Balões são prisioneiros🎈
"Você vai acabar com a minha dor?
Você vai tirar a minha vida?
Você vai me fazer sangrar?
Você vai me pendurar para secar?
Você vai tomar a minha alma na chuva da meia-noite?
Enquanto eu estou caindo aos pedaços
Enquanto eu estou
Enlouquecendo"
| Para melhor leitura clique sobre a música na mídia |
***
Robert segurava minha mão enquanto eu tentava parar de tremer. Minha bochecha ardia, como se outra facada tivesse a cortado outra vez.
— Muito bem, Alice. — Robert aperta minha mão minimamente. Um sorriso triste está desenhado em seu rosto. — Quer saber o que aconteceu quando apagou?
— Ele já me contou. — minha voz treme.
— Não, Alice, ninguém te contou o que aconteceu. — Robert se afasta minimamente.
Meus olhos são capturados novamente para o fundo da sala. Dedos silenciosos forçam o tubo de aquecimento, as mãos pálidas agarram as grades com força. Um barulho mínimo passa pela sala.
— Minha filha queria visitar você. — volto minha atenção para Robert.
— Sua filha?
— Sim. — ele sorri. — Espero que não fique chateada, mas contei para ela sobre você. Robin, minha filha mais nova, gostaria de te conhecer.
— Eu queria ver minha irmã. — soluço.
O rosto do psiquiatra se torna sombrio.
— Já falamos sobre isso. Alice, é impossível. — pela primeira vez, a voz de Robert treme.
— Se eu vejo ele, por que não posso vê-las também? Por quê? Por quê? POR QUÊ? POR QUÊ?
— Respire, vamos, conte comigo! Um... dois... três. Isso...
Fiz como o psiquiatra mandou, fechei meus olhos por longos segundos e contei.
— Eu queria vê-la. — repito agora mais calma.
— Alice, sua família foi assassinada. Hoje faz vinte e quatro dias. Foram encontrados por um vizinho de vocês. EStavam mortos, os corpos haviam sido abertos. Balões vazios foram encontrados nos lugares dos órgãos. Ainda estamos procurando o coração da sua irmã, e o pulmão do seu pai... eu sei que é cruel te dizer isso, mas é exatamente por esse motivo que preciso que me ajude a achá-lo.
— Quando você apagou — Robert continua. — Taehyung ligou a van. Os policiais à paisana abriram a porta do veículo ao mesmo tempo que o garoto fugia pelo outro lado. Kim Namjoon foi o que ficou e ligou para a ambulância enquanto Jung Hoseok correu atrás do seu sequestrador. Infelizmente, para o nosso azar, Taehyung é bom em fugas e logo foi perdido de vista. Você foi encaminhada ao Seul's hospital, onde foi atendida às pressas.
— Sua família foi contatada. Fazia dois dias que te procuravam. Sua mãe quase não saiu do seu lado no hospital, mas após ter uma crise alérgica ao purificador de ar da sala, foi encaminhada para casa, de onde deveria se cuidar. Infelizmente, em algum momento, o pior aconteceu. Lamento mais uma vez. Tentamos entrar em contato com seus outros parentes, mas nenhum se mostrou disponível para vir cuidar de você, alegando terem medo de acontecer algo semelhante.
As grades foram soltas. Uma mão pálida acenou para mim. Tinha longos dedos que se moviam silenciosamente. A palma estava suja de poeira, ganhando uma coloração mais escura, quase preta.
— Alice, faz ideia para onde Taehyung possa ter ido? — questionou o psiquiatra.
É só minha imaginação... estresse pós-traumático. Estou inventando, aquilo no tubo de aquecimento, todas as visitas no meu quarto... você imagina isso, você tem medo disso, não é real, nada aqui é...
— Alice? — olho assustada para Robert. — Taehyung não te disse mais nada? Isso foi tudo?
Um balão vermelho sai flutuando de dentro do tubo negro. Enchido com gás hélio, ele flutua até ficar imóvel contra o teto.
— Assim que disser, eu irei para a delegacia e entregarei seu relato. O FBI ficará encarregado de investigar o Park's Circus. Prometo que dará tudo certo!
Olho para o relógio na parede. 19h:30. É a hora. Pode ser só coincidência? Eu não o vejo? Ele não existe? Estou imaginando? Mas por quê aquele balão no teto é tão real? E por quê não tenho coragem de pedir que Robert olhe?
— Voltarei amanhã com Robin, se estiver tudo bem pra você. Pessoalmente acho que vai adorá-la. — Robert agita a mão em frente aos meus olhos.
— Sei que está cansada. — ele continua, indiferente ao ar gelada que agora circula pela sala. — Hoje trabalhamos muito, produzimos muito! Não sabe o quão feliz eu estou por ter finalmente falado comigo.
Um braço sai de dentro do tubo. Assim como a palma da mão, está sujo de poeira. O leve som de algo sendo arrastado preenche o quarto. Olho para Robert, porém este está entretido em seu próprio celular. Outro braço sai de dentro do tubo, e mais uma vez o barulho seco de algo se arrastando. Não algo, alguém.
— Melanie? Estou terminando aqui... isso. — Robert fala ao telefone. Lá no fundo, o braço ergue a mão, três dedos sujos e poeirentos estão levantados... uma contagem.
Três...
Dois...
Um...
As luzes piscam duas vezes e se apagam por completo. Quase posso ouvir as lâmpadas do corredor fazerem o mesmo. De alguma forma a sala parece mais silenciosa e fria.
— Não se preocupe, os geradores serão ligados em alguns minutos. — diz Robert ao perceber minha agitação. Com a lanterna do celular apontada para o chão, consigo ver apenas seu contorno.
— Tem algo que não contei sobre o Taehyung. — um frio gela a minha espinha. Uma massa escura passa a se aproximar lentamente da cadeira de Robert.
Antes que se aproxime mais, sinto o cheiro. Pipoca, açúcar queimado e ao respirar mais fundo... algo azedo.
— O que não me contou? — Robert levanta a lanterna. A sombra em suas costas se aproxima lentamente e em silêncio.
— O número que Taehyung fazia no show. — a sombra para a poucos centímetros de Robert, que tem sua total atenção em mim.
— Prossiga. — ele me encoraja.
— Taehyung era contorcionista. — Robert faz um leve aceno com a cabeça. — Taehyung prometeu que me faria amar balões. Um Kim nunca descumpre uma promessa. — Robert abre a boca, mas o interrompo. — Desculpa, eu sinto muito mesmo, mas o senhor não vai voltar para casa.
— O que quer dizer? — mesmo no escuro, pude ver as sobrancelhas erguidas do psiquiatra.
— Taehyung veio fazer Alice amar balões. — a voz grave do garoto se pronuncia. O sussurro se espalha pela sala inteira.
Robert vira assustado. Antes que possa reagir, a faca de Taehyung se enterra em sua garganta com total violência. O psiquiatra cai no chão enquanto o sangue espirra em cima da luz de seu celular.
Ainda sentada, com medo demais para me mover, observo o psiquiatra se contorcer enquanto tenta inutilmente estancar o próprio sangue com as mãos.
Taehyung permanece observando a cena calmamente. Naquele breu quase que total, consigo ver o sangue respingar no chão enquanto escorrega lentamente pela faca.
Quando Robert finalmente parou de se mexer, Taehyung olhou para mim. Eu não o enxergava bem, apenas sua sombra um pouco difusa pela minha mente perturbada.
Acorde!
Acorde!
Acorde!
É sua imaginação, ele não existe, estresse pós-traumático...
— Eu amo balões, Alice. Você ama balões, não ama? Você e eu somos parecidos, não somos? — Taehyung se aproximava de mim. Por que ele parecia tão real? Por que eu não acordava?
O garoto se abaixou até ficar na minha altura. Seu rosto aproximou-se lentamente do meu, até eu poder ver a negritude e o brilho maligno de seus olhos.
— Taehyung veio de novo, às 19h:30, como todos os outros dias. Sempre pontual. Aprendi isso com o papai. — ele sorri tocando a faixa que cobre minha boca cortada. — Tenho um novo lugar. Eu preparei tudo só pra nós, Alice. Você vai amar balões lá!
— Estudei as tubulações por muito tempo. — ele passa a faca na minha perna, o sangue frio de Robert gruda na minha pele. — No final foi fácil te visitar, os tubos são estreitos, mas sou um contorcionista! A mamãe dizia que o melhor! Cortar a energia também foi fácil. Usei minha faca nova, está vendo? Peguei na sua casa quando entrei lá pela noite.
— Sua casa é tão escura, Alice! Não se preocupe, ninguém sofreu tanto. Sua irmã foi a primeira, depois seu pai e por último sua mãe. Acho que ela estava doente, fungava o tempo todo. Fiz um favor pra ela, certo? — ele levanta e pega o celular de Robert do chão. Fecho meus olhos quando a luz intensa é apontada para meu rosto. — Agora não tem ninguém pra impedir você de amar balões. Alice, seja uma boa menina e me siga.
Taehyung estende a mão para mim. Minha mente está uma bagunça. Eu deveria gritar, mas algo me diz que ele me calaria. Eu deveria correr, mas algo me diz que ele é mais rápido. Eu deveria matá-lo, mas algo me diz que ele me mataria primeiro. Eu deveria me esconder, mas ele sempre vai me achar.
Meus dedos gélidos se fecham em sua mão suja e quente.
Eu odeio balões...
Taehyung me guia até a porta da sala. Suas mãos seguram a minha com força, com medo que eu escape. Mas acho que nunca vou conseguir escapar.
— Cante comigo, Alice. — pede baixinho.
— Balões, balões, balões, voam sem parar, chame a mamãe e o papai e vamos todos brincar, eu tenho verde, vermelho e laranja, mas prefiro as amarelas porque me lembram as bananas, olhe quantas cores, não é divertido? Venha rir comigo e com o palhaço meu amigo. — terminamos a música no mesmo momento. Consigo ver o sorriso do garoto.
Taehyung abre a porta da sala. Observo o corredor silencioso e escuro, poucos sons são ouvidos por mim. Não está vazio, mas parece. Como se todos tivessem ido embora para deixar que ele me leve. Como se todos quisessem que eu fosse com ele.
— Taehyung. — o chamo.
Seu pescoço vira rapidamente. Parece surpreso, afinal, é a primeira vez que dirijo-me a ele pelo seu próprio nome.
— Eu quero amar balões. — digo com um tremor na voz.
O sorriso no rosto do garoto se rasga de um lado para o outro. Seus olhos alucinados possuem um brilho diferente.
— Você vai. — ele sorri.
Fim
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro