ele... Ela poderia fazer isso por ele.
Depois de mais alguns minutos de respiração constante e do incentivo caloroso de Finnick, Dahlia finalmente saiu do pior de seu ataque de pânico. Sua respiração ainda estava difícil e seu corpo ainda estava tremendo, mas ela havia relaxado no abraço de Finnick e seus olhos estavam caídos de cansaço.
─ Vamos levá-la para a cama, florzinha.─ Finnick murmura, enganchando o braço sob a dobra dos joelhos dela e se levantando. Dahlia aconchega o rosto em seu pescoço enquanto ele a carrega com segurança nos braços em estilo de noiva. Alaric envia ao garoto um sorriso discreto e um aceno de agradecimento ao passar por ele, mas pode ver a fúria ardendo em seus olhos pelo fato de Dahlia ter passado por essa terrível provação.─ Tire essa maldita bolsa da vista dela.─Ele cuspiu asperamente, querendo destruir o item que lhe causou tanta dor.
Deixando Alaric com suas ordens, Finnick carrega Dahlia para o quarto dela, sentindo como se tivesse o mundo inteiro em seus braços. Ele a deita na cama com cuidado, com o coração se derretendo com a maneira adorável com que ela se aconchega nas cobertas. Depois de aconchegá-la e dar um beijo de despedida em sua testa, ele foi se despedir, sabendo que ela precisava de um descanso tranquilo para combater o cansaço. Mas sua retirada é interrompida por uma mão frágil que se agarra à sua.
─ Por favor ─ ela sussurra fracamente, com os olhos mal abertos e o rosto esmagado em um travesseiro.─ Não me deixe.
O olhar amoroso de Finnick se suaviza mais do que ele jamais imaginou que poderia diante do medo na voz dela. Ela estava tão aterrorizada que ele se tornaria um daqueles fantasmas sibilando em seu ouvido. Ele foi a razão pela qual eles foram silenciados em primeiro lugar, ela nunca quis que ele se juntasse a eles. E ele faria tudo o que estivesse ao seu alcance para protegê-la disso. Então, ele se enfia debaixo das cobertas para se juntar a ela, como já fez muitas vezes antes, e envolve o corpo dela em seus braços. Com um breve beijo em sua bochecha, ele murmura em seu ouvido.
─ Eu nunca vou deixar você, florzinha.
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