
ᥫ᭡ 034
ABRO A PORTA DO MEU QUARTO correndo e empurro a janela para baixo na mesma velocidade. Sento-me na cama e abraço minhas próprias pernas pensando no que aconteceu pouco tempo atrás.
Sinto uma angústia terrível e algo rasgando a minha garganta. Eu queria que as coisas fossem mais simples, mas talvez eu que tenha estragado tudo nos primórdios. "Se eu não tivesse me envolvido com Chan", "Se eu tivesse conseguido me abrir com ele antes", estou sempre me rodeando com esses "se", estou farta disso.
Na minha agonia, escuto um barulho chamar a minha atenção. Ele vem da janela. Me aproximo com cuidado e noto algumas pedrinhas sendo arremessadas, há uma que até consegue passar pelo pequeno espaço não fechado. Ergo o tronco para poder observar tudo melhor e vejo Hyunjin lá embaixo.
— Jiyoon! — escuto os seus sussurros. — Jiyoon-ah, a gente precisa conversar.
Eu queria que as coisas não tivessem se tornado tão complicadas. Queria que você pudesse entender os meus motivos para fazer o que farei agora, mas isso só vai te deixar mais magoado. Vai levar um tempo para que você me entenda, Hyunjin. Estou fazendo isso para o seu bem.
— Eu estou te vendo — ele diz.
Me escondo mais ao lado, evito que ele possa continuar me enxergando. Parte disso porquê também não quero olhar para ele. Já me sinto cruel de mais por o ignorar.
Eu escuto sua voz e por um momento fraquejo, penso em ir até ele, mas não devo. Tento me colocar no lugar dele, em como sentiria minha confiança sendo quebrada e no quanto isso me magoaria. Será que ele conseguirá se colocar no meu lugar também, entender as minhas razões para fazer isso?
— Jiyoon, se eu for embora sem te ver, isso quer dizer que você não quer conversar comigo. Então quando eu for, não irei mais procurá-la.
Eu não posso abrir para você hoje. Me desculpe Hyunjin, mas o que vou fazer agora é para o seu bem. Continuo repetindo como uma nota mental.
Afasto-me da janela, fecho os olhos e as cortinas. O barulho se cessa e ele percebe que não irei dar a passagem hoje. Hyunjin vai embora e eu vou para a minha cama chorar, pego o celular e disco o número desejado. Ao ser atendida, eu digo:
— Alô? Eu gostaria de fazer uma denúncia.
(•••)
Estar na escola durante as sextas-feiras é um porre. Não tem aulas legais, não há ânimo e todo mundo apenas gostaria de estar em qualquer outro lugar no mundo que não seja aqui.
Já é hora do almoço e nós estamos todos no refeitório. Felix e eu nos sentamos com os meninos do basquete hoje, com parte do time, Hyunjin não está aqui. Hwang veio para a escola, finalmente. Mas sentou-se sozinho em uma mesa afastada de todos. Ainda deve estar se sentindo horrível por não ter ido ao jogo.
Por tocar no assunto, parece que ninguém esqueceu o ocorrido ainda. Perder por tão poucos pontos de diferença é de causar ira. Muitos ainda se sentem injustiçados, afirmam com toda certeza que a cesta de três pontos de Chan era para ter sido válida. Tem também alguns que ainda acreditam que a culpa de tudo isso é de Hyunjin.
— Vocês conversaram com ele? — eu pergunto direcionado o olhar ao garoto com fones de ouvido e comendo seu arroz.
— Não e nem quero — Minho diz, orgulhoso.
— Você sempre fala isso, mas é o primeiro a mudar de ideia, hyung — Jeongin desmentiu o amigo. — Eu queria falar com ele, mas acho que ele é quem não quer falar comigo. Com nenhum de nós.
— Por quanto tempo vocês acham que isso vai durar? — Felix questiona e me sinto orgulhosa por ele finalmente falar com alguém na mesa que não seja Seungmin, Jisung ou eu.
— Alguns dias, uma semana no máximo — Yang responde. — Ele sabe que estamos com raiva, mas que não colocamos a culpa nele.
— Ele tem os problemas dele, aposto que deve ter tido os seus motivos para faltar — Chan se mostra compreensivo.
Ah, vocês nem imaginam.
— Mas seria legal se tivéssemos ganhado — diz Han Jisung. — Todos os aplausos da torcida, o dinheiro, a viagem.
— Teria sim, mas nós vamos ter outras oportunidades de jogarmos — Seungmin consola.
— Mas não estaremos jogando juntos — Know lamenta. — É o nosso último ano, queria que tivéssemos levado a vitória.
— Para mim, vocês são os campeões — eu tento os animar.
— Ser seu campeão não me dá dinheiro — Minho arranha como um gato arisco. — Mas obrigada por tentar animar os perdedores.
— Ei, não fala assim. Quem é o meu campeão? — pergunto.
— Sou eu — ele sorri, em seguida estende a mão. — Agora o dinheiro!
— Engraçadinho... — digo. Ele sorri com deboche. — Vou levar a minha bandeja, já volto — digo ao me levantar.
Eu pego a bandeja com a louça suja e me direciono até a bancada onde as deixamos. Nos meus lábios, a melodia de Whistle do Blackpink sai em forma de assobio. Eu caminho tranquila, mas paro quando vejo as costas de Hyunjin. Estava prestes a esbarrar nele.
O Hwang está com os seus fones de ouvido no pescoço enquanto segura sua bandeja em mãos, mas ele não se move, fica parado enquanto escuta uma garota dizer coisas ruins sobre ele. Eu paro para ouvir também.
— É tudo culpa sua! — a loira diz. — Se você não fosse tão egoísta, não seríamos nós os perdedores. Se você está em um time, tem que assumir as suas responsabilidades. Por que você faz isso? As pessoas contam com você. Você é decepcionante. Por que você não sai do time? Não fará tanta falta assim depois que ninguém precisar mais de você!
A garota diz as palavras duras como se tivesse direito de exercê-las. Ela sempre diz "nós", como se fosse parte de um dos seus companheiros — que não o culpam —, sendo que ela não faz metade do que ele faz. Ela não o conhece, não sabe as coisas que ele passa, mas será que não poderia pensar em como ele se sente por dois minutos? Eu sei como as pessoas aqui podem ser cruéis, mas não imaginei que fariam isso na cara dele.
As ofensas não são direcionadas a mim, mas doem como se fossem. Suas palavras brutais são como as lâminas que perfuram na minha alma. Tomo a dor dele para mim, mas gostaria de fazer isso em sentido literal. Não quero vê-lo sofrer, não quero ser parte da sua tortura.
— Por que você não foi ao jogo? — ela questiona, a voz tão rude como se fosse alguma autoridade que abusa de seu poder. — Aposto que estava se divertindo com alguma garota. Vocês são todos assim, se pensassem mais com a cabeça de cima, não fariam tantas coisas estúpidas. Como você consegue conviver com si mesmo?
Eu queria gritar, ou pelo menos conseguir dizer algo, mas fiquei imóvel. Em situações de perigo eu travo, fico paralisada, mesmo com o perigo eminente. Foi assim que uma moto me atropelou uma vez e eu quase quebrei a perna.
Hyunjin também não dizia nada, fica calado escutando isso de cabeça baixa. Seus ombros estão encolhidos junto do corpo e se tensionam cada vez que ela sobe um tom de voz. Algumas pessoas olham em volta e finalmente alguém vem para ajudar, é Chris.
— O que merda está acontecendo aqui!? — ele pergunta, bravo por ver a garota agredindo verbalmente seu melhor amigo.
— O que? Você vai defendê-lo agora? — ela fala como se fosse a dona da razão. — É por culpa dele que nós perdemos!
— Não, é por nossa culpa que o nosso time perdeu — ele deixa claro o que pensa. — Jogadores são substituídos o tempo inteiro e nós deveríamos ter aprendido a jogar com os que tínhamos. Foi um jogo acirrado e ótimo de se assistir. Você deve saber disso, já que está mais agitada que os próprios jogadores.
— Vocês são todos horríveis. Deveriam aprender a jogar de verdade.
— Sim, senhora. Faremos o possível para satisfazê-la. Nos daria a honra de nos treinar? — Chan sugere com uma provocação.
— Ridículos. Vocês são totalmente ridículos! — ela diz, totalmente sem argumentos e saindo em seguida.
— Você está bem? — Chan pergunta a Hyunjin, mas o moreno não responde nada, apenas deixa sua bandeja no local indicado e some.
Eu guardo a minha também e volto a ficar ao lado de Chan enquanto olhamos para o rastro que o Hwang deixa para trás. Eu suspiro, fico irritada com o que aconteceu. Não consigo entender como alguém pode ser assim, tão cruel que não pensa em como as outras pessoas se sentem.
— Ele é impossível — eu digo.
— Ele está magoado — Bang corrige. — Vamos dar um tempo a ele.
— Não acha que deveríamos tentar conversar com ele? — eu pergunto. Ele parece precisar de carinho e conforto.
— Você pode tentar, mas acredito que ele prefira espaço.
— Eu vou dar espaço a ele, mas preciso me desculpar por algo que me incomoda também.
— Você quem sabe — ele decide não opinar mais.
Chan volta para a mesa e eu procuro por Hyunjin, preciso pedir a minha primeira desculpa do dia. A segunda vai ser à Felix por deixá-lo sozinho com os garotos. Mas ele que se vire, está com Seungmin.
Ainda penso no que eu fiz noite passada, se a polícia já bateu na porta deles e se ele sabe que fui eu quem denunciei. Fiz uma denúncia anônima, mas eu sou uma das poucas pessoas que conhece o seu segredo. É claro que ele suspeitará de mim. Torço para que ele não fique tão irado.
Depois de um tempo procurando, encontro Hyunjin sentado em um dos bancos no corredor próximo à nossa sala. Eu me aproximo com cuidado para não o espantar, como se ele fosse algum bichinho assustado que correria se me visse como uma ameaça.
Ele está com a cabeça encostada nos joelhos dobrados e em cima do banco. Hyunjin olha para o nada com a expressão vazia, parece perdido e desolado. Eu me aproximo um pouco mais, e com a voz calminha, eu pergunto:
— Você quer conversar?
Ele fica calado. Está me ignorando assim como falou na noite passada, quando fui eu quem fez isso com ele.
— Hyunjin, eu te devo algumas desculpas — falo abrindo o meu coração. — Primeiro, me perdoe por não te defender mais cedo. Eu gostaria de poder dizer alguma coisa, mas travei. Eu não acho que foi culpa sua, nenhum dos meninos acham isso. Você não pôde ir, o que me chateia é o motivo que te impediu.
Ele me olha por alguns segundos mas desvia o olhar.
— Em segundo, peço desculpas por ter fechado a minha janela ontem. Eu disse que ela sempre estaria aberta para você, mas não cumpri com o nosso combinado. Sinto que falhei com você, mais uma vez.
Uma janela é bem mais que um objeto por onde se passa ar, é uma válvula de escape. Podemos imaginar como um portal, que te leva para outro lugar onde você não tem que se sentir pressionado às coisas do mundo real. É para onde você pode fugir e se refugiar. Eu disse que faria isso por ele, mas quando precisou, eu fechei as entradas e saídas.
— E em terceiro, mas nem por isso menos importante, eu quero pedir desculpas por quebrar a sua confiança — eu respiro fundo. — Me desculpe por entregar o seu pai à polícia.
O garoto que me ignorava praticamente pulou do seu lugar. Sua expressão de surpresa me faz perceber que ele ainda não sabia deste detalhe.
— Você fez o quê!?
— Eles ainda não foram até sua casa? — pergunto e no mesmo instante me arrependo por dar a notícia assim.
Meu Deus, eu sou uma burra!
— Jiyoon, eu pedi para você não dizer nada! — ele exclama com pesar. — Você não entende, não é?
— Eu só estava tentando te ajudar.
— Mas eu nunca pedi a sua ajuda — ele perde a paciência. — Você não percebe, mas acaba de piorar toda a situação. Eu não queria ajuda, não queria que você nem ninguém se metessem nisso.
— Eu sinto muito, de verdade — lamento, mas talvez já seja tarde.
— Jiyoon, você tem noção de que se houver um julgamento e ele for declarado inocente, assim que ele sair da cadeia ele matará a minha família e eu?
Fico em choque, tal detalhe nunca tinha passado na minha mente. Meu Deus, como eu fui fazer algo assim sem pensar em tudo? Eu posso ter contribuído com algo ainda pior. Se algo acontecer à eles, eu jamais conseguirei me perdoar.
— Hyunjin, me desculpa — peço, imploro por seu perdão.
— Já chega! — ele diz firme. — Eu não quero ouvir mais nada. Eu só quero que me deixe em paz! — ele pede tentando esconder os olhos vermelhos. — Eu não quero mais ter contato com você. A partir deste momento, finja que nós somos completos estranhos. Por favor, não complique ainda mais a minha vida.
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